quarta-feira, 8 de junho de 2011

Jorge Miguéis, em 26-3-2011: «O recenseamento eleitoral reconheço que ele está empolado»

A resposta, através de comunicado público (!), do Director-Geral da Administração Interna ao Presidente da República, em 7-6-2011, constitui uma afronta institucional intolerável, mesmo que o Governo se encontre demissionário. O Dr. Jorge Miguéis é um funcionário público, com uma obrigação dupla de respeito pelo Chefe de Estado. As (des)considerações políticas públicas ao Presidente da República, feitas por um funcionário da administração pública não lhe cabem, mas somente a execução das competências técnicas estritas que lhe estão cometidas e o respeito, que não deve ser apenas pessoal, mas institucional, remetendo-se ao nível hierárquico que tem.

Acresce que o Presidente da República tem razão no que disse, em 6-6-2011:
«Os cadernos eleitorais actualmente têm cerca de nove milhões e quinhentos mil eleitores mas é muito difícil que existam em Portugal muito mais que oito milhões e meio de eleitores por isso seria altamente conveniente que se procedesse a uma clarificação dos cadernos eleitorais para termos uma ideia correcta, mais precisa do valor da abstenção.»
Escrevi neste blogue, em 26-1-2011, o poste «Uma democracia fantasma», onde calculei que, em 2009, último ano com valores disponíveis, o número de cidadãos nacionais a residir em Portugal com mais de 18 anos não seria superior a 8.319.105 eleitores. Se assim fosse, por exemplo nesta eleição, com 8.319.105 eleitores, a abstenção seria de 33,2%. E, tal como a  essa também não coloca em causa a legitimidade política dos vencedores, como quer quem perdeu e destaca uma extraordinária subida da abstenção de... 1,63% («Ó inclemência! Ó martírio!») numa «maioria social» curiosa que consiste na maioria... dos que estiverem em determinada rua na manifestação do dia X, à hora H do discurso. Ou na distribuição dos indecisos (os abstencionistas) que, por conveniência deles,  são contados todos para o seu lado, fazendo com que 42,7% dos votos (PC, Bloco, MRPP, PTP, POUS e PH) - e com a a extrema esquerda parlamentar (PC, Bloco e MRPP) com 10,4% do Parlamento e 14,3% dos votos -  mais os 4,03% de brancos e nulos que também abicham, signifiquem a maioria (46,7%...) contra 50,37% de maioria aritmética de votos de PSD e CDS (sem contarmos com a percentagem de outros partidos de direita). Porque para quem é totalitário, os deles significam sempre a totalidade - o resto não consta porque não é consciencializado e não é, portanto, humano.

O Dr. Jorge Miguéis é livre de ser socialista, mas enquanto funcionário do Estado, ainda por cima jurista, deve respeito e consideração ao Presidente da República. Na sua função de director-geral, tal como na de director do Secretariado Técnico para os Assuntos para o Processo Eleitoral(STAPE), em 2007, não representa o PS: serve o Estado de que Cavaco Silva é Chefe. Recordo que foi com muita dificuldade que a Comissão Nacional de Eleições (CNE) aprovou, em Fevereiro de 2011, mapa oficial dos resultados da eleição presidencial, na qual o então director-geral da Administração Eleitoral Jorge Miguéis, membro da Comissão em representação do Governo, finalmente se absteve, declarando-se «sensível à necessidade de, no momento, não causar quaisquer entraves à normal tomada de posse do candidato eleito» (sic).

Não pode contraditar o Presidente com objecções de natureza política, como terá escrito no seu «comunicado» de que o Jornal de Negócios, de 7-6-2011 publicou excertos:
«a legítima inscrição nos cadernos eleitorais dos portugueses residentes no estrangeiro constitui expressão da diáspora e resulta da adopção de políticas que fomentam a ligação dos portugueses espalhados pelo Mundo às suas origens, a qual envolve a possibilidade de indicar como residência oficial uma freguesia em território nacional, ainda que residam habitualmente no estrangeiro a maior parte do ano.»
As pretensas políticas de «ligação dos portugueses espalhados pelo mundo às suas origens» (que espantosamente compreenderiam a «legitimidade», já nem sequer legalidade, do voto nas freguesias do território nacional, em vez dos consulados, de cidadãos portugueses não-residentes, que este presume residirem apenas onze meses por ano no estrangeiro) não fazem parte das suas atribuições, nem na definição de políticas nem sequer na sua defesa ou promoção. Essa responsabilidade concerne a um nível político que este funcionário não tem, nem pode arrogar-se.

O Dr. Jorge Miguéis, em 23-2-2011, segundo a TVI24,  terá dito que não se deviam escolher os membros das mesas eleitorais  «porque "fulano é meu sobrinho"» e justificou que «nós sabemos que a escolha não é linear» -, imputando, na prática, nepotismo (aos Presidentes de Junta?) mas não cosnta que tenha apresentado queixa dessa escolha não-linear que detectou. Na sequência do escândalo de impedimento de voto de cerca de 270.785 eleitores na eleição presidencial de 23 de Janeiro de 2011 (conforme aqui calculei em poste de 4-2-2011) devido à falta de notificação dos eleitores que viram alterado o seu local de voto, o Dr. Jorge Miguéis apresentou demissão de director-geral da Administração Eleitoral, para logo ser promovido, pelo ministro Rui Pereira, a Director-Geral da Administração Interna... Pensei que se reduzisse ao silêncio, até atendendo às críticas que, neste blogue e noutros sítios, se fizeram ao Governo e à CNE, a propósito das duas eleições anteriores, e agora terem sido enviadas cartas aos eleitores e realizado a campanha nos media de promoção da eleição, como era hábito.

Porém, o Dr. Jorge Miguéis reincide. Puxa uns alegados 5 milhões de cidadãos portugueses no estrangeiro, para justificar os 9.429.024 eleitores inscritos no sufrágio de 5-6-2011. No insólito comunicado de 7-6-2011, o director-geral desmente o Presidente da República e a generalidade dos políticos e especialistas de sondagens, afirmando que «os cadernos eleitorais mostram-se credíveis e actualizados». Na verdade, contradiz-se a si próprio, pois, na Universidade Lusófona do Porto, em 26-3-2011, conforme registo audio da Visão, disse: «o recenseamento eleitoral reconheço que ele está empolado» - e repetiu, «eu reconheço que ele está empolado»... Não é melhor identificar as causas e sugerir emendas do que negar a evidência que ele próprio reconheceu e agora desmente?!...


* Imagem picada daqui.

Sem comentários: