quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O plano do Governo para a RTP


Tancredi Falconeri («Se tutto deve rimanere com'è, è necessario che tutto cambi»)
(intepretado por Alain Delon  em Il gattopardo, de Luchino Visconti, 1963,
escrito a partir do livro homónimo de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, 1958)


plano do Governo para a RTP será o seguinte:
  1. Manutenção do Canal 2 da RTP e sua transformação em Canal... 1. Desta forma, o Governo mantém um canal de informação (generalista) próprio, suportando o custo da estrutura mais ou menos intacta. A desculpa é a projeção internacional do País e a proteção da cultura e das artes. Disfarçada que seja, a fatura sobre os portugueses será, mais ou menos, a mesma. A alternativa de fazer a concessão da RTP-2 não é do agrado dos compradores, pois representa uma enorme desvantagem comercial (de quota de mercado e de notoriedade) face à primeira opção.
  2. Concessão da frequência da RTP-1 a uma joint-venture da Cofina, Newshold e... PT. O negócio é feito com a Newshold e Paulo Fernandes, da Cofina - e ainda com o apadrinhamento de Dias Loureiro, com a participação eventual da Score Media? Note-se que a Cofina já é participada pelos luandenses da Newshold (tal como a Impresa e brevemente a Controlinveste, para além de deterem o semanário Sol). E, através do solícito Zeinal Bava, o Governo Passos-Relvas manteria uma espécie de golden share no novo canal, evitando qualquer deriva autonomista, ao mesmo tempo que lhe  assegura estabilidade financeira (novamente com o BES?).

Nestes negócios, a Pátria não conta.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

A separação do povo face ao Governo

Passos Coelho disse em 23-7-2012, no Parlamento, num jantar com o grupo parlamentar do PSD: «encontramos uma diferença muito grande entre opinião pública e a opinião publicada».

O primeiro-ministro - ou o seu lippmannian (!?...) speech writer - distinguiu a opinião pública, que estaria a favor do Governo, da opinião publicada, que estaria contra. Para mudar a situação, foi desencadeada uma ofensiva  sobre a opinião publicada. Para mudar a opinião publicada? Não, para mudar a opinião pública. A tal que estaria a favor...

Em vez do pau-e-da-cenoura de Sócrates, a sobremesa de Passos. Desta forma se explica a mudança coincidente de alguma opinião publicada. O motivo próximo da ofensiva governamental seria externo? A conjuntura internacional, a revolta sindical, o desconsolo dos empresários, o choque dos funcionários públicos? Antes fosse. Trata-se de um motivo interno: aquilo que o primeiro-ministro definiu, em 4-7-2012, ainda na mesma linha de Walter Lippmann como «não assunto»: a licenciatura especial de Miguel Relvas. Com uma barragem de proteção a um caso indefensável, o Governo fez de um «não assunto», o assunto principal. E, ao dar-lhe essa importância, caíu no próprio buraco que queria evitar. Mesmo que a sua tática seja a diversão do «não assunto», através da promoção de um estilo de miterrandismo melífluo do líder normalizado.

Numa equívoca linha lippmanniana - ou neomaquiavélica - que considera o povo ignorante, estúpido e volátil,  julga-se a memória das pessoas como fraca e a sua opinião como irracional e volúvel, consistindo essencialmente em «não atitudes» (daí o «não assunto»...) ou opiniões manipuladas. Por conseguinte, entende-se que o povo esquecerá o caso Relvas, que será enterrado pelos assuntos supervenientes do quotidiano, pela peneira dos média dependentes e pela manipulação dos opinadores aliciados. A recomendação é que governe o Governo, através da «classe governativa», atualizada numa classe jótica, pós-académica, preparada para o exercício do poder nos bares e discos, uma elite pragmática de sorrisos falsos e esgrima florentina, sem capacidade sofrível de escrita, nem conhecimento de economia ou de direito ou de história, nem outra moral que não seja o poder. O povo, crêem, esquecerá. Todavia, Walter Lippmann, Gabriel Almond e Philip Converse, escreveram num mundo pré-internético, com média tradicionais mais ou menos sujeitos ao controlo da informação pelo poder.

Não é isso que nos ensina a história recente portuguesa. A perda de legitimidade moral de um Governo é causa de queda a médio prazo: como tenho dito, sem essa legitimidade moral de serviço não há paraquedas que segure o executivo perante os fracassos normais da governação. E agora não estamos perante circunstâncias normais, nem fracassos normais... Dir-se-á que a classe governativa nada mais espera do que um dia de poder atrás de outro, com os ganhos correspondentes do exercício, esperando o alternante oblívio do inventário, sabendo-se vários níveis acima de qualquer Peter. Mas a Pátria não tolera esse abuso e eu creio que o direito internacional tende para também não o tolerar.

Quer o Governo recuperar da vergonha? Reconheça os erros, arrependa-se e emende-se. Comece pelo «não assunto» e resolva-o. Em vez de o ignorar, o que só fará pior ao próprio e ao executivo - para lá da comprometida imagem internacional, como repetidamente se vê nas caricaturas do «Jornal de Angola». Depois, rompa a dependência do executivo face à Maçonaria, começando por indicar um não-maçon (ou não-consorte de maçon) ou um não-colaborador do socratismo para procurador-geral da República, renegoceie, como os espanhóis, mesmo (em vez do barquinho da carreira ou do adiamento dos descontos para as calendas gregas) as parcerias público-privadas, exponha o processo de privatização da EDP e REN,  explique o caso da venda do Pavilhão Atlântico, exuma os esqueletos podres do socratismo e entregue-os ao poder judicial, cancele a promiscuidade com as grandes empresas oligopolistas, seja equitativo nos sacrifícios e puxe a população de novo para o trabalho. Verá que o povo reconhece o serviço. E, então, a opinião publicada aproximar-se-á da opinião pública. De outro modo,  com a sua tática habitual, o único efeito que consegue é o desprestígio do coro dos opinadores seduzidos pelo apito das sereias do poder.


* Imagem picada daqui.

sábado, 11 de agosto de 2012

Lavagem estatal de dinheiro

Do Expresso, de 11-8-2012, citado por A Bola:
«O Estado conseguiu arrecadar mais de 258,4 milhões de euros com impostos de fortunas portuguesas escondidas fora do País, revela o semanário Expresso.
De acordo com o jornal, as Finanças conseguiram descobrir e taxar mais de 3,4 mil milhões de euros de capitais que estavam no estrangeiro, de forma ilegal.
Estas fortunas portuguesas só agora foram declaradas ao Estado, depois de ter sido dada a garantia de que não iria ter lugar responsabilidade criminal, tendo ainda os seus responsáveis beneficiado de uma taxa de imposto de 7,5 por cento.»
(Realce meu).

Como disse, o diretor do Negócios, Pedro Santos Guerreiro, em 6-8-2012: «Dinheiro que havia saído ilegalmente, passou por cá, foi amnistiado, pagou imposto e voltou, quase todo, a sair». Possivelmente, o objetivo de quem fez regressar fugazmente o dinheiro para ser benzido pelo Estado, não era assegurar a sua impunidade em Portugal, mas a sua impunidade no estrangeiro. Por meros 7,5%, o Estado português proporciona um certificado internacional de licitude a dinheiro ilegal... Em rigor, qual é a diferença entre esta manobra do Estado português e o branqueamento de capitais?...


