O problema não é a ligação entre António Costa e Paulo Portas. Portas é um apêndice do
sistema, que ganha votos em nome da democracia cristã, que no Governo não pratica, e de demagogia ocasional. Apreciado pelo
discurso impoluto - como se nada tivesse a ver com isto e a culpa da ruína fosse externa... -, perdoado pela proteção a Pedroso, Ferro e companhia socialista, no caso de abuso sexual de crianças da Casa Pia («
Vou falar imediatamente com o procurador, o Guerra»), ele é, contudo, o autor da renegociação do
escandaloso SIRESP (menos dinheiro, menos serviços...) em vez de anular o
negócio do século. Note-se que no caso
SIRESP, António Costa nunca foi arguido.
António Costa está mais ativo na tentativa de tomar o PS e mantém a aliança com a fação férrica que, governada na sombra por José Vieira da Silva, parece cobrar favores antigos e explorar ligações dos tempos da fartura para garantir o retorno de Paulo Pedroso aos écrans (!?...) e
na TVI (!?...)... Diga-se que Costa nunca pertenceu à fação férrica: era um aliado conjuntural. A fação férrica aproveitava a notoriedade e as relações de Costa e este ganhava alavanca. Até Costa ter querido aproveitar o caso Casa Pia para lhes passar a perna, o que a fação não consentiu... Obsecados pelo poder, compreenderam a ambição do atual presidente da CMLisboa e desculparam-no, pretendendo agora reutilizá-lo até o deitarem fora. Entretando, amainada a antiga rivalidade entre Sócrates e Pedroso, o casamento de conveniência entre socratinos e férricos foi apadrinhado por Vieira da Silva. Assim, a aliança costista-socratina pretende desalojar António José Seguro antes das autárquicas do outono de 2013, porque crê - e bem - que depois da vitória previsível de Seguro nessas eleições, já ninguém desbanca o líder vitorioso até às legislativas antecipadas. Costa e Sócrates têm cinco meses para substituir Seguro. Em poucos meses o
nègre conclui a tese.
O problema é a ligação entre António Costa tandem Pedro Passos Coelho-Miguel Relvas. Entre o herdeiro temporário - até mudar o testamento... - de José Sócrates e os próximos ex-governantes. Uma mão tapa a outra e as duas cobrem as faces - e especialmente as bocas. Uma troca simples (mas perigosa):
poupamos-te no Governo as misérias que fizeste e quando nós sairmos tu, e os teus, poupam-nos também.
Sócrates parece ter bancado a campanha de Passos-Relvas para a liderança do PSD desde 2008 porque lhe dava jeito enfraquecer Manuela Ferreira Leite. O Governo atual não persegue os socratinos, na expetativa ingénua de que os outros os poupem a seguir. Por isso, importa que os próximos sejam
os certos, melhor ainda se forem os mesmos, que poderão fornecer um salvo-conduto político que permita a reforma antecipada faraónica das
saisons entre o Brasil, Nova Iorque e Londres.
Todavia,
as ligações de Passos-Relvas com Sócrates têm também uma charneira empresarial.
Pedro Passos trabalhou para a a HLC Tejo, associada da Fomentinvest, de Ilídio Pinho e Ângelo Correia, na
Tejo Ambiente. HLC de Horácio Luís de Carvalho.
Horácio Luís de Carvalho é o chefe do
clã da Cova da Beira, que incluía o eng.º Carlos Manuel Santos Silva e o Prof. António José Morais, além da conexão política diligente do deputado n.º 5 do Partido Socialista por Castelo Branco, o engenheiro técnico José Sócrates, mais tarde ministro do... Ambiente, depois primeiro-ministro e que agora vive exilado no fausto parisiense, segundo alega à custa de caridade e de empréstimos (ver
CM, de 24-1-2013). Horácio Luís de Carvalho não é só o do caso da central de tratamentos de resíduos sólidos da Covilhã (sobre o Zêzere), é o do
TETRA e do
SIRESP (ver
«O Dossiê Sócrates», p. 330), depois recuado em Inglaterra, que alargou depois os negócios da
HLC Environmental Holdings para além do ambiente, e da
Carbon Capital Markets, com a
Aeolus Wind (energia eólica), para o
Brasil (Zephyr,) onde
entrou na energia eólica,
biomassa e
biofuel, e ainda estendido os seus interesses para a
África do Sul, Índia, Ucrânia e Turquia. O ex-ministro do PSD Manuel Dias Loureiro, alegadamente com ligação a
Pedro Passos Coelho e a
Miguel Relvas (cuja festa de réveillon no Copacabana Palace juntamente com Dias Loureiro foi referida na
imprensa portuguesa e
internacional) também foi
referido no escândalo SIRESP, mas não chegou a ser arguido - embora seja
arguido no caso SLN/BPN.
