quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O livro de Rui Verde sobre a licenciatura de Sócrates na UnI e a sua consequência

Rui Verde, ex-reitor da Universidade Independente (UnI) lançou hoje o livro «Processo 95385 - como Sócrates e o poder político destruiram uma universidade». O Público, por José António Cerejo e Andreia Sanches, publicou hoje, 30-11-2011, aquilo que, alegadamente, são os originais do processo individual do aluno José Sócrates, na Universidade Independente (UnI), em 1996, que o vice-reitor Prof. Rui Verde conservou. Também a TVI, pela jornalista Paula Costa Simões, fez uma notícia sobre as revelações de Rui Verde nesse livro. O Público, através dos mesmo jornalistas, revela, também hoje, excertos do livro, em pré-publicação, num artigo intiulado «O namoro com o poder nos bastidores de uma universidade».

Começo por transcrever a notícia do Público e depois a da TVI. A seguir,  comento, comparo e concluo, face ao que escrevi no meu livro «O Dossiê Sócrates», de Setembro de 2009.

«Ex-dirigente da Independente revela dossier original da licenciatura de Sócrates
30.11.2011 - 07h18 José António Cerejo, com Andreia Sanches


A totalidade dos originais do processo individual relativo à licenciatura de José Sócrates na Universidade Independente (UnI), que o PÚBLICO viu e fotografou na segunda-feira, encontra-se na posse de Rui Verde, um antigo vice-reitor daquele estabelecimento. Rui Verde, que está a ser julgado, juntamente com 23 outros arguidos, pela alegada prática de numerosos crimes na gestão da UnI, diz que tem o dossier de Sócrates desde “muito antes” da abertura do inquérito judicial que, em Agosto de 2007, concluiu não ter havido “qualquer crime de falsificação de documento autêntico” na obtenção da licenciatura do então primeiro-ministro.
A ser verdade que este conjunto de 17 documentos já estava com o antigo vice-reitor quando o Procurador-Geral da República determinou, em Abril de 2007, a realização de um inquérito para averiguar se aquele crime tinha ou não sido praticado, a conclusão a que chegaram a procuradora-geral adjunta Cândida Almeida e a procuradora-adjunta Carla Dias, responsáveis pela investigação, terá tido como fundamento, entre outros, a análise de fotocópias e não de documentos originais.
A afirmação de que as peças originais do dossier do aluno não são aquelas que em Março de 2007 foram divulgados pela imprensa surge pela primeira vez num livro escrito por Rui Verde que hoje começa a chegar às livrarias. Intitulada O Processo 95385 - Como Sócrates e o poder político destruíram uma universidade, a obra é editada pelas editoras D. Quixote e Exclusivo Edições e reproduz todos os documentos do dossier, identificando-os como originais, mas sem nada dizer sobre o local onde se encontram, nem sobre o facto de serem, ou não, os mesmos que o DCIAP investigou.
O PÚBLICO tentou saber, na terça-feira de manhã, junto da directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), a procuradora Cândida Almeida, se os documentos analisados no decurso do inquérito foram os originais ou as cópias. Em resposta, o DCIAP informou, ao fim da tarde, que “os documentos que serviram de base à investigação e ao despacho de arquivamento” se encontram junto ao processo no Tribunal de Instrução Criminal, que o PÚBLICO tentará consultar nesta quarta-feira.
A natureza dos documentos que o DCIAP apreciou surge aqui como fulcral, na medida em que, de acordo com o despacho que determinou a abertura do inquérito, o que se pretendia era investigar uma denúncia de falsificação de documentos.
O ex-primeiro-ministro José Sócrates foi contactado pelo PÚBLICO mas afirmou desde logo que não iria falar sobre o livro.


“Fiel depositário”
Em declarações ao PÚBLICO Rui Verde revelou que o dossier está na sua posse desde que, “muito antes” de Março de 2007, o levou para casa, tal como fez com outros documentos que julgou importantes e guardou, “como fiel depositário”, uma vez que era presidente da direcção da SIDES, sociedade proprietária da UnI. Rui Verde salienta que nunca ninguém lhos pediu, nem perguntou por eles, e que os entregará a qualquer autoridade que tenha legitimidade para os pedir.
O autor de Processo 95385 (o número é aquele que José Sócrates tinha como aluno da UnI) explica o facto de não dizer no livro que tem o dossier com ele – nem equacionar a questão de o inquérito do DCIAP poder ter sido feito a partir de fotocópias – com o lugar secundário que atribuiu ao caso. Mesmo assim, escreve que é “muito estranho” a documentação divulgada não ser a original e afirma que isso “comprova uma tentativa posterior de sustentação do processo”.
No interior de uma capa de cartolina da UnI com o nome de José Sócrates e o número 95385 Rui Verde tem os originais dos diferentes documentos que constituem o dossier do aluno – incluindo o certificado de habilitações emitido em seu nome pelo Instituto Superior de Engenharia de Lisboa (ISEL) em Julho de 1996 e que servira de base, um ano antes, à atribuição das equivalências às disciplinas da UnI.
Este é um dos elementos do dossier em que mais sobressaem as características de um original. Os sulcos vincados pelo selo branco do ISEL vêem-se claramente e o selo fiscal verde, com a cruz de cristo vermelha por cima, está lá colado com a assinatura atravessada do funcionário responsável pela emissão do certificado. O mesmo sucede com um cartão-de-visita do então ainda secretário de Estado José Sócrates (que acompanhava um texto que serviu de prova de avaliação para a cadeira de Inglês Técnico e que foi entregue em mão própria ao reitor Luís Arouca) em que o relevo da esfera armilar é sensível ao tacto e visível a olho nu.
Nas restantes peças do dossier, a cor das canetas e esferográficas com que os impressos são preenchidos, bem como os logotipos coloridos da UnI, sublinham a diferença com as fotocópias que os jornalistas do PÚBLICO e do Expresso referiram terem-lhes sido mostradas em 2007.
Ao jornalista do PÚBLICO, o então reitor Luís Arouca, que é também um dos arguidos do processo que está a ser julgado em Lisboa, explicou mesmo, nessa altura, que ele só podia aceder às cópias, visto que, “por questões logísticas”, os originais não estavam disponíveis.


Pauta não assinada
A análise detalhada dos originais detidos por Rui Verde não mostra, todavia, grandes diferenças de conteúdo entre estes e as cópias tornadas públicos há quatro anos. Mas as que mostra são óbvias.
Uma delas prende-se com a pauta relativa à prova de Inglês Técnico de José Sócrates. Nem cópia nem original são datadas, mas a cópia exibida aos jornalistas apresenta uma assinatura ilegível do “responsável pela classificação”. Já no exemplar de Rui Verde, a mesma pauta, idêntica em tudo o resto, mas preenchida a azul e em impressos originais, não tem qualquer assinatura.
O outro documento que não coincide com as cópias mostradas aos jornalistas é a própria prova feita por Sócrates na mesma disciplina. De acordo com o que escreveram na altura as jornalistas do Expresso que viram as cópias, as correcções efectuadas por Luís Arouca nas três páginas do texto entregue por aquele aluno estão assinaladas a vermelho. Ora no exemplar que está na posse do antigo vice-reitor elas estão inscritas a lápis.
Apesar de não se alongar no livro em relação às diferenças que encontrou entre os originais e as cópias divulgadas, o autor sustenta que a sua prisão em 21 de Março de 2007, véspera da divulgação das falhas existentes no dossier de Sócrates nas páginas do PÚBLICO, está ligada à licenciatura do antigo primeiro-ministro – embora tenha ocorrido no quadro de uma investigação relativa à gestão da universidade.
Rui Verde lembrou ontem que nessa altura o seu telefone estava sob escuta, no âmbito daquela investigação, e que na tarde do dia 21 tinha um encontro marcado com uma jornalista do Expresso a quem iria falar da existência de irregularidades no processo de Sócrates.
O ex-presidente da direcção da SIDES conta que durante as buscas à casa em que vivia foi apreendida, no dia em que foi preso, uma cópia do dossier de Sócrates e que, meses depois, foi levado ao DCIAP, sob prisão, para ser ouvido no inquérito ali em curso sobre a alegada falsificação, não tendo prestado declarações. Ao PÚBLICO disse ontem que não foi confrontado com qualquer documento, pelo que não sabe se o que o DCIAP tinha eram cópias ou originais. “Mas originais não eram seguramente porque os originais, verifiquei depois, tinha-os eu.” Rui Verde explica o seu silêncio até agora com a circunstância de não estar preocupado com esse assunto na altura e só depois da sua libertação, em Janeiro de 2008, se ter apercebido de que a polícia não tinha levado o dossier. “Eles levaram as cópias e foram essas cópias que o juiz de instrução referiu no despacho em que ordenou a minha prisão preventiva.”


O julgamento em curso
Coincidindo com a polémica da licenciatura do ex-primeiro ministro verificou-se uma intensificação da luta pelo poder que se arrastava na UnI. Meses depois, em Outubro de 2007, o ministro do Ensino Superior, Mariano Gago, ordenava o seu encerramento compulsivo por “manifesta degradação pedagógica”.
As acusações cruzadas de práticas ilegais por parte das diferentes facções da universidade dariam entretanto origem ao chamado processo da Universidade Independente. O inquérito judicial referente a estes factos foi concluído em Maio de 2010 com a decisão do juiz de instrução criminal Carlos Alexandre de levar a julgamento 24 arguidos, entre os quais Luís Arouca e Rui Verde. A acusação imputa-lhes a prática de dezenas de crimes, desde associação criminosa, a burla, falsificação de documentos e fraude fiscal.