* Imagem editada daqui e dali.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Conclusões do silêncio - parte II



O negócio da compra do Pavilhão Atlântico, em 26-7-2012, somado à crítica do Presidente da República, em 25 de junho de 2009, ao negócio socratino de compra da PT/TVI, um dia depois da reunião na Procuradoria-Geral da República entre o Dr. Fernando Pinto Monteiro e o procurador de Aveiro Dr. João Marques Vidal (acompanhado pelo procurador distrital de Coimbra) sobre inquérito ao primeiro-ministro José Sócrates sobre alegado crime de atentado ao Estado de direito devido ao alegado «plano governamental para o controlo dos meios de comunicação social», implica não apenas uma releitura, sob novo ângulo, do negócio PT/TVI e da relação do Presidente com o procurador-geral, mas também outras cinco conclusões:
  1. O eventual sacrifício (não acredito em autosacrifício) de Manuela Ferreira Leite - e do PSD... - que não terá sido informada em 24 de junho de 2009 (a três meses das eleições legislativas) que pendia sobre o primeiro-ministro Sócrates uma certidão, extraída após despacho do procurador João Marques Vidal,  em 23-6-2009, do processo Face Oculta, em Aveiro, para inquérito de alegado «crime de atentado ao Estado de direito» por manobrar, segundo os magistrados de Aveiro, para se assenhorear-se dos média que não controlava (além da TVI, o Correio da Manhã e o Público). Noto que  eleições livres e justas, que ocorreriam daí a três meses, precisam de imprensa livre e a tentativa de um Governo de controlar toda a comunicação social independente constitui um golpe antidemocrático. Sem o silêncio de Cavaco Silva no verão de 2009, Sócrates cairia e a Pátria não teria sofrido a loucura do orçamento expansionista de 2010, nem as últimas parcerias público-privadas ruinosas. Esse gambito cavaquista de Manuela Ferreira Leite e do PSD protegeu a conduta do Presidente no caso PT/TVI e facilitou a sua reeleição.
    Relembro. Para preparação socratina da opinião pública para o negócio iminente, justificado numa pretensa luta a três com a Ongoing e a Controlinveste de Joaquim Oliveira, uma «fonte do conselho de administração da PT» (mais provável ser o «anjinho» Bava do que o «encornado» Granadeiro...) terá admitido ao i, em 23-6-2012, sobre uma eventual venda pela Prisa de 30% do grupo Media Capital (da TVI) à PT: «não me desagradaria uma opção dessas». A PT comunica nesse dia, à noite, à CMVM que existem negociações entre a PT e a Prisa para a compra de posição desta no Grupo Media Capital (detentor da TVI). Manuela Ferreira Leite insurge-se, em 24-6-2012, contra o negócio, pelo qual responsabiliza o primeiro-ministro, mas nada parece ter sabido até 14-11-2009, quando, na sequência da investigação do Sol, de 13-11-2012, sobre a ramificação de Sócrates no processo Face Oculta, o Correio da Manhã noticiou a existência de uma certidão, extraída em Aveiro para inquérito à implicação de José Sócrates no alegado crime de atentado contra o Estado de direito.
    E recordo que o plano acabou por se concretizar na parte principal: «limpar o gajo» (José Eduardo Moniz) e calar Manuela Moura Guedes: José Eduardo Moniz foi corrido da TVI, em 5 de agosto de 2009 e o Jornal Nacional de Sexta de Manuela Moura Guedes foi suspenso em 3 de setembro de 2009, antes das eleições legislativas de 27-9-2009.
  2. Deve ser reinterpretada a raiva do socratismo contra o Presidente, nessa altura, e o escárnio atual que pode ser visto na Câmara Corporativa (o blogue oficioso do socratismo, nesta segunda fase, já sem a informação das adormecidas operações negras, os dossiês rápidos, os programas especiais de rastreamento, e a dedicação dos  assessores governativos que já não colaboram porque porque não pinga...) pode ser reinterpretada, 
    1. A conduta complacente do Presidente após o contra-ataque socratino da «Operação Encomenda» (DN, 18-9-2009 - um caso menor repescado de um mail interno do Público, datado de 23-4-2008, quinze meses antes, que disfarçava a vigilância e operações negras das estruturas de informação do socratismo sobre a Presidência e sobre opositores que hão-de ser expostos em detalhe, como em Espanha, em 2009 («la banda de Interligare»)... - tem de ser reinterpretada num ângulo distinto do medo habitual. Repristino, no final deste texto, um poste meu, de 19-9-2009, sobre essa operação.
  3. Deve ser reinterpretada a «cooperação estratégica» de Cavaco Silva com os Governos de José Sócrates, reavaliados os mandatos presidenciais de Cavaco Silva e reconhecida a sua corresponsabilidade na situação do País.
  4. Finalmente, deve ser reinterpretada a natureza do cavaquismo executivo - 1985-1995.

Lamento. Queria chegar a outras conclusões. E dei-me com mais uma desilusão. Todavia, nada muda na luta patriótica: nos seus princípios, nos seus objetivos e nos seus vetores.




«Do Portugal Profundo, 19-9-2009
A Operação Encomenda

A Operação Encomenda [DN, 18-9-2009] não foi montada por amadores, nem foi montada por jornalistas. Os jornalistas do DN que, como o Carlos Enes diz, denunciam as fontes dos outros e não indicam as suas, são apenas verbos de encher de uma operação que os transcende e a cujo autor-mor cedem o aparo que lhes mantém o salário (Balsemão, à última hora, roeu a corda do Expresso, que tinha contactado o Público sobre a história, e não alinhou na Operação Encomenda). Foi uma operação montada por profissionais das informações, com mandado e supervisão de topo.
Importa menos saber a forma: se a violação de correspondência foi feita por intrusão electrónica no servidor ou no provedor nacional de acesso à internet ou por compra (pagamento à peça, além de contrato futuro).
Foi uma operação organizada e executada por quem dispunha de preparação, meios, dinheiro, protecção e salvo-condutos judiciais. Foi uma operação meticulosa, arranjada com muita antecedência, discutida com vários decisores, avaliada ex-ante nos seus efeitos, com estratégia de saída para a eventualidade de fornecer um culpado para o meio de intrusão em conversas particulares.
Foi uma operação realizada para criar um escândalo artificial com o objectivo perceptível de suscitar, pelo coro dos indignados, a impugnação ou condicionamento do Presidente da República, ao mesmo tempo que permite maior vitimização e congregação de forças dispersas. Na prática, se sucedesse, produziria a remoção de Cavaco Silva, um efectivo golpe de Estado.
Finalmente, foi uma operação ordenada e dirigida pela única entidade que tem, no Portugal actual, o poder de atacar frontalmente o Presidente da República e o atrevimento de o enxovalhar.»

Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias dos media, que comento, não são arguidos ou suspeitos do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

domingo, 5 de agosto de 2012

Conclusões do silêncio

«Cada árvore conhece-se pelo seu fruto».

                                                Lucas 6:44

Após o choque do negócio da compra do Pavilhão Atlântico, em 26-7-2012, a conclusão dura que extraio é de que tem de ser lida de maneira diferente a declaração pública do Presidente da República, em 25 de junho de 2009, requerendo transparência e ética no negócio socratino de compra da PT/TVI, feita um dia depois da reunião matinal na Procuradoria-Geral da República entre o Dr. Fernando Pinto Monteiro e o procurador de Aveiro Dr. João Marques Vidal (acompanhado pelo procurador distrital de Coimbra) relativa à certidão para investigação de alegado crime de atentado ao Estado de direito devido ao alegado «plano governamental para o controlo dos meios de comunicação social». E também tem de ser interpretada de maneira diferente a manutenção, desde 21-6-2011, no cargo de procurador-geral da República do Dr. Fernando Pinto Monteiro (ao abrigo da alínea m do art. 133 da Constituição da República Portuguesa).

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

O preço do Pavilhão Atlântico

O negócio de venda do Pavilhão Atlântico do Parque das Nações, em Lisboa, tornado público em 26-7-2012, suscitou perplexidade pelos montantes envolvidos e pelos compradores. A decisão do Conselho de Ministros, de autorizar a Parque Expo a vender o pavilhão, foi comunicada pela ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, Assunção Cristas. O Público, de 26-7-2012, acrescenta:
«Realçando ter sido um “processo aberto” e que não estava obrigado a ser decidido em Conselho de Ministros, a ministra contou que foram “contactadas 27 entidades com perfil comercial ou financeiro que poderia ser interessante para este equipamento”. A Parque Expo registou várias consultas e no final recebeu três propostas concretas de aquisição do pavilhão, que passaram à fase de negociação. Essa fase de negociação foi conduzida pela Parque Expo, com o apoio de assessores financeiros e jurídicos».

