O Público, de 29-3-2012, e o CM, de 30-3-2012, trazem reportagens sobre o depoimento em tribunal de António José Morais no processo sobre a gestão da Universidade Independente relativamente à licenciatura de José Sócrates. Morais é o velho amigo de Sócrates da Cova da Beira, seu professor no ISEL e quem o aprovou em quatro das cinco cadeiras que determinou este teria de fazer na Universidade Independente para o bacharel Sócrates obter o grau de licenciado (a outra foi... Inglês Técnico). Pelo relevo que tem para o caso da rocambolesca licenciatura em Engenharia Civil do ex-primeiro-ministro e pelo interesse público que tem, transcrevo as duas reportagens e a seguir comento, usando a explicação detalhada que se pode encontrar no meu livro «O Dossiê Sócrates» (download gratuito).
A reportagem do Público, de 29-3-2012, assinada por José António Cerejo, é a seguinte:
A reportagem do Correio da Manhã, de 30-3-2012, assinada por André Pereira e por Sónia Trigueirão, é a seguinte:
O meu comentário:
O cerco aperta-se sobre José Sócrates. Independente e Freeport (além do processo do aterro sanitário da Covilhã) situam-no e sitiam-no. Ausente dos tribunais, está ainda mais presente do que se lá estivesse sentado. Não se trata aqui, nem no caso crítico dos cartões de crédito do Governo anterior, de um julgamento político. Trata-se de tratar os políticos como qualquer outro cidadão, sujeitos de direitos mas também de deveres.
Pós-Texto (10:57 de 2-4-2012): O «engenheiro Pinto de Sousa»
O comentador Themistocles informou ontem que, no julgamento sobr a gestão da Universidade Independente, não foi a juíza-presidente Dra. Ana Peres quem tratou José Sócrates por «engenheiro Pinto de Sousa», mas a procuradora. Em qualquer caso, tratar por engenheiro alguém que, como está provado, é público e notório, indepedentemente da sua rocambolesca licenciatura, não é, nem nunca foi, engenheiro, é errado. Já é hora de, pelo menos nos tribunais, se terminar com a farsa política de chamar engenheiro a José Sócrates
* Imagem picada daqui.
Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa não é, nem chegou a ser, arguido no inquérito para averiguação de eventual falsificação de documento autêntico, no seu diploma de licenciatura em Engenharia Civil da Universidade Independente (Processo n.º 25/07.5.TE.LSB do DCIAP); e o inquérito foi arquivado, em 31 de Julho de 2007, pela procuradora-geral adjunta Dra. Maria Cândida Almeida e pela procuradora adjunta Dra. Carla Dias.
Luís Arouca, António José Morais e demais entidades referidades neste poste, referidos nas notícias dos media, que comento, não são arguidos por cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade neste caso da licenciatura do ex-primeiro-ministro José Sócrates.
Os arguidos noutros processos, como Luís Arouca, no processo da gestão da Universidade Independente, ou como António José Morais, no processo do aterro sanitário da Cova da Beira, gozam do direito constitucional à presunção de inocência até ao trânsito em julgado de eventual sentença condenatória.
A reportagem do Público, de 29-3-2012, assinada por José António Cerejo, é a seguinte:
«Professor de Sócrates diz que UnI o obrigou a fazer disciplinas só para cobrar propinas
29.03.2012 - 20:42
Por José António Cerejo
António Morais, antigo professor de Sócrates na Universidade Independente (UnI), surpreendeu o Tribunal de Monsanto, em Lisboa, ao afirmar que a universidade obrigou o ex-primeiro-ministro a frequentar cinco disciplinas apenas para lhe cobrar as propinas.
Morais, que diz ter leccionado quatro dessas cinco disciplinas, fundamentou essa afirmação com a alegação de que Sócrates já tinha direito à licenciatura quando se matriculou na UnI.
A tese defendida pelo antigo professor do então secretário de Estado do Ambiente – que depunha como testemunha no julgamento em que vários ex-dirigentes da UnI respondem por burla e outros crimes na gestão do estabelecimento – foi a de que ela “já era engenheiro” ao entrar para a UnI. Isto porque, argumentou, o número de horas de aulas que Sócrates tinha tido no bacharelato, em Coimbra, e depois no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) era superior ao número de horas exigido para a licenciatura.