O julgamento teve início em Maio deste ano, no Tribunal de Monsanto, e vai agora a meio. O colectivo de juízes é presidido por Ana Peres, a magistrada que dirigiu o julgamento do processo Casa Pia.»

O Público fotografou os 17 documentos do que Verde afirma ser o processo individual de José Sócrates na Universidade Independente. Publico o fac-simile de dois que se encontram na edição em linha, de 30-11-2011:



Pauta da cadeira de Inglês Técnico da UnI, com a nota de 15 valores, do aluno 95389, José Sócrates -
com menção do ano lectivo «95/96», mas sem data, nem assinatura, nem nome do responsável pela classificação.
(Fonte:
Público, 30-11-2011)



Pauta da cadeira de Projecto da UnI, com a nota de 17 valores, do aluno José Sócrates -
assinada pelo professor António José Morais e datada de 8/8/1996
(Fonte:
Público, 30-11-2011)


A notícia da TVI, também de hoje, 30-11-2011, é a seguinte:

«Curso de Sócrates ainda dá que falar
Rui Verde, o ex-vice-reitor da Universidade Independente, conta em livro o processo de licenciatura do ex-Primeiro-ministro
Por: Redacção / CF/ Paula Costa Simões
30- 11- 2011   14: 29

Chama-se o «Processo 95385 - como Sócrates e o poder político destruiram uma universidade» e é através dele que o ex-vice-reitor da Universidade Independente quebra o silêncio.
Rui Verde vem mostrar que nem todos os papeís que estavam no escritório da sua casa coincidem com as fotocópias tornadas públicas em 2007, quando foram noticiadas alegadas falhas e irregularidades na licenciatura de José Sócrates em engenharia civil. É o caso da pauta com a nota de inglês técnico: a que chegou a ser divulgada pela própria universidade está supostamente assinada por Luís Arouca, a que Rui Verde tem não.
No que toca à cadeira do inglês técnico há ainda outra discrepância. A única prova conhecida é um trabalho de três páginas dactilografado, assinado por José Sócrates. A prova que qie os jornalistas do Expresso viram em Março de 2007 estava corrigida a vermelho, ora, no documento que está com Rui Verde as correcções aparecem a lápis.»

É grave se o caso é como o Prof. Rui Verde conta, se os documentos que o Público fotografou são de facto os originais, e se foram fotocópias alegadamente apócrifas, os alegados documentos que terão servido para o Inquérito judicial, a cargo da procuradora-geral adjunta, Dra. Maria Cândida Almeida, e procuradora-adjunta Dra. Carla Dias, no DCIAP, para averiguação de eventual crime de falsificação de documento autêntico, no diploma de licenciatura em Engenharia Civil de José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa (Processo n.º 25/07.5.TE.LSB do DCIAP), por queixa do advogado Dr. José Maria Martins, em 90 de Março de 2007 - ver pp. 76, 265-271 e 305-347 do meu livro «O Dossiê Sócrates - A investigação do percurso académico de José Sócrates» (edição gratuita e edição impressa), de Setembro de 2009. É que o despacho de arquivamento do inquérito elaborado pelas referidas senhoras procuradoras, e datado de 31 de Julho de 2007, conclui que, apesar de tudo, José Sócrates se licenciou pela Universidade Independente em 1995/96. Recordo o que escrevi no meu livro «O Dossiê Sócrates», p. 312:

«(...) o despacho de arquivamento, estatuíu:


“Certo é que dos documentos apresentados aos autos, certificado de habilitações e notas finais obtidas nas disciplinas que teve de frequentar e em que obteve aproveitamento, resulta que José Sócrates se licenciou no ano lectivo de 1995/1996.”
A justificação desse atestado parece ser o facto de a universidade o dizer e, no certificado de habilitações e notas de José Sócrates, isso constar. Isto é, a validade acaba por ser aferida pela própria universidade, apesar do processo rocambolesco de admissão, das equivalências incompletas, da leccionação, dos docentes, do modo dos trabalhos e exames e do contraste indisfarçável com as disposições legais e regulamentares. Apesar de tudo isto: segundo as senhoras procuradoras do Ministério Público, a licenciatura de José Sócrates é válida.
Por fim, a procuradora-geral adjunta Dra. Maria Cândida Almeida e a procuradora adjunta Dra. Carla Dias terão concluído:




“não ter havido qualquer tratamento de favor do aluno José Sócrates, em detrimento dos restantes candidatos à licenciatura, em igualdade de circunstâncias académicas, que tivesse determinado a prática de um crime de falsificação de documento autêntico, na modalidade de falsificação de documento, e, muito menos, que José Sócrates tivesse cometido o crime de uso de documento autêntico falso”.


A conclusão do Ministério Público de que não houve “qualquer tratamento de favor” toma-se não porque não tenha sido beneficiado face à lei e aos regulamentos, não porque não tenha sido beneficiado face aos demais alunos doutras instituições do ensino superior português público e privado, mas porque, no entendimento das senhoras procuradoras, baseado na sua interpretação de documentos e testemunhos, não foi beneficiado face aos demais alunos da turma especial da UnI.
Ao contrário, disse-se, o despacho de arquivamento atesta que José Sócrates e os colegas foram “vítimas de uma publicidade agressiva e bem programada, por parte da UnI – Universidade Independente”. Portanto, Sócrates não foi favorecido: Sócrates foi vítima…»

Ora, , com suporte de documentos que alega serem os originais - não sabemos que perícia fez o Ministério Público sobre as alegadas fotocópias do inquérito para saber se eram documentos autênticos - Rui Verde vem agora dizer que:

1. A pauta de Inglês Técnico, que Verde mostrou ao Público e à TVI, nem estava assinada. Então, o que seria a outra assinada pelo reitor Luís Arouca?!...

2. O exemplar da prova de Inglês Técnico foi corrigida a lápis  - em vez de a vermelho como atestaram as jornalistas Mónica Contreras e Rosa Pedroso Lima, no Expresso de 31-3-2007, ter-lhes sido mostrada, sem que lhes fosse autorizado tirar cópia. Sócrates mostrou a prova na entrevista à RTP em 11-4-2011, e o Sol, de 17-4-2011, publicou-a. Se a versão a lápis é aquela mostrada na entrevista da TVI, como se indica ali, ela parece coincidir com aquele exemplar publicado no Sol, de 17-4-2011 (ver p. 131 do meu livro). Seria o fac-simile do Sol a da correcção a vermelho ou a sua fotocópia a preto e branco em que o vermelho aparece a cinza ou a versão a vermelho outra diferente e não mostrada? Sobre este ponto, veja-se o fac-simile das folhas da prova do Sol/RTP e a minha análise no meu livro «O Dossiê Sócrates», pp. 129-134. No meu livro (pp. 131-132) escrevi:
«Segundo o Sol de 17-4-2007, citado pelo Público desse dia, “a aprovação de José Sócrates na cadeira de Inglês Técnico na Independente foi obtida com um trabalho feito em casa numa folha A4, enviado ao reitor e acompanhado de um cartão com o timbre do seu gabinete de secretário de Estado. Ainda de acordo com o jornal, o texto em inglês é o único documento de avaliação que consta do dossier de aluno de Sócrates. (…) Elaborado pelo então secretário de Estado do Ambiente no dia 22 de Agosto de 1996, o teste de Inglês Técnico foi classificado pelo reitor Luís Arouca quatro dias depois, a 26 de Agosto.” Porém, a data de conclusão da licenciatura do certificado datado de 26-8-2006 de (com “21” no indicativo telefónico do timbre, um facto possível só depois de 1999…), entregue na Câmara Municipal da Covilhã para reclassificação profisional, é de 8-8-1996… dezoito dias antes da classificação da prova de Inglês Técnico pelo reitor Luís Arouca da UnI. O gabinete do primeiro-ministro explicou, depois, que o certificado válido era aquele emitido em 17-6-2003, em que a licenciatura tinha sido concluída ao domingo (8 de Setembro de 1996), o documento que antes tinha negado por inverosímil (o domingo é um dia estranhíssimo para efectuar um exame de licenciatura)… Isto é, aproveitava a data de conclusão do curso de um certificado e a data de emissão do outro…»
No Público, de hoje, 30-11-2011, os jornalistas José António Cerejo e Andreia Sanches mencionam que viram, e palparam, o cartão de visita de Sócrates, que também foi mostrado na reportagem da TVI, de 30-11-2011, que terá sido entregue «em mão própria ao reitor», além da prova. Terá sido a prova enviada por fax, como o Sol, de 17-4-2007 indicou, e o cartão entregue depois, com o original da prova, em mão, ao reitor Arouca, com o envelope que a TVI, de hoje, 30-11-2011 mostrou? Em qualquer caso, além do curso não poder ter sido concluído em 8 de Agosto de 1996 (uma quinta-feira), pois a prova de Inglês Técnico (um texto ambiental que fede a documento técnico para a União Europeia...) foi datada pelo alegado faxador em 22 de Agosto de 1996 - e a correcção do reitor Arouca (na versão do Sol, de 17-4-2007, que será a mesma «a vermelho» que viram as jornalistas do Expresso na semana anterior à edição do seu jornal de 31-3-1996?) tem a data de 26-8-1996.