O teor do comunicado do Conselho de Ministros, de 26-7-2012, sobre o assunto é o seguinte:
«10. O Conselho de Ministros autorizou a Parque EXPO 98, S.A., a vender as ações representativas da totalidade do capital social da Atlântico - Pavilhão Multiusos de Lisboa, S.A., em conjunto e em simultâneo com o "Pavilhão Atlântico", ao Agrupamento Arena Atlântico.
A escolha do candidato à compra do Pavilhão Atlântico foi precedida de uma fase de negociações que teve como objetivo tornar as propostas apresentadas mais competitivas e, consequentemente, potenciar os fins delineados para a transação.
O candidato vencedor destacou-se pelas particulares condições apresentadas, em especial no que respeita ao maior preço e demais condições financeiras que permitem a maximização do encaixe financeiro. Destacou-se ainda por apresentar um sólido compromisso de realizar um plano de atividades coerente, de preservar os postos de trabalho, de assegurar uma estrutura acionista e de assumir um plano de estabilidade e garantia que acautelam a estabilidade da gestão do "Pavilhão Atlântico" e da Atlântico - Pavilhão Multiusos de Lisboa, S.A., e a preservação da vocação do "Pavilhão Atlântico".»

A compra
Em primeiro lugar, perplexidade pelos montantes envolvidos porque o valor de venda (21,2 milhões de euros) foi inferior ao custo da obra (50 milhões de euros). O orçamento anual de manutenção do imóvel seria de 600 mil euros. A usura do pavilhão e a depressão imobiliária não parecem justificar a depreciação do  imóvel. O valor de avaliação, segundo o Público, de 26-7-2012, situou-se entre os 17,4 e os 21,5 milhões de euros - o Público não indicou quem fez a avaliação. Diz ainda o Público que
«o consórcio vencedor integra, na vertente financeira, um fundo de capital de risco do Banco Espírito Santo, o BESPME. Além de financiar a operação, o BES também esteve ao lado de Luís Montez na qualidade de assessor financeiro do empresário, enquanto o Banco BIG, de Carlos Rodrigues, foi o consultor da equipa de quadros do pavilhão, que se aliou ao consórcio vencedor, e da Ritmo e Blues.»
Segundo fui informado, o Fundo BES-PME é financiado e apoiado pelo Compete/QREN. O Compete é o Programa Temático Fatores de Competividade, um programa operacional do Estado inserido no Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) com que a União Europeia, através do Feder (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional), apoia o desenvolvimento português. A nova Comissão Directiva do programa público Compete, nomeada em 14-2-2012, sete meses depois da tomada de posse do Governo PSD-CDS, é constituída por Franquelim  Fernando Garcia Alves (o «Gestor do Programa»), que preside, e por duas vogais executivas, Maria Isabel Sanches Matalonga y Planas e Maria da Piedade Brito Monteiro Valente. Franquelim (ou Franklin ou Frankelim) Alves, alegadamente ex-ativista do MRPP convertido ao capitalismo, esteve na SLN de José Oliveira e Costa, como administrador para a área não  financeira do grupo (que detinha o BPN), entre finais de 2007 e outubro de 2008 - note-se que Oliveira e Costa abandonou a administração do BPN em fevereiro de 2008. Maria Isabel Sanches Matalonga y Planas e Maria da Piedade Brito Monteiro Valente transitam da anterior Comissão Diretiva socialista-socratina do Compete - Piedade Valente tem ainda a notoriedade  de, alegadamente, ter sido colega de curso do Prof. Augusto Mateus, o czar socialista da consultoria de projetos públicos de investimento e de avaliação de programas comunitários em Portugal. Como é certo, e sabido, na distribuição dos fundos europeus, como noutras áreas centrais de poder do Governo Passos Coelho, passou-se do exclusivismo socialista do socratismo (com poucas e identificados social-democratas como controleiros de revolta anti- corrupção socialista, agentes duplos e homens de palha) para uma promiscuidade bloco-centralista, de partilha de poder e negócios - com alguns feudos ainda discretos do CDS.

A Sociedade Gestora do Fundo BES-PME, a ES Capital, sociedade de capital de risco do Banco Espírito Santo, investe dinheiro em empresas dinheiro com o apoio de fundos comunitários. Faz esses investimentos diretamente por si, ES Capital (ou pela ES Ventures), ou refinanciando-se no Fundo de Sindicação de Capital de Risco, que é gerido pelo Ministério da Economia, através da PME Investimentos e do IAPMEI. Este fundo público (Fundo de Sindicação de Capital de Risco), que sindica as operações de capital de risco neste QREN, já se financiou em mais de 200 milhões de euros, com os quais, sindicou operações em montantes equivalentes. Na prática a ES Capital, que naturalmente, está debaixo da supervisão da CMVM,  recebe pelo menos aquilo que investiu, ou emprestou, do  Estado, via capital de risco do QREN. Além disso, estas sociedades de capital de risco do Grupo Espírito Santo ainda cobram spreads e comissões pelas operações de gestão e  avaliação.

Sabendo-se que o BES, como os demais bancos portugueses, está bastante descapitalizado, e que a operação de compra do Pavilhão Atlântico é uma operação de risco, consegue-se que, na prática, seja o Estado e os fundos públicos a garantirem o risco, que formalmente Luiz Montez e BES, além dos seus sócios com o Banco BIG, parecem suportar. Isto é, o consórcio vencedor compra ao Estado (Parque Expo) com dinheiro emprestado (ou investido, se não se tratar de um simples empréstimo sem participação no negócio) pelo próprio Estado. Uma espécie de pescadinha de rabo político na boca financeira.


Os compradores
Em segundo lugar, perplexidade pelos compradores, porque quem adquiriu o edifício e a empresa foi o «Agrupamento Arena Atlântico», de Luís Montez (da empresa Música no Coração, mas que entrou no negócio a título individual), Ritmos e Blues (de Álvaro Ramos e Nuno Braacamp) e da equipa que geria o pavilhão (Jaime Fernandes e Jorge Silva) - ler notícia na Visão, de 27-7-2012. Segundo a Lux, de 26-7-2012, foram preteridos no concurso «o consórcio de Álvaro Covões (Everything Is New), Cunha Vaz e CIP e a multinacional AEG». Everything is old: Álvaro Covões, António da Cunha Vaz e António Saraiva (presidente da CIP) são alegadamente um triângulo da poderosa Loja Mozart, da GLLP/GLRP (maçonaria regular)...

Luís Montez é genro do Presidente da República, casado com a sua filha Patrícia Maria, com quem tem quatro filhos, alegadamente no regime de comunhão de adquiridos (O Crime, de 19-7-2012, citando relatório da empresa Informa D e B).

Luís Montez foi identificado como alegada fonte de notícias delicadas d' «O Independente», de Paulo Portas, sobre o inner circle cavaquista, nos anos de guerra de atrito CDS-PS contra o PSD.

Em 2001, José Oliveira e Costa, desastroso ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de Cavaco Silva, e que este tinha corrido do Governo por casos irremediáveis como o perdão fiscal à Cerâmica Campos e a outros empresas do distrito de Aveiro, de cuja distrital era presidente, terá proposto a Aníbal Cavaco Silva que este comprasse 105.378 ações da holding SLN, sociedade-mãe do BPN, que não se transacionava em bolsa, ao preço favorável de 1 euro cada (a filha Patrícia também terá comprado ao mesmo preço). De acordo com o Público, de 8-1-2011, o preço fixado, meses antes, em 24-11-2000, para a venda a investidores era de 2,2 euros por ação e para quem já fosse acionista, de 1,8 euros - nessa altura, «Oliveira Costa reservou para si e para algumas sociedades do grupo, entre as quais a SLN Valor» um lote de acções a um euro.

Segundo a RTP, Oliveira e Costa terá dito em tribunal, em 13-4-2011 que
«vendeu estes dois lotes de ações [a Cavaco Silva e à sua filha Patrícia] a 1 euro, quando menos de um mês antes as tinha comprado a uma offshore a 2 euros e 10 cada. As restantes ações adquiridas à offshore foram vendidas no mês seguinte a 2 euros e 11, com um lucro de 1 cêntimo por ação.»
offshore foi identificada pela revista Sábado, de 13-4-2011, como a sociedade Merfield.