A juíza perguntou então se lhe poderiam ter dado logo a licenciatura. “Exactamente!”, respondeu Morais – iludindo o facto de no ISEL a obtenção da licenciatura obrigar os bacharéis a fazer um curso de dois anos e de Sócrates só ter feito um.
Já depois de ter relacionado a admissão do ex-primeiro-ministro e de outros alunos vindo do ISEL com a vontade da UnI cobrar propinas, Morais foi confrontado pelo Ministério Público com uma anotação manuscrita no boletim de matrícula do “eng. Pinto de Sousa”, como a ele se referiu sempre a magistrada. A nota diz que o aluno estava “isento”, mas à pergunta da procuradora sobre se se tratava de isenção de propinas, o antigo professor respondeu: “Não faço ideia.”
António Morais também não conseguiu explicar o motivo que o levou a preencher pela sua própria mão o cabeçalho do boletim de matrícula de Sócrates que não ostenta qualquer assinatura do aluno no espaço previsto para ela. Antes disso, a procuradora do Ministério Público tinha-lhe perguntado se tinha tido algum papel na entrega da documentação de Sócrates à UnI, ao que a testemunha respondeu: “Acho que não!”.
A juíza presidente, Ana Peres, viu-se obrigada a advertir várias vezes a testemunha sobre os modos arrogantes como se dirigia aos magistrados, ao que Morais respondeu sempre com um pedido de desculpas.
O advogado do antigo vice-reitor da UnI, Alexandre Lafayette, requereu o envio das declarações de Morais para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal, onde está pendente um pedido de reabertura do inquérito à licenciatura de Sócrates, por si apresentado na semana passada. Lafayette pediu também ao Ministério Público para proceder criminalmente contra Morais por ter prestado “falsas declarações” durante o seu depoimento.»
A reportagem do Correio da Manhã, de 30-3-2012, assinada por André Pereira e por Sónia Trigueirão, é a seguinte:
«Independente
Morais contra Inglês Técnico
Professor de Sócrates foi contra a realização da prova de Inglês Técnico por parte do ex-primeiro-ministro
30 Março 2012
Por: André Pereira/ S.T.
António José Morais, professor de José Sócrates na Universidade Independente (UnI), revelou ontem no Tribunal de Monsanto, em Lisboa, que sempre se manifestou contra a realização da prova de Inglês Técnico por parte do ex-primeiro-ministro.
O engenheiro civil, que leccionou quatro das cinco cadeiras com que José Sócrates obteve a licenciatura na UnI, foi arrolado testemunha pelo ex--reitor Luís Arouca, um dos 23 arguidos no ‘caso UnI' acusados de crimes económicos.
"Havia um grupo do PSD muito forte na UnI que queria fazer chicana política e forçaram o reitor, que foi fraco. Eurico Calado [regente da cadeira de Inglês Técnico], que fazia parte do grupo, insistiu, e eu, como director do curso, disse logo que não era ele a fazer o exame a Sócrates. Que fosse o reitor a fazê-lo", afirmou, explicando porque considerava desnecessária a realização da prova: "Não fazia sentido pedir um exame de Inglês Técnico a pessoas que já exerciam a profissão". Sobre Eurico Calado, Morais considerou-o "um professor menor" no curso de Engenharia Civil e reconheceu não saber que se tratava de um vice-reitor.
António José Morais garantiu não ter tido "qualquer interferência na documentação entregue por Sócrates para ingressar na UnI". Confrontado pela juíza Ana Peres com o boletim de matrícula parcialmente preenchido por si, António José Morais não o conseguiu explicar.