3. Na TVI, de 30-11-2011, em entrevista a Paula Simões, Rui Verde relaciona a sua prisão, em 21-3-2011, com um alegado encontro que teria combinado pelo seu telefone, alegadamente sob escuta, com jornalistas do Expresso onde lhes iria alegadamente entregar documentos do caso, e com a divulgação pelo Público, no dia seguinte, do Dossiê Sócrates na Universidade Independente (aproveitando o meu trabalho de Fevereiro e Março de 2005 e de Fevereiro e Março de 2007) - uma edição do jornal que explica ter visto, no dia seguinte, quando foi inquirido, «a procuradora» (quem: a Dra. Fernanda Pego, que liderou a acusação do processo sobre a gestão da Universidade Independente?), «muito nervosa» a manusear atrapalhada na sua secretária, e que, por isso, terá pensado «estou tramado»...

4. Rui Verde sugere que «é tudo muito estranho» neste caso, pois na busca a sua casa, alegadamente, os agentes da Polícia Judiciária deixaram, no seu escritório, onde alegadamente se encontravam, os originais do processo individual do aluno Sócrates na Universidade Independente,  mas «ficaram com as cópias» desses documentos.

5. O ex-vice-reitor da Universidade Independente afirma que os procedimentos que a UnI seguiu com Sócrates eram a excepção e não a regra. Esta fundamentação opõe-se à das procuradoras Dra. Maria Cândida Almeida e Carla Dias, que arquivaram o caso do diploma do primeiro-ministro, justificando que as irregularidades, que documentaram, que eram procedimentos comuns aos outros alunos e que, por isso, Sócrates não foi favorecido... face aos outros alunos e que Sócrates foi... vítima da própria UnI.

6. Rui Verde dirá no seu livro, segundo a TVI (na reportagem televisiva de 30-11-2011, ligeiramente mais longa do que o excerto em linha), que «talvez Sócrates tenha frequentado uma ou outra aula», mas «é muito improvável que tenha completado o curso»...

7. É sistemático que a Dom Quixote (chancela Livros d'Hoje) tão interessada na publicação do meu livro, tão ansiosa em receber as conclusões explosivas - que levaram a 22 mil exemplares gratuitos descarregados  da Lulu (fora o envio do livro por mail em cascata), onde pude editar um livro que, como me explicou alguém jamais algum editor publicaria, algum distribuidor entregaria e alguma cadeia de livrarias venderia - e tão muda logo que as recebeu (o que fez com a versão preliminar do livro que não devolveu?!...), tenha editado agora, rei-morto-rei-posto, este livro de Rui Verde sobre o percurso académico de Sócrates na Universidade Independente...

Nota: leia-se ainda o José, que sugere aquela que é, em sua opinião, a consequência jurídica desta nova chusma de revelações com o atrasado livro (quatro anos e meio depois dos factos) de Rui Verde: a reabertura do processo da licenciatura de José Sócrates na Universidade Independente.

Estes novos sete pecados do caso impõem a descoberta da verdade. Falta a consequência judicial e administrativa de um caso contaminado pela pressão política.

Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa não é, nem chegou a ser, arguido no inquérito  para averiguação de eventual falsificação de documento autêntico, no seu diploma de licenciatura em Engenharia Civil da Universidade Independente (Processo n.º 25/07.5.TE.LSB do DCIAP) e o inquérito foi arquivado, em  31 de Julho de 2007, pela procuradora-geral adjunta Dra. Maria Cândida Almeida e procuradora adjunta Dra. Carla Dias.
Rui Verde  está a ser julgado por «perto de 50 crimes», incluindo alegadamente os de associação criminosa, burla agravada, fraude fiscal e branqueamento de capitais, no processo sobre a gestão da Universidade Independente, que integra outros 23 arguidos. Luís Arouca também está em julgamento nesse processo, acusado de «cerca de 20 crimes» relacionados com a gestão da Universidade Independente.
As demais entidades referidas neste blogue não são suspeitas ou arguidas da prática de qualquer ilegalidade ou irregularidades, nas notícias dos media que aqui comento.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A insustentabilidade do procurador-geral da República

Recomendo a leitura do poste do José: «Para mau entendedor nem várias palavras bastam...», de 28-11-2011, que cita, e comenta, um excerto da duríssima entrevista da ministra da Justiça, Dra. Paula Teixeira da Cruz, ao Diário Económico, em 28-11-2011, sobre o procurador-geral da República - uma «criatura» de Sócrates, segundo o patriota Fernando Palma, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, no CM, de 28-11-2011.

A posição do procurador-geral da República tornou-se institucionalmente insuportável. O Presidente da República não deve opor-se à substituição do Dr. Fernando Pinto Monteiro; e o Governo tem de apresentar formalmente ao Presidente a proposta de exoneração do procurador-geral (de acordo com a alínea m do art. 133.º da Constituição da República Portuguesa). Venha quem , vier - e tenho um muito mau pressentimento  - não há-de fazer pior.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

BCP: «Oh vais pagar!...»

Agora que o Governo, com apoio da União Europeia e FMI, vai enterrar dinheiro público nos bancos privados portugueses pré-falidos, não é gozar com o pagode, o Activo Bank 7, do BCP, ter lançado a campanha de comunicação do «coro da banca», com a antífona irónica «Oh vais pagar!...»?!...

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O accionista passivo


The Codice, «A injecção da banca»,
num remake de «A garagem da vizinha», de Quim Barreiros


O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, afirmou no Parlamento, em 22-11-2011, a propósito da capitalização da banca, cuja lei foi aprovada em 22-11-2011, que a posição do Estado nos bancos privados não será de um «verdadeiro accionista», pois o Estado será um «accionista passivo». Gaspar repete o erro de parapraxia, de Passos Coelho, em 23-10-2011, que «o Estado será uma espécie de accionista passivo». Freud explicaria o que o povo pressente.

É absurdo que, depois de uma inaceitável decisão de enterrar dinheiro em bancos pré-falidos, o Estado prescinda do direito de fiscalização das contas dos bancos, de verificação do seu crédito malparado, de ser consultado e de votar decisões da administração, de consentir dividendos (enquanto há dívidas não há herdeiros...), isto é, do direito de exercer os poderes que a sua parte de capital permite.

Importa que o Governo perceba que também à direita - e não apenas na esquerda radical - se rejeita o enterro de dinheiro do Estado na nacionalização dos prejuízos, crédito malparado e dívidas da banca privada. O Estado não tem de substituir os accionistas, nem sequer socorrer os aforradores/investidores para lá do que a lei garante. Nem angariar investidores para recapitalizar bancos privados, eventualmente concedendo contrapartidas secretas.

O povo não compreende que o Governo não envie para o Ministério Público o caso da tomada de controlo do BCP por administradores da Caixa, que concederam, com dinheiro público, financiamento para a compra do banco privado a particulares que, passados meses, os indicaram para a administração do BCP - não bastam os casos BPN e BPP. Uma vez mais, o Estado abafa eventuais responsabilidades judiciais em desmandos da banca privada, mas afunda dinheiro público para cobrir as consequências dessas operações insólitas e ruinosas para o Estado.

Ao sacrifício salarial e fiscal que o Governo exige aos portugueses, funcionários públicos, privados e pensionistas, tem de corresponder a responsabilização judicial dos abusadores e o não desperdício do escasso dinheiro do Estado, nomeadamente na banca privada pré-falida. Além disso, o enterro de dinheiro do Estado nesses bancos é inútil: os vermes que nos tragaram a carne, hão-de roer-nos os ossos. Com raras excepções, a banca privada nacional perdeu a confiança dos portugueses por causa de promiscuidade política e de operações mirabolantes: o fluxo de transferência de depósitos para bancos estrangeiros - e mesmo para o estrangeiro - e para a conversão em ouro, não é travado pela intervenção do Estado, como se viu no caso BPN após a nacionalização.

Não faço greve senão para mudar um regime - e, assim, não farei greve hoje, 24 de Novembro de 2011. Mas compreendo a revolta das pessoas perante a injustiça de apertarem o cinto dos cidadãos pagadores de impostos, largarem os abusadores que provocaram a ruína do País e não os levarem à justiça pelos indícios de corrupção, ao mesmo tempo que o próprio Estado enche de dinheiro os bancos pré-falidos.

O povo está zangado com o socialismo bancário, com a bancocracia e com a promiscuidade bloco-centralista. Convém que o Governo perceba a indignação geral do povo perante esta promiscuidade. Não nos resignamos com o humor. Queremos justiça e isenção.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Uma obra de misericórdia




A decisão, anunciada em 19-11-2011, do Governo Passos Coelho de devolver às Misericórdias os hospitais que lhe foram confiscados em 1974 constitui a reparação de um injustiça, cometida em nome da ideologia marxista e da perseguição anti-religiosa. O objectivo, de origem gramsciana, comuno-socialista, era destruir a sociedade civil e dominar o indivíduo, para erguer do caos a sociedade utópica, na qual a caridade seria eliminada, substituída pela ditadura do Estado que tudo mandaria e proveria.