Cavaco Silva não ocupava funções políticas desde 1995 e não parece que Oliveira e Costa lhe devesse favores, portanto, foi um negócio que, em minha opinião, beneficiou mais a SLN/BPN e Oliveira e Costa que, por baixo valor  (cerca de 100 mil euros), podia gabar-se agora a novos propects de que a duvidosa SLN era tão sólida e tão séria que até tinha Cavaco como acionista. Nem é crível que Oliveira e Costa ousasse pensar que o professor Cavaco Silva, um homem conceituado pela sua honestidade e que o tinha corrido do Governo por referências de corrupção - caso dos perdões fiscais, por exemplo -, o viesse a beneficiar no futuro, se, e quando, fosse um dia eleito Presidente ou assumisse qualquer outro cargo público. Todavia, também a sua filha Patrícia Cavaco Silva, casada com Luís Montez, terá comprado 149.640 acções da SLN na mesma altura, por 1 euro cada uma. Por necessidade, informação ou intuição, o professor Cavaco Silva e a filha venderam as suas ações do BPN em novembro 2003 «e pelo mesmo valor (2,4€)», ao preço de mercado à SLN Valor (sociedade do grupo), segundo indica o Expresso, de 30-5-2009, citado pelo DN. A crer nos números adiantados pelo Expresso, de 30-5-2009, que o CM, desse dia, cita, Cavaco Silva terá obtido uma mais-valia de 147.529 euros (menos comissões e impostos) e a sua filha, que tinha comprado um lote maior, conseguiu 209.496 euros (a que se devem deduzir as comissões e impostos). Na campanha eleitoral de 2011, Cavaco Silva foi confrontado com notícias sobre a permuta da sua casa de Montechoro com uma vivenda em construção na praia da Coelha, em Albufeira, de uma sociedade de Fernando Fantasia, promotor ligado a Oliveira e Costa e BPN/SLN, mas nada de ilegal ou irregular se apurou - ver i, de 19-1-2011.

É discutível que a filha de Cavaco representasse uma mais-valia de relações públicas para a SLN/BPN acenar aos potenciais investidores tê-la como acionista. Não pode avaliar-se as finanças do casal, pois, embora existam referências a um relatório do BPN (datado de 2007?) sobre alegadas «dívidas a bancos de cinco milhões de euros» das empresas de Luís Montez, não sabemos, nem podemos saber, se teriam liquidez (ou crédito) para Patrícia comprar ainda mais ações da SLN em 2001 do que seu pai (a filha terá comprado 149.640 ações, enquanto o pai apenas terá adquirido 105.378 ações) - presumo que sim, porque Patrícia fê-lo.

Segundo cita o DN, de 13-1-2011, a revista Sábado desse dia, refere que «dois meses depois da nacionalização do banco, Luís Montez foi chamado ao BPN, liderado pelo socialista Francisco Bandeira para pagar 260 mil euros de uma conta caucionada e de uma livrança» - o visado respondeu que "foi proposta à Música no Coração a transferência para um outro produto de modo a proceder à amortização do montante utilizado". A conta corrente caucionada, no valor de 200 mil euros, teria alegadamente sido autorizada pelo BPN em 22-11-2007, ainda na administração Oliveira e Costa; e, em 24 de maio de 2008, já na gestão de Adbul Karim Vakil, Luíz Montez terá alegadamente obtido um crédito adicional de 100 mil euros. Porém, apesar de alegadamente Luís Montez, beneficiar do "Código Vigilância VE4", o mais baixo dos quatro patamares da escala de risco, constaria alegadamente de um «relatório» do BPN que existiriam dívidas do dono da Música no Coração a bancos no valor de cinco milhões de euros. Não foi possível confirmar esses valores nessas datas, nem tão pouco se sabe como corre a amortização dessa dívida.

No caso do «plano governamental para controlo dos meios de comunicação social», com a tomada socratina de todos os média de referência, no verão quente de 2009, a poucos meses das eleições legislativas, foi também referido o envolvimento de Luís Montez, conforme se pode concluir da conversa telefónica, em 24 de junho de 2009 (publicadas no Sol, de 5-2-2010) entre Rui Pedro Soares (RPS) e Paulo Penedos (PP), dois pivots da tentativa de compra da TVI (e Correio da Manhã... e Público...) pelo regime socratino:
«RPS: “As rádios vão ser compradas pela Ongoing e pelo genro do Cavaco” [Luís Montez]
PP: “Isso é bom. [És tu] o autor desta patifaria?”
RPS: “É o preço da paz e esse cala-se logo, fica a cuidar dos netos”.»
(Realce meu)

Em despacho datado de 18-11-2009 do procurador-geral da República Fernando Pinto Monteiro sobre o processo Face Oculta, publicado integralmente pelo DN, de 19-2-2010 (sem linque) e ainda no CM, de 19-2-2010, essa conversa telefónica foi citada, mas a referência às rádios foi desvalorizada, como «menção pontual e de todo inconsistente» (sic!). Ficou por saber se a inconsistência era a cedência das rádios do grupo Media Capital (da TVI) ao fundador da XFM...

Lembro que no despacho, de 23-6-2009, para inquérito sobre crime de atentado contra o Estado de direito (que foi polemicamente arquivado, e cortado à tesoura, numa «extensão procedimental» do processo Face Oculta), noticiado no Sol, de 5-2-2010, o patriota coordenador do DIAP de Aveiro, o procurador Dr. João Marques Vidal, concluíu pela existência de
«fortes indícios da existência de um plano em que está directamente envolvido o Governo para interferência no sector da comunicação social visando o afastamento de jornalistas incómodos e o controlo dos meios de comunicação social (...)
resultam ainda fortes indícios de que as pessoas envolvidas no plano tentaram condicionar a actuação do Presidente da Republica, procurando evitar que o mesmo fizesse uma apreciação crítica do negócio»

Porém, qualquer que tenha sido, ou não, o alegado envolvimento de Luís Montez nessa manobra, com os operacionais socratinos e o apoio da Ongoing de Nuno Vasconcellos (e do BES...), para a tomada da comunicação social independente face ao socratismo, a verdade é que o Presidente da República Cavaco Silva atacou decisivamente numa oportuna declaração, em Guimarães, em 25-6-2012, sobre necessidade de transparência, o negócio de compra pela PT da posição da Prisa na TVI, um negócio realizado através do uomo di paglia socratino Zeinal Bava, e dos operacionais Rui Pedro Soares, Paulo Penedos, etc. Essa  declaração estoirou com o negócio. Note-se que a conspiração socratina também havia sido exposta em 24-7-2009, após reunião na procuradoria-geral da República, em Lisboa e de outras reuniões do procurador-geral com o DIAP e Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da certidão extraída do processo Face Oculta, em Aveiro, por fortes indícios do crime de atentado contra o Estado de Direito, data a partir da qual o sentido das conversas dos escutados operacionais se altera, passando Sócrates a vítima e a nada saber.

O jornal O Crime, de 19-7-2012, traz uma reportagem de Carlos Tomás, sobre as dívidas de Luís Montez e das suas empresas de espetáculos, que, pelo seu interesse político relativo a esta notícia, transcrevo no final deste poste. O jornal indica que à data da reportagem, o empresário tinha «pelo menos 13 processos de execução pendentes», mas um porta-voz da Música no Coração defende que «os processos em causa são todos antigos» e adianta-se que o empresário tem procurado estabelecer acordos com os credores. No entanto, a situação financeira descrita contrasta com uma notícia no CM, de 28-11-2011, que refere que Luís Montez, «dono da Música no Coração, responsável pelo Festival Sudoeste, prepara-se para comprar a Vasco Lourenço a Herdade do Sardão, em Odemira» e acrescenta que o promotor de espetáculos já «possui três propriedades na zona, entre elas a Herdade da Casa Branca, onde decorre o Festival do Sudoeste, talvez o mais famoso dos festivais de verão, e duas outras propriedades que dão apoio ao festival». Sobra, portanto, a questão de compreender como uma entidade (Luís Montez/Música no Coração) que, segundo o relatório da empresa Informa D e B, que «O Crime» cita (e ao qual tive acesso, bem como outro relatório, também legítimo), apresenta, alegadamente, «risco comercial elevado» e «crédito não recomendado» -
«os últimos elementos financeiros disponíveis apresentam um capital próprio negativo. Esta entidade apresenta um rácio de solvabilidade negativo»
- obteve do Governo uma avaliação de que o consórcio que integra, pode «assumir um plano de estabilidade e garantia que acautelam a estabilidade da gestão», o que lhe permitiu, a par do preço, ser preferido na aquisição de um equipamento público, com financiamento indireto do Estado (através do BES-PME, um fundo financiado pelo programa Compete/QREN). Luís Montez terá integrado o Agrupamento Arena Atlântico, que comprou o pavilhão, a título individual, mas não é indistinto da situação financeira das suas empresas, nomeadamente a Música no Coração. Não sei se, entretanto, o empresário e as suas empresas liquidaram todas as suas dívidas ou estão a cumprir integralmente o plano de pagamento que possam ter estabelecido com os credores. Não quero crer que tenham qualquer dívida perante a administração fiscal ou pública, pois de outro seria difícil de perceber a preferência categórica do Governo/Parque Expo.