CASOS UNI E COVA DA BEIRA
Muitos são os nomes comuns ao processo da Cova da Beira (em que Sócrates chegou a ser suspeito) e a UnI. António Morais foi professor de Sócrates no ISEL e na UnI. Em Janeiro de 1996, a empresa de Morais é convidada por um amigo e ex--colega de gabinete de Sócrates na Câmara da Covilhã para concorrer como consultor no projecto de aterro intermunicipal da Cova da Beira. Em Fevereiro de 1997, a empresa de Morais faz um relatório em que propõe que a obra seja entregue à empresa de Horácio Luís de Carvalho. Em Maio, cartas anónimas enviadas para o MP denunciam que o concurso está viciado, que Sócrates recebeu dinheiro e que ordenou a escolha de Morais para consultor. Em 2007, Morais é acusado de corrupção.»
O meu comentário:
- António José Morais meteu a pata na... cova. Entusiasmou-se e danou-se, como dizem os brasileiros. Foi à lã, qual herói dos Montes Hermínios, e saíu tosquiado pelo advogado do Prof. Rui Verde e pela juíza Dra. Ana Peres (que todavia não devia chamar «engenheiro Pinto de Sousa» quem comprovadamente não é, nem nunca foi). O Dr. Alexandre Lafayette, o advogado patriota que apresentou o pedido de reabertura do inquérito sobre a licenciatura de José Sócrates, com a imputação de novos crimes, requereu, de acordo com José António Cerejo, ao tribunal o envio das declarações de Morais para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal, onde está pendente um pedido de reabertura do inquérito à licenciatura de Sócrates e solicitou ainda «ao Ministério Público para proceder criminalmente contra Morais por ter prestado “falsas declarações” durante o seu depoimento»... Morais não tinha necessidade: Sócrates não vale o seu sacrifício, tal como o seu ex-chefe Armando Vara também não valia.
- António José Morais, o velho amigo de Sócrates da Cova da Beira, terá dito em tribunal, segundo esta reportagem do CM, «ter conhecido José Sócrates no ISEL». Já é um avanço: Sócrates disse na RTP-1, em 11-4-2007, que só tinha conhecido Morais na Universidade Independente...
- O alegado argumento, segundo o CM, do Prof. António José Morais de que José Sócrates «já era engenheiro» antes de entrar para a UnI, com a inusitada justificação criativa do número de horas de aulas que já tinha do ISEC e do ISEL é um absurdo. Por esse andar, os tisnados veteranos da Universidade de Coimbra eram doutores e engenheiros por terem acumullado muitas horas de aulas e copos.
Só com o Processo de Bolonha, em 2006, passou a funcionar no ensino superior português, a nível interno, o ECTS, validando créditos anteriores baseados no número de horas de estudo e, mesmo assim, sujeitos ao regulamento interno de cada escola e sem equivalências discricionárias independentemente da área, nome ou conteúdo das cadeiras. A atribuição de equivalências nos cursos superiores, em 1996, era regulada pelo Decreto-Lei n.º 316/83, de 2 de Julho, que atribuía a competência ao conselho científico de cada escola, e na Universidade Independente vigorava o seguinte sistema:
«Num pedido de equivalência (UnI) é obrigatório apresentar certificado de aproveitamento assim como o plano curricular das cadeiras em causa, tendo este que ser emitido e comprovado pela anterior universidade – de referir que, se pode pedir/atribuir equivalência a cadeiras que tenham nomenclaturas diferentes nas duas universidades, mas é necessário que o plano curricular de ambas seja similar» (sublinhado meu)
Com as cadeiras do bachalerato do ISEL, e o ano que fez no ISEL (faltava-lhe outro para conseguir o CESE, que equivalia a licenciatura, mas não era licenciatura), como escrevi e fundamentei no meu livro (p. 112)«o saldo das equivalências concedido pela UnI terá sido favorável a José Sócrates em seis cadeiras: três cadeiras anuais e três semestrais. Mais, segundo esta análise, para concluir devidamente a sua licenciatura Sócrates teria de fazer mais oito cadeiras: cinco anuais e três semestrais (fez duas anuais que não devia)...» (Realce meu)
Sócrates não podia ter recebido equivalência, nomeadamente, às disciplinas do plano curricular da UnI que não constavam do seu currículo anterior, nomedamente: Saneamento Ambiental (4.º ano - semestral); Informática II (2.º ano - anual); Legislação de Projectos e Obras de Engenharia (5.º ano - semestral); Computação Numérica (2.º ano - anual); Probabilidades e Estatística (2.º ano - anual) (...) Ordenamento do Território (4.º ano - anual); Organização e Gestão de Projectos de Engenharia (5.º ano - semestral) (cf. p. 110 do meu livro).