As santas casas da misericórdia não foram apenas usurpadas dos hospitais, mas também tomadas por grupos de revolucionários burgueses que lhes mudaram o nome (de «santas» passaram a profanas e, muitas, de irmandades a fraternidades...), laicizaram os estatutos, mudaram os fins e, por vezes, até se aviaram com os meios... A memória dos dias de delírio pode ser imaginada, como em Alcobaça, em comprometedoras páginas arrancadas de livros de actas... Pelo caminho caótico, como nas ocupações de propriedades no Alentejo e Ribatejo, venderam património, desapareceram bens, e largaram-lhes a administração quando se lhes acabou o dinheiro e as antiguidades.

A Santa Casa da Misericórdia de Alcobaça, fundada em 1563, também foi esbulhada do seu hospital. Em 1612, a instituição abre o Hospital de São Miguel, em frente à igreja do mesmo nome, hospital que transita para o edifício onde ainda hoje se encontra e que foi inaugurado em 1890, já sob batuta anti-clerical. Nacionalizado em 1974, o Estado foi rebocando paredes e adiando uma grande intervenção que reiteradamente prometeu, e jamais cumpriu, pagando a desoras a renda que ele próprio fixou... O hospital foi depois sujeito às bolandas da política nacional, regional e local, nem carne nem peixe, antes pelo contrário - e vice-versa... -, objecto de sonhos de grandeza e pesadelos de miséria, sem rei (como na decapitada coroa da ex-libris da misericórdia local) nem roque, que o protegesse, e convertido num degrau de escalada de breves administradores de passagem. Com a sua desejada devolução à Misericórdia de Alcobaça, espero que se lhe encontre uma vocação própria e melhore, através de uma parceria bem seleccionada, o serviço à comunidade envolvente, ainda que na órbita dos de  Leiria e de Caldas da Rainha, em que o meu concelho foi, na prática, esquartejado. Hospital de São Miguel, de novo.

É justo que o Governo devolva o que não lhe pertence, e, mais ainda, auxilie a sociedade civil, de que as misericórdias são exemplo notabilíssimo de administração zelosa e prudente, como a Santa Casa da Misericórdia de Alcobaça, a cumprir as obras que o Estado já não tem condição de fazer. Mesmo que a decisão do Governo tenha sido precipitada pela insuficiência de recursos do Estado, deve ser louvada e seguida noutras áreas, além da saúde. O Estado deve apoiar: não deve usurpar, nem substituir, a sociedade civil que faz melhor e mais barato.

A vitória do Partido Popular em Espanha



O Partido Popular, de direita, ganhou as
eleições em Espanha, de 20-11-2011, com maioria absoluta: 44,6% e 186/330 deputados no Congresso e 136/208 mandatos no Senado, apesar de receber apenas cerca de 600 mil votos a mais. O PSOE, socialista, teve o pior resultado de sempre, após oito anos de poder e no qual levou a Espanha à beira da ruína e a situação social ao desastre, com um desemprego de 21%: desceu de 43,8% (em 2008) para 28,7% e 110 deputados, perdendo mais de quatro milhões de votos. Diferentemente das eleições portuguesas de 2011, a vitória do PP, com desígnios ideológicos claros de liberalismo na economia e de retorno aos valores conservadores nos costumes, deve-se, então, muito mais à debandada do PSOE para outros partidos (a abstenção apenas subiu 2%), numa dispersão do voto útil de 2008, do que à subida do PP. Mas Espanha fica quase toda monoclorida com o azul celeste do PP, salvo o PSOE em Sevilha e Barcelona e os nacionalistas no País Basco (Amaiur, esquerda radical) e na Catalunha (CiU, direita conservadora), uma situação que se alargará nas autonomias, inclusivé na Andaluzia.

O líder popular, Mariano Rajoy Brey, de 56 anos, galego da vizinha Pontevedra, «um senhor como Deus manda», jurista, chegou muito cedo à política mas já com o ofício de notário, é descrito como austero, rigoroso, hábil e consensual. Dele espera-se a recuperação financeira e económica, como Aznar fez em seu tempo; mas também o fim do delírio do progressismo radical do PSOE. Zapatero, maçon anti-clerical, tomou para si uma missão de vindicta da Guerra Civil, de 1936-39, dividindo novamente o país nas «dos Españas», de que falava António Machado, em 1912, mas acusado agora, pela própria esquerda, que o admirava, de «incompetência» e de «falta de densidade política»... Uma derrota que aconteceu, apesar de, em contraste com Portugal, José Luis Rodríguez Zapatero ser avaliado como um «homem muito honesto (...) muito recto (...) um ser humano íntegro» (segundo o próprio Rei D. Juan Carlos, em 11-5-2008). Contra si, além da situação financeiro-económica gravíssima e da sujeição europeia ao predomínio prussiano, e não obstante um PSOE em escombros, Rajoy tem o extremismo político, antidemocrático, da escatologia anti-religiosa e meta-comunista, que permeia o movimento dos indignados da Puerta del Sol, em Madrid que promete: «arderéis como en el 36» e «Rajoy, recuerda: tenemos una cuerda»... Ou seja, além do desafio de recuperação da economia e das finanças do Estado, Rajoy tem ainda pela frente uma tarefa quase impossível de reconciliação política e ainda de reconciliação geográfica (com os nacionalismos basco e catalão).


* Imagem picada daqui.

domingo, 20 de novembro de 2011

O impasse na exoneração do procurador-geral da República

Entrevista da ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, ao Expresso, de 12-11-2011:
«- As suas divergências com o PGR Pinto Monteiro mantêm-se?
- As divergências são claras e mantêm-se.
- Ele vai cumprir a comissão de serviço até ao fim?
- Essa decisão é também da competência do Presidente da República.
- Por proposta do Governo.
- É verdade mas nunca traria para a praça pública questões interinstitucionais.»

A denúncia implícita da ministra sobre o Presidente da República na protecção do procurador-geral, Dr. Fernando Pinto Monteiro, só pode ter uma - e só uma! - resposta do Presidente: a aceitação pelo Presidente de uma proposta do Governo para a exoneração do procurador-geral - ou a informação pública de que o Presidente aceitará a exoneração do Dr. Pinto Monteiro logo que lhe chegue uma proposta do Governo nesse sentido que afirma pretender. De outro modo, aos olhos da elite política e do público, o Prof. Cavaco Silva fica embaraçosamente refém do procurador Pinto Monteiro - e do Governo...

sábado, 19 de novembro de 2011

O potente secretário de Estado da Cultura

Afinal, ao contrário do que acintosamente acusou Diogo Infante, em 16-11-2011, o secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, não se revelou «impotente» (sic). Perante o ultimato do encerramento do Teatro (!), Francisco José Viegas afastou-o imediatamente da direcção do Teatro Nacional D. Maria II, onde ainda se mantinha, apesar de já ter terminado o seu mandato, afirmando firme e sem medo do socratismo:
«Em caso algum a SEC permitirá o encerramento de qualquer teatro nacional ou a suspensão integral da programação do Teatro Nacional Dona Maria II, tal como foi sugerido pelo seu director artístico.»

O Governo precisava de mais Franciscos, corajosos perante o socratismo e capazes da limpeza do Estado face aos anos negros de desperdício e nepotismo, que nos afundaram nesta desgraça.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

O beco e a fuga



«Recessions, in other words, can be fought simply by printing money — and can sometimes (usually) be cured with surprising ease.»

KRUGMAN, Paul, The Return of Depression Economics and the Crisis of 2008, W. W. Norton, 2008

O mago Krugman, de varinha de condão política na mão visível sobre a economia, também explica, em Economics (2009), o efeito espiral de diminuição do bem-estar com a impressão de moeda pelo Estado para pagar dívidas e aumentar crédito, como nota Wolfgang C. Fischer, em Hyperinflation 1922/23: A Law and Economics Approach, Josef EUL Verlag, Lohmar, 2010.

Mas, em 10-11-2011, na sua coluna no New York Times, critica a união monetária europeia, explica a crise na Itália e na Espanha pela falta de uma moeda própria, e recomenda implicitamente a impressão de moeda. Desculpa o Estado Social(ista), argumentando que os países menos afectados pela crise são aqueles com maiores benefícios sociais, destacando o exemplo sueco, em vez de optar pela justificação mais óbvia: os maiores benefícios sociais são consequência do melhor desempenho da economia. Pelo caminho, Krugman, esquece-se da inflação, uma velha senhora que tem regresso anunciado, como consequência inevitável do aumento da massa monetária, o «quantitative easing» (impressão de moeda...) que se promete temporário, e com o argumento de que a inflação (a interna...) ainda não chegou aos EUA, apesar do socialismo europeu de Barack Obama.

Como chegámos a este beco financeiro? Por duas ruas estreitas: numa, o delírio despesista do Estado Socialista, corrupção de Estado e «bancocracia»; na outra, a política germânica do euro forte.