Luís Montez deu uma entrevista ao Expresso (Ana Soromenho), em 30-6-2010, onde declarou «Eu não faço política e o meu sogro não faz concertos». Mas o empresário, amigo do spinlord Luís Paixão Martins da LPM, confessou: «em Lisboa, votei Costa». É: Montez tem outro costado.

O Crime, de 19-7-2012, página 9, em reportagem não assinada, com título «Relações com a PT», que destaca o apoio da PT e da TMN a empresas e  eventos  de Luís Montez, nomeadamente o Festival do Sudoeste e a rádio SWtmn, dá ainda espaço a uma pergunta e uma insinuação. A pergunta: «com tantas rádios existentes no País, porque razão foi escolhida para ter o "naming" da TMN uma pertencente a Luís Montez e que nem sequer tem expressão nacional». E a insinuação de um «empresário do setor da publicidade»: «a verdade é que depois do genro ter sido apoiado pela PT as críticas presidenciais [à PT] desapareceram». A insinuação só é possível porque o relacionamento próximo entre a PT e Luís Montez existe: a forma de eliminar essa crítica não é ignorar o relacionamento: é evitar esse relação e distanciar-se dela. Lamento.

Não acredito que o Presidente da República Cavaco Silva se deixe condicionar na sua relação com o Governo Passos Coelho por qualquer negócio atual ou antigo do genro. E mal andaria um Governo  que o tentasse, diretamente neste caso ou indiretamente através das empresas onde prepondera, como a PT - ou o Banco Espírito Santo pelo financiamento. Mas um homem não é uma família, muito menos a afinidade. É muito difícil controlá-la, como se viu em Espanha no caso extremo de Iñaki Urdangarin, genro do rei D. Juan Carlos. Mas faço notar que, pelas circunstâncias que aduzi, este negócio polémico do Pavilhão Atlântico deveria ter sido evitado, para preservação da Presidência da República e da conduta do próprio Governo.





Dívidas no coração, O Crime, 19-7-2012
Carlos Tomás, As dívidas do genro de Cavaco, O Crime, 19-7-2012 (cont.), p. 8

Carlos Tomás, As dívidas do genro de Cavaco, O Crime, 19-7-2012 (cont.), p. 9, e
As relações com a PT, O Crime, 19-7-2012, p. 9


Pós-Texto (22:02 de 2-8-2012 e 9:14 de 3-8-2012): As contas de Montez
O Expresso, de 28-7-2012, noticia que «Governo viu à lupa contas de Montez», no Conselho de Ministros, tendo em conta o facto de Luís Montez ser genro do Presidente da República e, segundo o jornal:
«o detalhe da discussão prendeu-se, sobretudo, com a quantidade de e-mails e informação (sobretudo anónima) que circulou na internet sobre alegadas dívidas de Luís Montez e da sua principal empresa - a Música no Coração - a vários credores, nomeadamente ao Estado e à Segurança Social.
As diligências do Governo não detetaram qualquer irregularidade, garantindo, assim, a idoneidade da proposta vencedora, que integra ainda a Ritmos e Blues, um fundo do BES, e alguns quadros do Pavilhão Atlântico.
Ao que o Expresso apurou, o apoio do BES foi fundamental, já que a Arena Atlântico se destacou dos americanos da AEG e do outro consórcio encabeçado por António Cunha Vaz e Álvaro Covões na componente financeira, depois de estarem em situação de igualdade nos restantes critérios da privatização.»
Saliente-se em primeiro lugar, a admissão pela provável fonte do Governo de que «o apoio do BES foi fundamental». Aliás a notícia dá um «fundo do BES» como integrando o consórcio, algo que até agora não se tinha percebido. Carece de confirmação a referência de que o BES não apenas apoia financeiramente, como também tem quota no negócio, como a notícia parece significar.

A notícia, filtrada pelo Governo, menciona as alegadas dívidas - referindo nessas alegações, dívidas ao Estado e a Segurança Social -, e refere que «as diligências do Governo não detetaram qualquer irregularidade». O que não quer dizer que as dívidas não existam - ou  que se confirmem. Saberá o Governo e deveria dizê-lo de forma clara, com uma declaração do género: à data da entrega das propostas de compra, Luís Montez e as suas empresas não tinham dívidas ao fisco ou à Segurança Social. Acredito que, se for legalmente válida um eventual requisito de não existirem dívidas ao Estado para a adjudicação do negócio, essas dívidas não existissem, pois de outro modo violar-se-ia a lei.

Porém, a «informação» não era anónima: foi publicada no jornal «O Crime», de 19-7-2012, onde era citado o Relatório Completo da Informa D e B sobre a Música no Coração/Luís Montez, que tinha informação tão recente quanto abril de 2012. Informação factual de natureza semelhante pode encontrar-se num relatório da Coface Portugal Serviços, de 6 de junho de 2012, sobre a «Música no Coração - Sociedade Portuguesa de Entretenimento, Sociedade Unipessoal, Lda.» e outras participações financeiras de Luís Montez.

O facto de a notícia n'«O Crime» ter sido dada por Carlos Tomás, jornalista usado pela defesa socialista do setor referido no caso de abuso sexual de crianças da Casa Pia para negação dos abusos, pelos quais alguns foram condenados em primeira instância, descredibilização e aliciamento de vítimas para a tese da defesa, um jornalista que também espoletou, no mesmo jornal, em 31-5-2012, o caso da licenciatura de Miguel Relvas, não modifica a substância dos factos preocupantes. A natureza do mensageiro não modifica a validade intrínseca da mensagem.


Pós-Texto (11:09 de 3-8-2012): A imprudência do Governo
A resolução do Conselho de Ministros n.º 65/2012, publicada no Diário da República I Série, de 2 de agosto, justifica o processo de venda do Pavilhão Atlântico ao consórcio Arena Atlântico. Dois factos a registar: a participação do BES no consórcio e a imprudência do Governo.

São indicadas as entidades que participam no consórcio: «Fundo de Capital de Risco BES PME Capital Growth, por Jaime Octávio Pires Fernandes, Jorge António Gaspar Quintão, Jorge Manuel Vinha da Silva, José António Brito da Luz de Lima Faísca, Luís Manuel de Sá Montez e pela sociedade Ritmos e Blues — Produções, L.da». Portanto, através do fundo BES PME Capital Growth, o Grupo BES participa financeiramente no sócio no consórcio e não é apenas financiador da operação.

Sobre a imprudência do Governo importa notar que, de acordo com resolução do Conselho de Ministros n.º 21/2012, publicada no Diário da República, I Série, de 9 de março, a venda tinha como objetivos, para lá da «maximização do encaixe financeiro»: a «estabilidade da gestão do "Pavilhão Atlântico"» e «a preservação da vocação do "Pavilhão Atlântico"». Para tal, esta resolução determinava os «critérios de seleção final de aquisição do "Pavilhão Atlântico"», nos quais avultam:
  1. «o plano de atividades»
  2. «o plano de estrutura acionista»
  3. «o plano de estabilidade e garantia»
  4. «a idoneidade e a experiência dos proponentes para a concretização dos planos referidos»
Para lá da questão da idoneidade e experiência dos compradores, não parece que tenha sido prudente a adjudicação pelo Governo a um consórcio que integra Luís Montez, cuja empresa principal, a Música no Coração, tinha sido objeto de notícias, como a do jornal «O Crime», de 19-7-2012, com informação factual que se pode obter no citado Relatório Completo da Informa D e B sobre a Música no Coração/Luís Montez , com factos tão recentes quanto abril de 2012, ou noutro relatório da Coface Portugal Serviços, de 6 de junho de 2012. Mais, o Governo deve acautelar a venda de bens públicos, solicitando informação financeira e comercial a empresas do ramo ou produzindo essa informação nos serviços do ministério das Finanças.