O
utra charneira entre Passos-Relvas e José Sócrates é a Ongoing, de Nuno Vasconcellos, que parece ter sido descalçada pelo grupo Espírito Santo, do qual era visto como
testa de ferro na Portugal Telecom e
desfeita, em outubro de 2013, a parceria para negócios em África com a Fomentinvest, a angolana Kopelson e a JP Sá Couto. Nuno Vasconcellos, que terá contado com o apoio de Miguel Relvas e José Dirceu, tinha passado de um grupo nacional de imprensa para um grupo intercontinental de média, com jornais no Brasil e projetos em Angola. Foi
usado como homem de palha pelo poder de José Sócrates na «tomada de controlo dos meios de comunicação social» independentes, com realce para a TVI, a poucos meses das eleições legislativas de setembro de 2009. Relvas terá intensificado a sua ligação ao Brasil, em 2004, através do marketing eleitoral de Nizan Guanaes, empresa contratada para apoio do PSD, e depois como consultor empresarial do
grupo luso-angolano Finertec, da portuguesa Alert de software clínico e da Kapaconsult (empresa que
alegadamente tinha como cliente único, a Efisa/BPN, de Karim Abdul Vakil), - mas já haveria ligação
desde os anos 90 com os Bornhausen. Depois vieram os projetos brasileiros do seu amigo Nuno Vasconcellos nos média
e
a fraternidade do Grande Oriente Lusitano, onde Relvas militava, e da GLLP, onde Vasconcellos era venerável. Foi referido na
revista Visão, citada por Reinaldo Azevedo, da Veja, em 5-9-2011, que a ligação de Miguel Relvas a José Dirceu teria sido estabelecida em 2007, durante uma viagem de Dirceu a Portugal, para contactos empresariais com Nuno Vasconcellos e outros. Importa dizer que não li, nem ouvi, nem posso concluir, que tenha havido ligação entre Relvas ao
escândalo do Mensalão - do lado do PSD, as personalidades referidas como contactos em Portugal do agente Valério foram
Miguel Horta e Costa (presidente da PT) e o ministro António Mexia, mas nenhum deles foi arguido ou acusado. José Dirceu foi
condenado a 10 anos e 10 meses de prisão por formação de quadrilha e corrupção ativa, em novembro de 2012, como líder do Mensalão. José Dirceu tinha dirigido a
«conexão portuguesa» do Mensalão nos últimos tempos do Governo PSD-CDS de Santana Lopes, em 2004-2005, no qual foi envolvida a Portugal Telecom, o Grupo Espírito Santo e o Governo português. E
Dirceu tinha ligação ao projeto mediático no Brasil de Nuno Vasconcellos, amigo de Miguel Relvas. Custa a crer que o poderosíssimo
José Dirceu, controleiro do ex-marxista e socialista Partido dos Trabalhadores, longe de caído em desgraça efetiva, mesmo que já fora da estrutura formal do poder lulista, tivesse no Portugal socratino de 2007, como ligação económica, um ex-secretário de Estado e ex-secretário-geral do PSD (
tinha saído em 2005). Porque se ligaria Dirceu a alguém do PSD, um partido de direita fora do Governo, quando teria todo o PS aberto a discussão de projetos, mesmo em África?... A não ser que Sócrates, líder totalitário à moda de Putin, primeiro-ministro de um Governo e líder de um Partido Socialista, que herdou esse relacionamento especial com o poder brasileiro, não se opusesse. Relvas, o polícia mau do polícia bom Passos Coelho, começava a organizar uma linha de oposição ao cavaquismo de Manuela Ferreira Leite, próxima líder do PSD. Nesses tempos, hoje negligenciados por uns e olvidados por outros, Passos atacava a direção de Ferreira Leite por esta ser demasiadamente hostil face ao PS, pois ela não devia «
atribuir culpas ao executivo de Sócrates mas antes avançar com propostas e procurar consensos»...
Portanto, existem ligações particulares e políticas Passos-Relvas e Sócrates (e Costa), aquém dos
seis graus de separação. São essas
ligações sistémicas a causa principal da desgraça atual do País. Houve - e contra mim falo! - quem tivesse a esperança de que as eleições representassem um corte, algum corte, no rumo decadente da
altabaixa-política da nação. Nesse sentido, a derrota do socratismo, que nunca cremos definitiva, pareceu-nos uma oportunidade de revelação, de mudança de vida. Nada: nem auditoria das contas, nem perseguição judicial, nem limpeza do Estado, nem suspensão dos contratos manhosos das parcerias público-privadas. Nada. De nada. Se as contingências são mais fortes e o dinheiro mais escasso, o
sistema é o mesmo. E é por isso que importa continuar a trabalhar pelo Portugal.
Ó Pátria-mãe!
* Imagem picada daqui.
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