O delírio do Estado Socialista levou ao fomento do ócio, através de prestações sociais de nível absurdo, e ao compromisso promíscuo de obras públicas inúteis e sobrefacturadas. A corrupção de Estado é uma consequência da chegada ao poder de gerações de mini-políticos profissionais de copos e discos, deslumbrados com o dinheiro e praticantes de luvas e comissões, que substituíram a elite académica e a elite burguesa na condução do Estado. E a bancocracia é a tutela política do Estado por banqueiros privados e seus actuais e futuros avençados, os ex-titulares de cargos públicos, com o argumento de que o sistema bancário é o sistema vital da sociedade e que, portanto, o Estado deve socorrer os depositantes e os accionistas dos bancos privados. Uma tutela de corrupção: troca de favores por dinheiro em tachos futuros e em comissões ocultas nos negócios de vendas de activos e de construção, em que os bancos ficam com o grosso do dinheiro. Um socialismo bancário de despesismo e corrupção. Um sistema consentido de câmbio de corrupção por abuso, em que o abuso dos subsidiopendentes é garantido para que o povo não se revolte com a corrupção do poder político.

A política germânica do euro forte foi a prometida moeda de troca para os alemães da criação da união monetária europeia. E tem sido mantida como tal. A Alemanha enriquece, depois de um sacrifício de salários para uma folga de competividade, que foi aproveitada para reformar a tecnologia industrial, e os alemães empregados, reformados e subvencionados, aumentam o seu bem-estar, pela importação de produtos mais baratos. A competividade alemã tem assentado no modelo Miele (como diz um amigo meu) e no modelo Bimby. O modelo Miele consiste em produzir produtos muito melhores do que os concorrentes; e o modelo Bimby consistem em produzir produtos únicos (e com fraca concorrência). Porque os produtos são melhores ou até porque são únicos, o câmbio é muito menos relevante do que em produtos genéricos. Então, o euro forte não prejudica seriamente a economia alemã, e quando isso acontece, o poder político manda aliviar ligeiramente a razão de troca. Simultaneamente, por falta de trabalho, de qualidade e de agilidade industrial, as economias do sul da Europa e outras periféricas definham.

E como se foge do beco? Rompendo o cerco: equilíbrio orçamental, combate à corrupção, eliminação da bancocracia e depreciação do euro. O equilíbrio orçamental é o meio de o Estado funcionar bem, pagando aos fornecedores e aos funcionários e assegurando serviços decentes e prestações razoáveis. O combate à corrupção exige a auditoria ao Estado a renegociação de contratos ruinosos, a barrela do Estado dos dirigentes promíscuos e a pedagógica responsabilização judicial de todos os suspeitos de corrupção de Estado. A eliminação do regime de bancocracia significa o corte com o sistema de financiamento dos prejuízos dos bancos privados, de salvação dos depositantes para além dos valores mínimos que a lei prevê, de enterro de dinheiro público no financiamento em capital, crédito e garantia, de bancos privados falidos, responsabilizando os banqueiros pela administração e os acccionistas e os clientes pelo investimento e pelo aforro. A depreciação significativa do euro, isto é, a redução gradual do seu valor face às outras moedas, é fundamental para a recuperação da economia, através da redução do preço dos bens transaccionáveis, pois a melhoria dos produtos por si só não tem conseguido os ganhos de competividade necessários à diferença de custo para o comprador.

A depreciação significativa do euro carece de uma inversão dos pratos da balança de poder na União Europeia (UE). Os países do Sul e periféricos que, fora da órbita geográfica alemã, não beneficiam da política de euro forte e vêem as suas economias degradarem-se em comparação com a Alemanha, devem reclamar a descida significativa do euro, para aumentarem as exportações e tornar mais caras as importações de produtos, e em aliança com a Grã-Bretanha (que está fora do euro, mas não da UE), forçarem politicamente a emissão e obrigações europeias (eurobonds), além de empréstimos directos do Banco Central Europeu (BCE). O beco da inflação, com o horizonte assustador de uma réplica da república de Weimar em 1922-1923 e do Zimbabwe de Mugabe, é o curral para onde as economias europeias foram empurradas e têm de sair de lá. Na prática, é preciso conquistar democraticamente na União Europeia o controlo sobre o euro - em vez dos dirigentes políticos se comportarem como lacaios silenciosos desta política hegemónica alemã.

Será suficiente a baixa da taxa de juro pelo Banco Central Europeu para o nível próximo de zero da norte-americana para que o euro desça? Não creio: a taxa de juro do euro já se encontra em 1,25% e não me parece que a sua redução a 0,1% levasse o euro à paridade com o dólar. Os EUA têm baixado o valor do dólar para que a economia se reajuste, através da emissão de mais moeda, além do corte da taxa de juro. Depreciam o dólar e pagam as contas, ainda que provoquem um aumento internacional do dólar em circulação, com menor efeito interno.

Então, no beco da ruína económica, asfixiados financeiramente por elevadas taxas de juro nas dívidas soberanas, resta aos países europeus mais aflitos a concessão de crédito do Banco Central Europeu (que terá de ser feito através da emissão de moeda, pois os tesouros nacionais estão exangues) e a emissão de obrigações europeias. Mas importa não ignorar que as obrigações europeias, que a Alemanha tem vetado, seriam, nesta fase de ebulição de cotações das obrigações dos tesouros nacionais, sujeitas a manobras especulativas e não seriam uma solução segura - e menos ainda se a Alemanha se afastar. Em qualquer caso, o crédito do BCE e as eurobonds devem ter a contrapartida dos rápidos equilíbrios orçamentais nacionais e do combate à corrupção.

A solução financeira e económica é ideologicamente desagradável e financeiramente perigosa, não é politicamente fácil e pode implicar a ameaça de cisão da União Europeia - ou, falhando esse movimento político, o retorno à frágil moeda nacional. Mas não parece poder haver sobrevivência política da União sem vitalidade económica, nem um mínimo de bem-estar social sustentado.


Actualização: este poste foi emendado às 20:29 de 16-11-2011.

* Imagem picada daqui.

A gangrena e o pelo do cão

Noticiou o Público, em 14-11-2011:
«REN usa seguro para pagar defesas no caso Face Oculta»

Esta notícia do pagamento pela própria empresa de despesas jurídicas de gestores que a prejudicaram deveria, em primeiro lugar, fazer demitir sem qualquer demora a administração da REN e, depois, determinar a realização de competente inquérito judicial. A barrela geral do Estado implica também a barrela das empresas públicas: e, até agora, não temos nenhuma...

sábado, 12 de novembro de 2011

A tragicomédia da nacionalização parcial dos bancos portugueses

A nacionalização parcial dos bancos privados portugueses em pré-falência é uma tragicomédia bem montada para enganar os contribuintes eleitores. Os três actos da peça seguem o padrão de uma trama muito velha e serôdia:
  1. No primeiro acto: os bancos privados lançam uma campanha de queixas públicas sobre as condições e preço de compra pelo Estado de uma participação no seu capital. Para assustar o povo, podem até dizer que exigem que o Estado pague 50 vezes mais pelas acções do que o preço de mercado, questione nem mande e saia leve.
  2. No segundo acto, o Governo e dirigentes da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI) indignam-se, com estrondo público, perante a posição maximalista dos bancos e suscitam apoiam popular pela sua firmeza.
  3. No terceiro acto, Governo, UE e FMI, acordam com os bancos a nacionalização parcial, que, no final da operação, mais do que duplicará a dívida pública. O Governo aceita um preço das acções bastante acima da cotação do mercado, uma fiscalização mais suave dos livros, direitos de intervenção mais restritos e prazos de pagamento mais dilatados. Os bancos simulam contrariedade, mas esfregam as mãos pelo dinheiro fresco. A peça termina com o povo a louvar o Governo por ter dobrado os bancos e ter conseguido, supostamente, uma entrada mais barata. Desce o pano, perante as palmas do público... e dos actores.

Esta farsa é também uma tragédia para o Estado e para o povo. O caso irlandês - uma quase-catástrofe -, só está a resultar, agora, porque a economia, mais livre e mais ágil, recuperou.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Ração, leite e estrume


Noticiou o Negócios, de 11-11-2011, pelas 11:34: «Bancos querem que o Estado entre no capital ao valor contabilístico».

Não me interessa se é apenas uma posição negocial dos bancos privados, para assegurar o melhor preço na entrada do capital público nos bancos privados - veja-se que, à hora em que escrevo (12:22 de 11-11-2011), o BCP sobe 3% para 0,103 euros com a expectativa de umaespécie de OPV do Estado com prémio de preço face ao valor actual de mercado. Trata-se, da parte dos bancos, de discutir o preço da nacionalização parcial, em que os bancos querem vender por dez o que vale... zero (isto é, ninguém os quer comprar e se quisessem que alguma instituição financeira ficasse com eles teriam de receber um dote fabuloso que cobrisse as dívidas pendentes. Esta nacionalização parcial, que se prepara, consiste numa inversão do estereótipo dos negócios salazaristas: os privados recebem o leite e o Estado alimenta a vaca com ração - e, como bónus extra, fica com o estrume do crédito mal-parado...

O dinheiro público e o Estado não são dos bancos privados, dos banqueiros e dos seus avençados. Os bancos falidos jamais recuperarão a confiança dos depositantes e dos accionistas, como ilustra o caso BPN pós-nacionalização: as marcas ficam queimadas e o reposicionamento em Marketing é muito difícil. Só uma longa nacionalização geral - que Alan Greenspan aconselha - poderia repor alguma estabilidade, mas isso seria à custa de uma montanha de dinheiro público que o Estado nunca recuperará.