A empresa Música no Coração, a empresa principal da constelação de Luís Montez (onde se inclui, por exemplo, uma participação de 33% na Rádio Clube de Gondomar - Radiofusão UNIP) era referida no relatório da Informa D e B, como tendo «risco elevado» e um «valor negativo do capital próprio», para além de vários processos de execução fiscal. No relatório da Coface, são mencionados vários processos de execução desde 2007, incluindo quatro em 2012, um dos quais datado de 19 de abril de 2012. Devo notar que não é conhecido o estado atual desses processos, eventuais acordos de pagamento ou mesmo liquidação completa dessas dívidas.

Estes relatórios não mencionam processos por dívidas da Música no Coração, e participadas por Luís Montez, ao fisco ou à Segurança Social ou a outros organismos do Estado, presumindo-se que não existam. Não se conhece, todavia, a situação fiscal e perante a segurança social da empresa em 2012 - não podendo, assim, falar-se em qualquer dívida nesse âmbito - mas que os serviços do ministério das Finanças devem conhecer. Dada a polémica devem tornar públicos, bastando responder o Governo à pergunta: tinha, ou não, a Música no Coração, e demais empresas de Luís Montez, dívidas ao fisco e à Segurança Social antes de março de 2012?

Sobra ainda a questão da estrutura acionista do consórcio Arena Atlântico, que comprou o pavilhão, a qual não vi ainda divulgada, como, dada a controversa venda, deveria ser, em nome da transparência que este Governo manifesta cuidar.

Na Resolução n.º 21/2012, de 9 de março, o Governo afirma a importância do Pavilhão Atlântico: «um espaço de referência em Portugal, cuja estética, versatilidade e flexibilidade constituem a moldura perfeita para o sucesso dos vários eventos que acolhe, tendo sido reconhecido e distinguido por diversas organizações nacionais e internacionais nas categorias de "Melhor Espaço Multiusos", "Melhor Espaço para Congressos" e tendo recebido o Prémio de Ouro IOC/IAKS na categoria "Equipamentos Desportivos para Eventos Internacionais"» e «reconhecido nacional e internacionalmente o seu papel ímpar no acolhimento de grandes eventos musicais, desportivos, empresariais e institucionais». Assim sendo, com base na informação judicial, financeira e comercial, histórica, dos proponentes de aquisição, que deve ter obtido, o Governo deveria reduzir ao mínimo a probabilidade do Pavilhão Atlântico ser sujeito a processos de execução com base em eventuais dívidas pendentes, e conhecidas, dos seus acionistas. Tendo em conta os factos mencionados, que tinham de ser obrigatoriamente do conhecimento do Governo (para lá do confronto de outros, como a situação das empresas de Luís Montez perante o fisco e a Segurança Social), não parece que tenha sido assegurada a indispensável prudência e isenção do Estado neste negócio.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias dos media, que comento, não são arguidos ou suspeitos do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Pluralismo q.b.

A dispensa de Manuela Moura Guedes (e de José Eduardo Moniz) pelo Correio da Manhã, na primeira semana de julho de 2012,  foi o preço que a Cofina pagou para a concessão, em 29-6-2012, pela PT de Zeinal Bava (com o óbvio beneplácito do Governo PSD-CDS) de um canal televisivo no MEO, o "Correio da Manhã TV"?

O pluralismo noticioso televisivo em Portugal é este: são criados os canais de tv por cabo que as duas empresas concessionárias - PT/Meo e Zon - e o poder político, do qual dependem, autorizam. O radiofónico é igual, sujeito ao poder político. A diferença para Espanha é que ali, as autonomias podem conceder canais de rádio e televisão e concederam (como a Comunidade de Madrid, de Esperanza Aguirre), o que permitiu o contra-ataque patriótico ao socialismo radical e desintegrador de Zapatero.

Em Portugal, há um pluralismo q.b., que basta ao poder político: uma liberdade de informação institucional (televisão, rádios e jornais) vigiada por subsídios e financiamentos. E quando o turno muda, já os padrinhos se organizaram à volta dos novos afilhados, mantendo-se a mesma dependência comissionista. E a Pátria? Qual Pátria?... O bolso!

Neste quadro de controlo dos media tradicionais, é muito difícil alforriar a sociedade portuguesa do sistema maçónico corrupto (nota), que inclui o complexo bancário-construtor. Resta-nos a net. E a vontade.


Nota
Nem toda a Maçonaria, nem toda a banca, nem todas as grandes construtoras. Aliás, para além do método de cultivo - que contestamos -, bastariam algumas romãs podres para apodrecer o cesto e exalar odor insuportável. Por isso, importaria extrair do cesto os frutos contaminados e curar as árvores, cortando os ramos degradados.
O facto é que os princípios maçónicos desumanos e antidemocráticos da proteção dos irmãos sobre os outros homens e mulheres, bem como o secretismo, são o núcleo do poder e de impunidade destas obediências e dos seus membros prevaricadores. Creio que os demais, devem sentir um enorme incómodo com o comportamento de certas lojas e membros: todavia, não os expulsam, não os denunciam, não limpam. As obediências maçónicas não prestam contas à sociedade como devem. Não têm a coragem, nem a transparência, de informar: «tínhamos problemas na loja x e y, mas já expulsámos os prevaricadores»  ou «resolvemos os conflitos de interesses entre a proeminência maçónica e a proeminência político-económica» ou, ainda melhor, «a nossa obediência, exige a cada membro que se apresente como maçon e a lista dos nossos membros está publicada no nosso sítio da internet». Assim, todos poderíamos comprovar que não haveria favoritismo nem decisões políticas tomadas, em triângulo, à revelia dos que não pertencem à organização.
E o resultado é este que sabemos: para lá dos princípios de secretismo e de proteção dos seus membros sobre todos os outros homens - que, sublinho, são desumanos e antidemocráticos -, vigora, na prática, na sociedade política e económica portuguesa, dominada pela Maçonaria, a corrupção.
Por aqui e por onde conseguimos, na vanguarda do setor patriótico em que combatemos desde 2003, em todas as grandes batalhas da cidadania portuguesa, cheios de feridas e memórias - as nossas medalhas e ativos -, mantemos o trabalho e a luta. Um dia, um dia claro, vencemos. Se Deus quiser.


* Imagem recortada daqui.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

O negócio do aeroporto de Lisboa... e de Alcochete?

Eu andava desconfiado com o negócio, anunciado em 21-7-2012, do Governo Passos Coelho à Câmara de António Costa, de entrega de 286 milhões de euros do Estado ao município, para resolver o contencioso sobre a propriedade dos terrenos do aeroporto da Portela, que permite à autarquia da capital reduzir em 43% a sua dívida aos bancos. E, agora, um amigo rastreou o motivo.

No Público, de 26-7-2012, a jornalista Ana Henriques escreveu que «em 2004 o Banco Espírito Santo estimou que a totalidade da área em causa - apenas 18% da qual estava registada em nome do Estado - valia 965 milhões». Segundo a jornalista, António Costa, «quando concorreu pela primeira vez à câmara, em 2007, o autarca pôs a hipótese de criar um segundo pulmão verde em Lisboa na Portela, nos terrenos que agora vai vender ao Estado» e «voltou a repeti-lo em 2010: a então anunciada transferência do aeroporto para Alchochete iria permitir fazer ali um grande parque, à semelhança do de Monsanto. Porém, a câmara de Costa preferiu o rosa das notas ao verde das árvores - e plantas há muitas. Alguém acredita que António Costa desperdice a oportunidade de solicitar novos créditos com o dinheiro que o Estado agora lhe entregou?...

Instado pelo comunista Ruben de Carvalho - «António Costa disse-me que havia o compromisso de que uma eventual privatização [da ANA - Aeroportos de Portugal] nunca envolveria os terrenos, e afinal não há referência nenhuma a isso no protocolo feito com o Governo» -, António Costa desculpou-se: «Não pedi garantias ao Governo nessa matéria. Nem o podia fazer» (sic). De acordo com o jornal, o vereador bloquista José Sá Fernandes, que votou favoravelmente o acordo, afirmou-se «esperançado, apesar da venda dos terrenos ao Estado, que o local ainda possa um dia vir a ser transformado em espaço verde» (sic) - e, se não for, o malvado é o Estado que  não quis fazer o segundo «pulmão verde» de que a Câmara abdicou... Se um homem pode sobreviver com um pulmão só, Lisboa também deve poder.