Para uma análise mais detalhada sobre a questão das equivalências de José Sócrates na Universidade Independente, leia-se o meu livro «O Dossiê Sócrates», pp. 103-113. - A eventual intervenção do professor (Morais) que deu as equivalências na UnI na entrega da documentação («acho que não»!?...), ele próprio preenchendo o cabeçalho do boletim de inscrição (que não tinha assinatura do candidato) é insólita. Quem devia fazer esse trabalho era a secretaria e acredito que esse processo já estivesse informatizado. Morais não soube explicar...
- Os «modos arrogantes», segundo Cerejo, como Morais se dirigia aos magistrados, e que levou à advertência da juíza Dra. Ana Peres, é o standard procedure do poder socratino, que continua a vogorar sobre o nosso País.
- O facto do boletim de matrícula mencionar a palavra «isento» contradiz a apresentação dos recibos das propinas que Sócrates em 11-4-2007, na entrevista na RTP-1, onze anos depois do curso terminado. Mais uma do lote habitual.
- A alegação de António José Morais de que o aluno Sócrates foi vítima de um «grupo do PSD» na UnI, nomeadamente em Inglês Técnico, no qual participaria o Prof. Eurico Calado choca com a realidade dos factos apurados sobre a rocambolesca licenciatura do então secretário de Estado na Universidade Independente. Em vez de sacudir a água da samarra, Morais, fragilizado pelo processo da Cova da Beira onde é arguido, devia antes ter-se alforriado do tandem Sócrates-Vara, ou simplesmente evitado a fuga em frente que desprotegeu ainda mais o ex-primeiro-ministro. Inglês Técnico foi uma jogada Arouca, e sem ela, Sócrates apenas teria de fazer as quatro cadeiras de que era responsável o seu velho amigo e conviva da Cova da Beira. Tudo em família.
O cerco aperta-se sobre José Sócrates. Independente e Freeport (além do processo do aterro sanitário da Covilhã) situam-no e sitiam-no. Ausente dos tribunais, está ainda mais presente do que se lá estivesse sentado. Não se trata aqui, nem no caso crítico dos cartões de crédito do Governo anterior, de um julgamento político. Trata-se de tratar os políticos como qualquer outro cidadão, sujeitos de direitos mas também de deveres.
Pós-Texto (10:57 de 2-4-2012): O «engenheiro Pinto de Sousa»
O comentador Themistocles informou ontem que, no julgamento sobr a gestão da Universidade Independente, não foi a juíza-presidente Dra. Ana Peres quem tratou José Sócrates por «engenheiro Pinto de Sousa», mas a procuradora. Em qualquer caso, tratar por engenheiro alguém que, como está provado, é público e notório, indepedentemente da sua rocambolesca licenciatura, não é, nem nunca foi, engenheiro, é errado. Já é hora de, pelo menos nos tribunais, se terminar com a farsa política de chamar engenheiro a José Sócrates
* Imagem picada daqui.
Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa não é, nem chegou a ser, arguido no inquérito para averiguação de eventual falsificação de documento autêntico, no seu diploma de licenciatura em Engenharia Civil da Universidade Independente (Processo n.º 25/07.5.TE.LSB do DCIAP); e o inquérito foi arquivado, em 31 de Julho de 2007, pela procuradora-geral adjunta Dra. Maria Cândida Almeida e pela procuradora adjunta Dra. Carla Dias.
Luís Arouca, António José Morais e demais entidades referidades neste poste, referidos nas notícias dos media, que comento, não são arguidos por cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade neste caso da licenciatura do ex-primeiro-ministro José Sócrates.
Os arguidos noutros processos, como Luís Arouca, no processo da gestão da Universidade Independente, ou como António José Morais, no processo do aterro sanitário da Cova da Beira, gozam do direito constitucional à presunção de inocência até ao trânsito em julgado de eventual sentença condenatória.