O governo deve saber que o povo não concorda sequer que o Governo enterre dinheiro do Estado nos bancos privados. E se, devido ao modelo de promiscuidade político-bancária actual, enterrar dinheiro público em bancos privados falidos - que jamais recuperará - terá de ser ao valor de mercado e sem qualquer prémio de preço. Socorrer financeiramente bancos falidos já é um enorme favor e os bancos privados não estão em condições de impor qualquer condição ao Estado - que não tem, repito, qualquer interesse em lhes dar ou emprestar dinheiro. Aliás, porque aquilo que é pretendido é que o Estado acorra, ele e só ele, com dinheiro vivo para cobrir o serviço de dívida dos bancos - e não apenas com a parte correspondente ao capital que deterá/deteria nos bancos.

O Estado deve pagar a dívida vencida das empresas públicas aos bancos privados. Para lá disso, deve assegurar o pagamento dos depósitos dos particulares e instituições até ao montante legal. Mais nada. O Estado não tem de cobrir o risco dos accionistas, como não cobre de nenhuma outra empresa privada, nem o risco dos depositantes para lá do que a lei define.

Este, ou outro, Governo jamais recuperará de uma decisão de enterrar dinheiro público nos bancos privados e menos ainda da decisão inexplicável de comprar parte do seu capital a um valor acima do mercado. O Governo não pode governar contra a vontade do povo, até daquele que o elegeu.


* Imagem picada daqui.

A sanção possível

Durante anos, mais do que as nossas vidas, famílias, carreiras e bolsos, permitiam, procurámos balas de prata, as tais munições eficazes que disparadas atingiriam o cerne do mal e limpariam a política, actividade mais nobre dos homens, e a própria sociedade civil do efeito, e da vergonha, desse mal.

Concluímos tarde, e em horas de amargura, que não existem balas de prata num sistema corrupto e que, mesmo que algum inventor genial e persistente a criasse e, ousado, a disparasse, jamais ela atingiria o alvo, por este ser avisado previamente do disparo ou porque uma mão invisível se interpunha - para além da circunstância normal de não ter culpa, pois não é culpado por ser político, tal como não deve ser inocente por ser político.

Os casos anteriores e os casos posteriores apenas confirmaram a conclusão tardia: não há balas de prata e há uma mão sistémica invisível.

Na sequência do caso do Fax de Macau, as grandes figuras da República Socialista Portuguesa, nas quais avultavam Mário Soares e Almeida Santos, preocupadas com a eventualidade da ousadia dos magistrados, de uma temida sujeição da República à fiscalização neutra do poder judicial, como na Itália da Tangentopoli que desmorou o sistema, rapidamente se procurou controlar o poder judicial. Isso foi feito, à esquerda e à direita - na direita também existiu o caso Costa Freire e outros -, com convite a magistrados para a ocupação de cargos políticos e administrativos, sem a maçada de longas horas de trabalho isolado e discreto, que a sua profissão acarreta, e com o plus da deferência e do direito a secretárias e  motoristas, carro para todo o serviço, cartão de crédito, ajudas de custo, almoços e viagens, e empregos para a família.

Perante o perigo de escolhas incertas, como a de José Souto de Moura, e a eventualidade de processos de corrupção e outros, passou a haver um vetting profundo dos magistrados que iriam ocupar posições dentro do próprio poder judicial e uma co-optação interna de natureza sistémica, produzida pelos já integrados no sistema e facilitada pelas ligações políticas, algumas forjadas nos tempos da luta revolucionária. Assim se eliminou o perigo de uma república de juízes, que nas elites instaladas, à esquerda e à direita, ninguém queria, ninguém quer. Por cá, ao invés do «fascicolo virtuale» tivemos a «extensão procedimental»...

Esta tragédia portuguesa tem sido consentida - até agora... - pelo povo que também beneficia dos abusos de subsídios e fiscais e de salários e pensões,  mais do que avalia poder o Estado dar-lhe. Mas, como dizia um grego, a fome vai resolver a promiscuidade: enquanto todos espremem a teta do Estado e dela tiram mais do que o crosto, a corrupção e outros crimes políticos são consentidos. Mas quando a fome vier, o crime violento subir, a hipoteca da casa for executada, a empresa de leasing vier buscar o carro, e não houver dinheiro para pagar a saúde e a educação, o consentimento popular dos crimes políticos vai diminuir drasticamente.

A conclusão a que cheguei é de que, nesta situação sistémica do País, a sanção máxima possível para os poderosos é o nome escarrapachado no jornal como arguido e a notícia dos factos, certificados pelos procuradores e juízes de instrução no processo. Engana-se quem pretende mais. Esta sanção não afasta os envolvidos de cargos e posições, mas torna o seu exercício político e mediático mais difícil. Todavia, esta conclusão não deve levar à desistência dos patriotas, mas à continuação da denúncia dos factos e à indignação face à promiscuidade política e financeira.


Actualização: este poste foi emendado às 2:24 de 12-11-2011.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Coincidência



O DN, de 9-11-2011, repete a descoberta do grande segredo judicial português, «O mistério da carta anónima que Vara cautelosamente guardou» e que lhe terá sido apreendida na busca de Novembro de 2009:

«Conversa de restaurante denunciou escutas a Vara

Foi num restaurante em Coimbra que um homem, em 2009, terá ouvido uma conversa sobre escutas com Sócrates. Depois, escreveu a Armando Vara, revelando-lhe a situação. Ontem, as conversas entre Vara e Sócrates dominaram o primeiro dia do julgamento.»

Essa carta apócrifa resolve a dúvida que alguma alma céptica pode ter tido acerca da reunião do Procurador-Geral da República, em 24 de Junho de 2009,  relativa  às implicações do processo Face Oculta e da alegada mudança, a partir de 25 de Junho de 2009, de comportamento dos envolvidos num alegado «plano governamental para controlo dos meios de comunicação social».


* Imagem picada daqui.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias dos media, que comento, não são que eu saiba suspeitos ou arguidos de qualquer ilegalidade ou ilegalidade; e quando na situação de arguidos gozam do direito constitucional à presunção de inocência até ao trânsito em julgado de sentença condenatória.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Escutas de Sócrates formalmente readmitidas: consequências e responsabilidades

CM noticiou em 4-11-2011, a deliberação do Tribunal Constitucional, de admitir o recurso - e pronunciar-se sobre ele -, do Dr. Paulo Penedos relativo à decisão do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o conselheiro Noronha Nascimento, de não permitir a este arguido do processo Face Oculta, de aceder às escutas ao Dr. Armando Vara em que foi interceptado o seu amigo (e primeiro-ministro) José Sócrates. No sítio do Tribunal Constitucional (TC) pode ser consultado um resumo deste Acórdão n.º 514/2011, de 31-10-2011, relativo ao Processo n.º 621/11, da 2.ª Secção, de que foi relator o conselheiro João Cura Mariano, e que foi assinado também pelos conselheiros Joaquim de Sousa Ribeiro, J. Cunha Barbosa, Catarina Sarmento e Castro e Rui Manuel Moura Ramos (presidente do TC). Transcrevo as notícias sobre o caso e depois comento.

No CM, de 5-11-2011, Eduardo Dâmaso, Tânia Laranjo e Catarina Gomes de Sousa, detalham as consequências possíveis deste acórdão do Tribunal Constitucional:

«Decisão
Investigação a Sócrates reaberta
O processo Face Oculta, cujo julgamento começa terça-feira, conhece novos desenvolvimentos: está em aberto a investigação ao crime de atentado contra o Estado de Direito.

5 Novembro 2011
Por: Eduardo Dâmaso / Tânia Laranjo / Catarina Gomes de Sousa

A decisão do Tribunal Constitucional, que anteontem admitiu o recurso de Paulo Penedos relativamente às nulidades levantadas na destruição das escutas envolvendo José Sócrates e Armando Vara, poderá reabrir a investigação ao crime de atentado contra o Estado de Direito. O ex-primeiro-ministro ainda poderá ser constituído arguido, tanto mais que algumas das escutas e SMS trocados com Armando Vara, seu amigo pessoal e na altura administrador do BCP, não foram destruídos.
Outra das consequências do acórdão do Tribunal Constitucional poderá ser a contaminação das nulidades no processo. Explicamos: se Paulo Penedos tiver razão e for irreparável para a sua defesa estar impedido de aceder integralmente às conversas que envolvem José Sócrates, também o será para outros arguidos. Designadamente para o seu pai, à data administrador da REN, cuja prova assenta também essencialmente nas conversas mantidas com o filho.
O perigo de ignorar os restantes intervenientes processuais quando os magistrados decidiram destruir as escutas já tinha sido levantado em Aveiro. Carlos Filipe, o procurador do processo, foi peremptório durante a investigação. "A ausência de notificação desses despachos pode envolver – segundo a jurisprudência e doutrina citadas – a eventual anulação do conteúdo das intercepções que interessam ao processo que corre termos no DIAP de Aveiro, o que poderá vir a ter consequências irreparáveis para o conjunto da investigação", disse então o magistrado, alertando para uma hipótese que foi completamente ignorada.
Ainda segundo o CM apurou, a decisão do Tribunal Constitucional poderá demorar um a dois meses a ser conhecida. Se Paulo Penedos voltar a ganhar o recurso, o Supremo terá de se pronunciar sobre os despachos de Noronha de Nascimento. E aí terá de ser analisada a tese defendida pelo juiz do Tribunal Europeu Paulo Pinto de Albuquerque, que entende que Noronha do Nascimento não tinha competência para impedir a investigação – destruindo as escutas –, já que as situações em causa não diziam respeito à actividade de Sócrates enquanto primeiro-ministro.