Em  22-7-2012, no Incursões, JSC já havia prevenido para a possibilidade que agora o vereador comunista levanta: o Governo paga 286 milhões de euros em troca da entrega à ANA dos terrenos e assim conseguirá um encaixe maior com a próxima privatização desta empresa pública e da  TAP.

Só que, para além do engordamento da ANA e do encaixe financeiro do Governo com a sua privatização este negócio pode esconder ainda mais outro: a retoma do projeto de construção, no médio-prazo, do aeroporto de Alcochete. Essa nova parceria público-privada envolveria o financiamento do Estado e da União Europeia e...a urbanização destes terrenos do aeroporto da Portela, que seria desmantelado.


* Imagem picada daqui.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sócrates no Freeport: inquérito-crime, prescrição e vitimização

«Ricordatevi del proverbio che dice: "La farina del diavolo va tutta in crusca".» 


O corajoso juiz Afonso Andrade, do Tribunal do Barreiro, que julgou o processo Freeport, na sentença lida em 20-7-2012, que absolveu Manuel Pedro e Charles Smith do crime de extorsão sobre a empresa do outlet, ordenou a extração de certidões dos depoimentos em tribunal de três testemunhas («o antigo administrador da Freeport, Alan Perkins, o advogado Augusto Ferreira do Amaral, e uma antiga funcionária de Manuel Pedro, Mónica Mendes»), baseado em «fortes indícios», a enviar para o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), para abertura (ou reabertura) de inquérito-crime ao ex-primeiro-ministro José Sócrates sobre alegados pagamentos feitos para o licenciamento do centro comercial Freeport, em Alcochete. Importa salientar que o Ministério Público, que tinha acusado e pediu a absolvição dos arguidos, não mandou, como podia, extrair certidão de cada um dos depoimentos prestados em audiência que o juiz agora considerou conterem «fortes indícios» de crime alegadamente praticado por José Sócrates.

Entretanto, começou o baile da prescrição. O argumento é este: isso já está prescrito ou em vias de prescrever. Se estiver prescrito, as certidões do juiz representariam uma violência moral e um ónus sancionatório inaceitável sobre uma reputação imaculada, do berço à cova, dos tempos de menino dos cromos ao moço cheio de energia no bar, do levantamento de voo político ao aterro na cidade, às comissões parlamentares e aos negócios governamentais. Se estiver quase a prescrever, deve aplicar-se a teoria anterior de que não adianta cumprir a lei e o rigor dos prazos, reforçada pelo argumento da necessidade de poupança de despesa ao erário público. No caso de José Sócrates, o argumento, condensado no i, de 23-7-2012, é o seguinte:
«José Sócrates só será acusado num novo processo relacionado com a aprovação do Freeport se num novo inquérito se reunirem suspeitas de que terá recebido pagamentos ilegais para que o outlet fosse aprovado depois de 2002, ou seja, há menos de dez anos. Juristas contactados pelo i explicam que só nessa hipótese – que consideram “remota” e “fantasista” – pode haver acusação, já que os crimes de corrupção prescrevem, no máximo, passado dez anos. E, caso os alegados pagamentos tenham sido feitos naquele ano, entre Março, data da alteração do decreto-lei que permitiu a aprovação do outlet, e Maio, data em que Charles Smith enviou um email à Freeport a pedir dinheiro para pagar ao famoso Pinóquio –, os crimes já terão prescrito.»
Portanto, não deve valer a alegada admissão em 3 de março de 2006, em reunião em Alcochete, numa gravação que todo o Portugal viu na TVI (em 27-3-2009) - ver transcrição no CM, de 28-3-2009) e que não podemos esquecer, por Charles Smith ao administrador da Freeport Alan Perkins de que  foi pago a José Sócrates, ex-ministro socialista do Ambiente, «durante dois anos em pequenas quantias de três e quatro mil euros» através de «pequenos envelopes castanhos por baixo da mesa» através de um agente, «um primo»... O «primo», também foi nomeado por envolvidos no caso como «Bernardo» e o «Gordo» - mas José Paulo Bernardo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates, ouvido no inquérito Freeport em 9-11-2009, desmentiu ser  o «Bernardo» ou o «Gordo», o «primo», a que se referiram envolvidos no caso como receptador dos alegados pagamentos para licenciamento do Freeport. A esse respeito, disse o Sol, de 9-11-2009:
«segundo o SOL entretanto apurou, Charles Smith enviou um email a Manuel Pedro, a 18 de Maio de 2002, pedindo-lhe que contactasse, «conforme combinado com Bernardo», os administradores da Freeport PLC para que fossem transferidas 80 mil libras para pagar a 'Pinóquio' (um nome de código usado para designar outra figura-chave no processo, ainda não identificada).»

Se o polémico licenciamento do outlet foi aprovado pelo ministério do Ambiente em 14 de março de 2002, os pagamentos durante «dois anos» que Charles Smith admite - «em numerário durante dois anos (...) em pequenas quantias de 3 mil, 4 mil euros (...) demorámos dois anos a pagar isso» -, atirariam a prescrição para 14 de março de 2014.  Isto dá um prazo superior a ano e meio para a realização do inquérito e produção da acusação, se for caso disso, além da possibilidade de interrupção da contagem do prazo, conforme permite a lei. Charles Smith também referiu nessa gravação que os pagamentos destinados a Sócrates teriam decorrido «em 2002/2003», mas as datas, se tiverem sido feitos, poderão, eventualmente, ser apuradas nos levantamentos em numerário e nos movimentos bancários da Smith e Pedro e noutras contas, em confrontação com os levantamentos e os movimentos noutros períodos. Smith justifica ainda na gravação realizada por Alan Perkins, que os alegados pagamentos a José Sócrates, que, como «ministro do Ambiente deu aprovação», foram feitos depois de março de 2002: «havia um acordo sobre o pagamento e os pagamentos foram depois, embora ele já não estivesse no Governo» porque «o Sócrates tinha grandes ligações».

Ao baile mandado da prescrição, e da demora burocrática dos procedimentos impositivos, seguiu-se a dança da vitimização política: uma tese assente na ideia de que políticos não devem ser investigados pelos tribunais e se algum magistrado o intentar fazer está a perseguir politicamente e pessoalmente «anjos», que, como é sabido, são rosados.

Pelo interesse, transcrevo a notícia de José António Cerejo, no Público, de 20-7-2012:
«Tribunal pede ao MP para investigar pagamentos a Sócrates no caso Freeport
20.07.2012 - 18:02 Por José António Cerejo

O Tribunal do Montijo, reunido no Barreiro, absolveu Manuel Pedro e Charles Smith, mas valorizou os indícios de que estes tinham tido intervenção num alegado pagamento de luvas a José Sócrates, crime pelo qual não estavam acusados.

