Chamaram-me a atenção para uma já antiga crónica de Filipe Luís, meu comunícipe, na revista
Visão, de 5-10-2011, intitulado «
O Quarto Reich - A guerra pode já ter começado», que se tornou objeto de discussão recente.
Filipe Luís refere uma novela de Adam Lebor, «
O Protocolo Budapeste», surgido na versão original inglesa em 2009, no qual este narra um Quarto Reich, um império económico, à mistura com um novo genocídio cigano. O jornalista da Visão refere ainda a colaboração dos grandes capitalistas alemãs com o nazismo, nomeadamente a
família Quandt, da BMW - mas também poderia mencionar
Ferdinand Porsche -, que creio ter sido motivado principalmente pelo ganho financeiro, como é do seu ofício e caráter. Primeiro, os negócios.
Porém, a talhe da minha foice, convém não desclassificar a motivação imperial alemã, na política atual germânica de ditadura financeira imposta aos países da União Europeia, com especial impacto nos mais fracos, do sul. Não acredito na motivação indicada no artigo/livro de que o objetivo é a Alemanha «
passar a controlar, por preços de saldo, empresas estatais estratégicas, através de privatizações forçadas». Não!
Como tenho insistido, julgo que sem qualquer acompanhamento na fundamentação,
a motivação da nova Alemanha - como a da velha - é tornar-se o «Estado diretor» da Europa. Vale a verdade que o meu velho professor Adriano Moreira insistia há muito nesse perigo. Mas como a
inteligentzia mediática nacional - a admitida... -, letrada na faculdade das ciências estranhas, nos isctes, nas faculdades jurídicas ou nas escolas de econometria, não estudou geopolítica, não sabe, nem cuida de saber. Com exceção dos militares, que mantiveram a aprendizagem da geopolítica, a maioria de esquerda, além da direita
sistémica (ancorada no poder), desvaloriza a geografia e ignora a história, esquecendo os seus ciclos, e por crerem no homem novo, no «
lendemain qui chante» (e de novo ressoa), em doutrinas que, cito de memória do livro de «Ciência Política» de Adriano Moreira a propósito dos Noveaux Philosophes que dizem «de novo coisas muito velhas» - e ultrapassadas, desprezam o
acquis doutrinário como lixo para queimar na fogueira ideológica.
Aconselho, mais uma vez os leitores, favoráveis ou adversários, que prestem atenção à t
eoria de Friedrich Ratzel do
Lebensraum («espaço vital») - ver, por exemplo,
Woodruff D. Smith (1986), The Ideological Origins of Nazi Imperialism, Oxford University Press, - e à
doutrina de Karl Haushofer de que a Alemanha deveria ser o Estado diretor da Europa, a qual inspirou a ideia de Nova Ordem europeia subordinada ao nazismo. Creio que, com exceção dos militares e dos iscspianos, existe um desconhecimento quase completo do que
Haushofer escreveu e de como a sua doutrina geopolítica foi fundamental para a política externa de Hitler, tal como os eugenistas (hoje, outra vez na moda, enfileirados na defesa do aborto) o foram relativamente à
política de holocausto de «higiene racial» interna (e externa).
Tenho também acentuado o facto de que o estílo melífluo da chanceler Merkel neutraliza a desconfiança de domínio. Mais ainda,
é uma perigosa ingenuidade a aceitação nos setores financeiros e económicos da liderança funcional alemã da Europa como útil para a disciplina financeira e para o bem estar dos europeus - menosprezando as vantagens aduaneiras e comerciais e de políticas económicas seletivas que essa supremacia proporciona às empresas alemãs.
Consciente, porém, de que a sua liderança funcional na União Europeia não lhe basta no embate político com outros blocos - veja-se
o caso da suspensa associação da Ucrânia com a UE e a
tenaz russa -, a Alemanha procede ao
reequipamento militar,
por enquanto a ritmo inferior ao sucedido
a partir de 1933, e se propõe um «
papel militar mais forte» e «
política externa mais musculada». Como disse a nova ministra federal da Defesa, Ursula von der Leyen, em 31-1-2014, em Munique: «
A Alemanha é forte na Europa, mas acima de tudo a Alemanha é forte por causa da Europa e da Nato». O que a Alemanha se apresta para fazer é aumentar também a sua capacidade militar dentro da União Europeia e da Nato, para que esse vetor acompanhe o poderio económico e financeiro já conseguido.
O domínio alemão da Europa não deve ser politicamente negligenciado.
* Imagem picada daqui.