SUCATEIRO TENTOU COMPRAR À CP
Foi há pouco mais de um mês que a Raplus venceu um concurso público para adquirir sucata da CP, uma das maiores lesadas pelo empresário de Ovar. A empresa de Godinho ofereceu 790 mil euros para adquirir 39 veículos ferroviários. A adjudicação só foi travada porque o Estado quis saber em que condições é que a Raplus venceu o concurso. Para já, sabe-se que vários funcionários recebiam incentivos monetários de Godinho em troca de informações sobre a adjudicação de obras.

GODINHO COMPRA DOIS BARCOS
Manuel Godinho continua a fazer negócios. Desta vez, foi através da Raplus, uma das suas empresas, que o principal arguido no processo ‘Face Oculta’ comprou dois navios, em concurso público, por um milhão e 600 mil euros.
Os barcos foram postos à venda pela Marinha Portuguesa no dia 27 de Outubro e só podiam ser vendidos juntos. O preço--base de licitação era de 170 mil euros. A Raplus participou no concurso milionário e ofereceu mais de um milhão de euros pelos dois navios. Assim, foi a empresa que apresentou a melhor proposta.
No entanto, o contrato ainda não foi assinado. Para que se confirme a compra, é necessário entregar à Marinha o registo criminal de todos os administradores da empresa. Além disso, nenhum dos candidatos pode ter dívidas ao Estado ou à Segurança Social. Só depois da apresentação destes documentos é que os barcos serão adjudicados, ou não, à Raplus. O Correio da Manhã tentou entrar em contacto com Melchior Gomes, advogado das empresas de Godinho, mas tal não foi possível até ao fecho desta edição.»

O mesmo CM, em 6 de Novembro de 2011, desenvolve a notícia:

«‘Face Oculta’: Constitucional relança caso
Juiz ganha guerra das escutas


Carlos Alexandre, juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa, é o grande vencedor da guerra que se instalou no ano passado entre juízes sobre a destruição das escutas de Sócrates. O CM sabe que o juiz se sentiu ‘reconfortado’ com a recente decisão do Tribunal Constitucional sobre a questão.

6 Novembro 2011
Por: Tânia Laranjo/Ana Isabel Fonseca

Carlos Alexandre ordenou durante a instrução do caso ‘Face Oculta’ que os despachos do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento, para destruir as escutas de Sócrates fossem contraditados. O Tribunal Constitucional, que agora aceitou discutir a questão, acaba por lhe dar razão, ao admitir o recurso interposto pela defesa de Paulo Penedos, liderada pelo advogado Ricardo Sá Fernandes.
Os juízes do Constitucional vão agora pronunciar--se sobre se as decisões de Noronha Nascimento podem ser contraditadas ou se, pelo contrário, são insindicáveis, conforme o próprio defendia.
Recorde-se que em Fevereiro do ano passado, durante a instrução do processo, que decorreu em Lisboa, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça chegou inclusive a ameaçar mover um processo disciplinar a Carlos Alexandre se aquele não destruísse de imediato as escutas obtidas no processo ‘Face Oculta’ que envolviam José Sócrates.
Noronha Nascimento disse então a Carlos Alexandre, num despacho enviado aos arguidos e assistentes do processo, que se o juiz quisesse poderia mandar as escutas para o Supremo Tribunal de Justiça, que ele próprio (Noronha) as destruiria. Carlos Alexandre disse que não o fazia e escreveu mesmo, num outro despacho, que também consta do processo ‘Face Oculta’, que não recebia ordens de Noronha Nascimento no que dizia respeito àquelas escutas.
Estavam em causa transcrições de conversas, copiadas por engano e que já foram mandadas destruir, e mais de uma dezena de mensagens entre Armando Vara e José Sócrates relativas à compra da TVI.
Também o juiz de instrução António Costa Gomes, que teve o processo a seu cargo na comarca do Baixo-Vouga, foi várias vezes censurado por Noronha Nascimento e pelo procurador--geral da República, Pinto Monteiro, por se recusar a destruir as escutas por meras ordens provenientes da hierarquia da magistratura judicial.

LINO INVESTIGADO EM AVEIRO POR CORRUPÇÃO
Mário Lino, ex-ministro dos Transportes, está a ser investigado por corrupção e abuso de poder. A certidão extraída do ‘Face Oculta’ está em Aveiro, com o procurador Carlos Filipe.
O inquérito começou com as declarações de Ana Paula Vitorino, ex-secretária de Estado dos Transportes, que à PJ de Aveiro assumiu ter sido contactada por Lino. Este ter-se-á mostrado muito preocupado com a forma como Godinho estava a ser tratado na Refer. O ex-ministro terá denominado ainda o sucateiro de "amigo do PS" e referido que vários membros do partido estavam preocupados com o comportamento do presidente do conselho de administração da Refer, Luís Pardal.

Comento as consequências possíveis e as responsabilidades dos magistrados intervenientes.

Nas consequências possíveis do caso Face Oculta além de se poder chegar ao padre eterno, como dizia Sciascia, e eventualmente reabrir o inquérito sobre atentado contra o Estado de direito, vale um juízo sobre as responsabilidades de quem decidiu nesse processo. Confesso que não espero decisão condenatória do processo Face Oculta, como não espero que Isaltino Morais cumpra a pena de prisão a que foi condenado, como não espero que venha para Duarte Lima, em Portugal, consequência maior do processo brasileiro do que o ostracismo mediático que o próprio sabe ser necessário para não embaraçar o poder. Tal como, com a lei actual e a sua aplicação processual, não espero condenação de qualquer processo que envolva figuras do poder. O processo de abuso sexual de crianças da Casa Pia, em que se chegou ao cúmulo temporário de prisão preventiva da segunda figura do Partido Socialista, Dr. Paulo Pedroso, foi apenas uma excepção à regra de imunidade sistémica dos poderosos, independentemente da culpa, que neste caso também não foi provada pelo tribunal: arguido e acusado, não foi pronunciado, não tendo sequer ido a julgamento.

Nas responsabilidades dos magistrados sobre o caso Face Oculta, apura-se o resultado das decisões proferidas. Estava certo, o juiz Carlos Alexandre, presidente do Tribunal Central de Instrução Criminal, de Lisboa, que instruiu o processo, em não querer destruir de imediato as escutas que envolviam José Sócrates e em conceder ao arguido Dr. Paulo Penedos, a possibilidade do recurso da decisão do presidente do Supremo, Noronha Nascimento, bem como o juiz de Aveiro, António Costa Gomes. Estes juízes são merecedores de um louvor público, por terem tomado decisões justas face ao poder socialista para-ditatorial de José Sócrates.

E estavam errados o conselheiro Noronha Nascimento, presidente do Supremo tribunal de Justiça, ao não permitir recurso da sua decisão e em destruir imediatamente as escutas, e o conselheiro Fernando Pinto Monteiro, procurador-geral da República, em tesourar as páginas dos processos com essas escutas, que suportavam o inquérito sobre atentado ao Estado de direito alegadamente cometido por José Sócrates e outros. Esperava o povo que um e outro, Noronha Nascimento e Pinto Monteiro, se demitissem, uma vez conhecida a deliberação que os desautoriza. Como não se demitiram, espera agora o povo que o Conselho Superior de Magistratura se pronuncie...


* Imagem picada daqui.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias dos media, que comento, não são que eu saiba suspeitos ou arguidos de qualquer ilegalidade ou ilegalidade; e quando na situação de arguidos gozam do direito constitucional à presunção de inocência até ao trânsito em julgado de sentença condenatória.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

A Desunião Europeia


«Progress, far from consisting in change, depends on retentiveness. When change is absolute there remains no being to improve and no direction is set for possible improvement: and when experience is not retained, as among savages, infancy is perpetual. Those who cannot remember the past are condemned to repeat it.»

SANTAYANA, George, The Life of Reason: The phases of human progress, 1905-1906

Aqueles que não conseguem lembrar-se do passado estão condenados a repeti-lo. Se, por ignorância ou por negligência, olvidamos o passadoacabamos por cair no alçapão da história. Neste caso, desprezar a lição da história europeia, da recorrente hegemonia nacional liderada pela bandeira de uma grande ideia, que esconde um desígnio de conquista e domínio, implica o risco de cair na subserviência.

Quando os dirigentes de uma organização internacional proíbem um referendo num país,
Quando os dirigentes de uma organização internacional rejeitam eleições imediatas num país,
Quando os dirigentes de uma organização internacional escolhem, na prática, o Governo de um país, indicando a coligação que o deve compor, inclusivamente contra a vontade de um deles que não queria governar aliado ao outro,
Quando os dirigentes de uma organização internacional decidem a política que deve ser seguida pelo governo de um país,
Então, essa organização - a União Europeia - deixa de respeitar a democracia e tende para um directório ditatorial.

O projecto de uma federação europeia já era difícil como mercado comum de 6 países e tornou-se instável, com 27 Estados, numa união monetária que sofre de desigualdades económicas agrestes. Vai soçobrando agora numa união política, usurpada pelo directório da Alemanha, acolitada pela França, que decide governos e políticas, se necessário contra a vontade popular dos outros países, interrompendo a democracia local por motivo alheio.

Como se não fosse suficiente a ambição das potências, ainda se soma o delírio político de imposição utópica do modelo do Estado socialista, uma deriva socialista e corrupta do Estado Social de bem-estar. Uma política económica desastrosa e uma política financeira ruinosa.

Uma política económica desastrosa: o modelo utópico do Estado Socialista. Um Estado que dá tudo, incluindo dinheiro, e nada exige. Um modelo social ingénuo de prestações sociais insuportáveis que convida ao ócio e rebenta com a economia.

E uma política financeira ruinosa: corrupção, endividamento público e privado, «socialismo bancário»  e prioridade política à salvação dos banqueiros, à nacionalização das dívidas dos bancos privados e ao pagamento, a bem ou a mal, pelos Estados das dívidas de bancos privados aos bancos estrangeiros em estreita aliança com a promiscuidade ubíqua interna entre governantes e bancos privados.

Sem enterrar esse cadáver mal-cheiroso do Estado Socialista e sem cuidar dos vivos, velando descompensadamente o modelo falecido, sem impor a reforma de modelo político, não pode haver recuperação económica e social. Depois do choro das exéquias, é hora de reformar o sistema político, com democracia directa que reduza a corrupção, e rerguer um modelo político que dê prioridade à economia sobre a finança, ao equilíbrio orçamental sobre o endividamento e ao trabalho sobre a preguiça. Um modelo de Estado responsável.

Sem recusar frontalmente o directório germânico de muleta francesa, não pode haver progresso europeu. Em vez dos «contes des mille et une nuits» e da tentativa ingénua de «quadrature du cercle», como prevenia Charles de Gaulle, numa conferência de imprensa em 15-5-1962, que conviria ouvir de novo, precisamos de recuperar o modelo da Europa das Pátrias.

Neste quadro caótico, de tensões políticas entre os contribuintes alemães e os despesistas gregos, entre povos e bancos, entre políticos corruptos e cidadãos aflitos, e sem estadistas responsáveis, parece cada vez mais distante o projecto utópico dos Estados Unidos da Europa e cada vez mais complicado salvar o euro, a estabilidade de preços e mesmo assim sem recuperação económica, o nível de bem-estar actual. Se a mistura explosiva do modelo de Estado Socialista e do directório dentro da União Europeia não for neutralizada, determinará a ruptura do projecto de integração económica e monetária da Europa. Isto é, a pressão autoritária, sob o mesmo modelo político-ideológico obsoleto e sob tutela alemã, para a união política de cariz totalitário de espaços económicos realmente desintegrados, destrói o sonho europeu de progresso conjunto e de harmonia.


* Imagem picada daqui.


Actualização: este poste foi actualizado às 11:22 de 8-11-2011.

domingo, 6 de novembro de 2011

Regra três complicada...

Qualquer que seja a fórmula escolhida para a intervenção do Estado nos bancos privados -
  • empréstimo (com desvio do crédito da União Europeia/FMI)...
  • nacionalização (com repercussão internacional, nomeadamente angolana) total ou parcial (em que o Estado dá o capital e os privados mandam)
  • bad bank (compra do crédito mal parado)

se o BPN representava cerca de 2% do sistema financeiro português (em 2008) e o salvamento pelo Estado custou 5 mil milhões de euros, quando custará agora ao Estado socorrer o maçónico BCP, que representa 20%, e o socratino BES, que representa outros 20%?

O Estado deve pagar as dívidas vencidas das empresas públicas aos bancos, em vez de lhes exigir a rotação dos créditos. Mas não deve antecipar pagamentos de empréstimos em curso. Nem torrar o dinheiro dos contribuintes em empréstimos, nacionalizações ou compra de activos passivos. Nem garantir pagamentos de depósitos dos particulares para lá daqueles que a lei estabeleceu. Quem compra acções de uma empresa, como um banco, arrisca e deve ser responsável pelos investimentos que faz; quem deposita dinheiro num determinado banco, por exemplo, por lhe oferecerem maior juro, arrisca e deve ser responsável pelo aforro que escolhe. A solução patriótica é firme: nem um tostão de dinheiro público deve ser enterrado nos bancos privados.


Actualização: este poste foi actualizado às 1:16 de 7-11-2011.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O controlo socratino dos media

Os colunistas Helena Matos, Eduardo Cintra Torres e Luís Campos e Cunha foram despedidos do Público, revelou o i, de 20-10-2011. Com eles, foram também despedidos, Esther Mucznik, Vital Moreira e Sérgio Vilarigues. Um socialista em perda e um comunista para disfarçar o saneamento. Nos quatro que entram, metade são socratinos: Correia de Campos e Francisco Assis.

Na notícia do Público, a cativa directora do jornal indica que «na recomposição do painel de colunistas, observou-se a necessidade de respeitar o equilíbrio e pluralidade das várias sensibilidades e tendências de opinião na sociedade portuguesa». O que sugere que antes o equilíbrio e a pluralidade não estavam respeitados. A verdade parece ser outra: o socratismo pressionou o despedimento dos patriotas e isso foi consumado no período pós-eleitoral para que não se notasse tanto. Como se não fosse legítimo um jornal ter uma linha editorial clara em vez de uma atitude pseudo-neutra e alinhada, sempre, com o socratismo. O novo «equilíbrio» e a nova «pluralidade» do Público, após a perda de poder formal por José Sócrates (!), deve ser este das novas contratações: metade de socratinos. Só falta ir buscar o alter ego Pedro Silva Pereira ao Diário Económico, da Ongoing...

Perguntou o meu amigo José se Paulo Azevedo é jacobino. Não creio. Belmiro de Azevedo criou um jornal porque gosta de ter um no seu portfolio de negócios e entende lhe dar prestígio, à maneira dos grandes empresários norte-americanos. Em rigor, nunca vi o jornal instrumentalizado para fins particulares, ou de negócios, como se nota nos demais grupos, Balsemão, Joaquim Oliveira, Pais do Amaral, Vasconcelos e Paulo Fernandes, nos quais os media são uma arma para obter vantagens do poder político - ou até o próprio poder como o latente grupo Rui Pedro Soares (José Sócrates?). Mas Paulo, por melhor que creio ter sido a educação que os pais, conservadores, lhe deram, não é Belmiro. E como se viu na crise das escutas, enquanto o pai mofava da opinião de Sócrates, o filho Paulo insistia com José para que este fosse à festa da Sonae, em 18-9-2009, uma insistência que Sócrates divulgou oficialmente para embaraçar Belmiro.

O motivo do controlo socratino do Público e dos media dominantes (TVI, SIC, RTP, Expresso, Económico, DN/JN, TSF, etc.) é o mesmo do controlo socratino do poder político - ainda que formalmente mandem PSD/CDS -, é o mesmo da promiscuidade socratina do poder financeiro. Não é porque Paulo Azevedo seja socialista ou goste dos deles: é porque precisa e, por isso, o seu pai consente. O Presidente executivo da Sonae, Paulo Azevedo entronizou, em 1-11-2009, e mantém, a directora Reis porque sente que o poder político é, e vai continuar a ser, socratino e o seu grupo económico não está tão desafogado financeiramente que permita que o jornal seja percebido como independente face ao socratismo. Antes e depois do «plano governamental para controlo dos meios de comunicação social», da Face Oculta, existe o controlo através de editores de confiança e a dependência financeira dos grupos mediáticos privados.

Com os multiplicados «cento e nove contos de renda», no luxo de Paris, onde se refugiou por causa de eventuais notificações (no mesmo padrão ordenado a Horácio, Bernardo, Hugo e Armando) e responsabilidades, Sócrates continua a imperar sobre Portugal, como Príncipe da Grã-Ventura (a grã-ventura de agir perante a vergonhosa cobardia das instaladas elites portuguesas), aí atendendo regentes,  e de lá e daqui - na visita, como o seu epígono Jacinto Galião, mas agora semanalmente como permitem os aviões, à sua casa na capital -, defendendo colaboradores, pactando com o poder formal a manutenção do regime promíscuo e banco-dependente, e,  para alguém que alega que «não tem actividade política», apesar das evidências, mantendo um inusitado serviço de imprensa com a nora de Vítor Constâncio, Teresa Pina, sua ex-assessora, na função de «porta-voz».

Apesar do patriótico combate diário de erosão informativa nos blogues, que eu e outros orgulhosamente realizamos, o statu quo pantanoso só pode ser eficazmente drenado com a criação de um jornal digital independente.

Já agora, o Prof. Eduardo Cintra Torres lança esta tarde, de quinta-feira, 3-11-2011, na Livraria Barata, em Lisboa, o seu livro, e de José Pedro Zúquete, «A Vida como um Filme - Fama e celebridade no séc. XXI». Quem puder, apareça.