O colectivo de juízes que esta manhã absolveu Manuel Pedro e Charles Smith da prática do crime de tentativa de extorsão aos promotores do centro comercial Freeport ordenou a extracção de certidões com vista à investigação dos indícios de que José Sócrates recebeu dinheiro para que aquele empreendimento fosse autorizado, quando era ministro do Ambiente.
Ao longo das audiências de julgamento, diz o acórdão lido ao longo de três horas a uma velocidade que inviabilizou a tomada de notas pormenorizadas por parte dos jornalistas, resultaram “fortes indícios” de que foram feitos pagamentos a pessoas com altas responsabilidades na administração pública e no Ministério do Ambiente. Depois de enunciar com abundantes detalhes os motivos que levaram o tribunal a credibilizar os testemunhos que referiram os pagamentos alegadamente feitos a José Sócrates – entre eles os de Alan Perkins, ex-administrador do Freeport, João Ferreira do Amaral, advogado e amigo do arguido Manuel Pedro, e Mónica Mendes, antiga empregada da firma Smith e Pedro -, o acórdão lido pelo presidente do colectivo, Afonso Andrade, justifica a iniciativa declarando “insustentável” que se mantenham por mais tempo “suspeitas” sobre uma pessoa que exerceu o cargo de primeiro-ministro de Portugal.
O Ministério Público, ao nível do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), ou através da sua hierarquia, deverá agora decidir o destino a dar às certidões mandadas extrair do processo, nomeadamente se manda abrir um nova investigação visando José Sócrates, ou se reabre o inquérito que correu no DCIAP e levou ao julgamento ontem concluído. O PÚBLICO perguntou à Procuradoria–Geral da República o que é que vai fazer com tais certidões, mas ainda não obteve resposta.
O acórdão qualifica, repetidamente, a investigação do caso e o próprio processo como “suis generis”, atendendo designadamente às demoras ocorridas nas averiguações, e tece fortes críticas, ainda que indirectas, à directora do DCIAP, Cândida Almeida, e ao facto de esta não ter respondido ao pedido dos procuradores Vitor Magalhães e Paes de Faria para ouvir o antigo ministro do Ambiente e o seu secretário de Estado Pedro Silva Pereira. A directora “ignorou” o pedido, “foi como se não tivesse existido”, notam os juízes.
Tal como se esperava, em função da prova produzida durante o julgamento e até do pedido de absolvição formulado, esta segunda-feira, nas alegações finais do representante do Ministério Público, Vitor Pinto, os arguido Charles Smith e Manuel Pedro foram absolvidos do crime pelo qual tinham sido acusados. Não só tal crime não foi provado nas audiências, como “fez-se a prova de que os senhores não cometeram esses crimes”, salientou o juiz presidente.
Em Julho de 2010, no fim de mais de seis anos de investigação, o Ministério Público arquivou as suspeitas de que os sete arguidos iniciais tivessem praticado os crimes de corrupção, tráfico de influência, branqueamento de capitais ou financiamento partidário ilegal para conseguir a aprovação do Freeport, acusando apenas Charles Smith e Manuel Pedro de tentativa de extorsão dos promotores do Freeport, para os quais trabalhavam como consultores através da firma Smith & Pedro. José Sócrates nunca foi constituído arguido, nem ouvido no processo.»


Atualização: este poste foi atualizado às18:45 de 26-7-2012.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa e demais entidades referidas nas notícias dos media, que comento, não são arguidos ou suspeitos do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

A tomada do PSD pela Maçonaria

(Atualizado)


Foto no portal do Grande Oriente do Brasil - Rio de Janeiro
Prof. Manuel de Almeida Damásio nas bodas de ouro do Colégio Paraíso (fundado por Matatias Bussinger)
São Gonçalo, Rio de Janeiro, 18-9-2008
Com a presença de Maçons das Lojas Monte Ararat, Cruzeiro do Sul e Joaquim Rodrigues d´Abreu

(ver também: Grande Oriente do Brasil)


Para eles, no princípio era a Maçonaria, e a Maçonaria estava com o poder, e a Maçonaria era o poder. Ordo ab chao.

A Maçonaria compreendeu que o regime autoritário socratino tinha começado o seu declínio na primavera de 2007, na sequência do que chamámos a Páscoa da Cidadania que explorou o escândalo do percurso académico do ex-primeiro-ministro e modificou para sempre o horizonte mediático português. Lançado por mim, aqui neste blogue, em 22 de fevereiro de 2005, imediatamente após as eleições legislativas, o escândalo explodiu da panela de pressão onde os editores de confiança o tapavam e deu azo à indignação ativa, internética, do povo leitor e editor, objeto e sujeito de informação. Sabendo que a perda de legitimidade moral antecipa a perda do poder, pois a nave do governo afunda-se na primeira tempestade económica que enfrente sem o lastro da confiança popular, assustado com a desorientação socratina, um setor dominante da Maçonaria do Grande Oriente Lusitano (GOL), em aliança com um setor irregular da Maçonaria regular, decidiu tomar o PSD. Aliás, o atual grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, desde 4 de junho de 2011, é o Dr. Fernando Lima de Valadas Fernandes, ex-presidente da Engil, atual presidente da Abrantina e presidente da Galilei (ex-SLN), e que foi situado por António Capucho no apoio a Pedro Passos Coelho («O novo grão-mestre estava lá na vitória eleitoral de Passos Coelho, ao que me dizem», disse o ex-conselheiro de Estado ao CM, 19-2-2012).

Entre outros, os cinco motivos da decisão preventiva da Maçonaria de tomada do PSD eram os seguintes:
  1. Inquietava o cavaquismo no PSD, que levaria Manuela Ferreira Leite, à liderança do partido, substituindo Luís Marques Mendes, cuja liderança também não agradava, para além da autonomia da Presidência da República
  2. Preocupava muito, pelos efeitos, a médio-prazo, de contra-ataque sobre a organização, a deriva autoritária de Sócrates, ex-genro do venerável José Manuel Fava, num partido em que nas estruturas dirigentes quase só não é maçon quem for daquele grupo decorativo pós-guterrista da Opus Dei que se apresenta nas listas e bancadas;
  3. Ameaça a independência das bases do poder judicial, que as cúpulas fraternas não conseguiam controlar, a fluidez dos grandes negócios de Estado - e ainda não estava sanado o perigo da investigação sobre as franjas da pedofilia da Casa Pia que havia perturbado seriamente a pretendida idoneidade universal dos membros da organização
  4. Temia-se a rutura pós-socratina do povo com a Maçonaria, com a corrupção de Estado e com a promiscuidade do poder político com a aliança bancário-construtora.
  5. Aborrecia a combatividade de um setor patriótico ativo, que denunciava escândalos, expunha relações espúrias do poder e coemçava a estabelecer ligações políticas.

Por isso, definiu-se um projeto de tomada do PSD pela Maçonaria. Esse projeto baseou-se na alimentação mediática e no agasalho de um grupo de jovens turcos, laicos, cooptados por interesses económicos comprometidos com o poder socialista, que apresentavam uma ideologia variável entre o tardo-liberalismo e a arqui-social-democracia, geometricamente bloco-centralista e politicamente sistémico. A escolha dos kingmakers maçónicos recaíu sobre o tandem Pedro Passos Coelho-Miguel Relvas. Os mentores e os financiadores ficaram ocultos.

A alimentação mediática do grupo foi realizada pelos media de confiança socratinos e pelas antenas na sociedade civil, como forma de erodir Cavaco Silva e o PSD autónomo. Assim se garantiu tempo de antena e endosso de apoios.

E o agasalho foi providenciado pelo setor das obras públicas e da finança e ainda pela Universidade Lusófona que emprestava instalações e meios para reuniões e campanha - para além do apadrinhamento benevolente de Mário Soares e o apoio encoberto de José Sócrates (durante a primeira fase). Note-se que o custo de uma campanha política, em instalações, em materiais de campanha, em comunicações, em transporte, em refeições caras, em contratação de serviços e colaboradores, é demasiado dispendioso para ser realizado por um grupo sem financiamento. Neste caso, a campanha durou mais de três anos, com a primeira fase, a conquista interna do partido, a ser ainda mais dura do que a assunção do poder do Estado, pois a expetativa dos financiadores potenciais (os setores afetados por decisões políticas, como construtoras e bancos, etc.) em termos da esperada reciprocidade dos apoios é baixa, prudente e esquiva. Iso é, a fase dura é a conquista do partido, já que uma vez assegurada a vitória interna, logo chegam as ofertas.

O caso da Universidade Lusófona, uma «universidade maçónica» (o linque http://www.sabado.pt/Ultima-hora/Politica/Lusofona--Relvas-e-Damasio-sao-ambos-do-GOL.aspx já não funciona, mas o texto está transcrito abaixo, neste poste...) de génese e prática - curiosamente vizinha do colégio Pio XII -, é uma adaptação da tentativa de conquista do poder no PSD e no CDS por um grupo financiado e municiado nos apoios pela Universidade Moderna/Maçonaria da Casa do Sino. Mas essa foi uma tentativa de um grupo, mentorizado pelo professor J.J. Gonçalves e, paradoxalmente, arruinado pelo espalhafato e despesismo dos operacionais. A Universidade Lusófona é o produto paciente de um projeto nascido na Maçonaria, erguido em aliança com ex-padres, sacristãos e católicos, com destaque, para Fernando dos Santos Neves e Teresa Costa Macedo (muito útil para a expansão nos anos pios e cavaquistas e, depois, alijada quando já não era necessária, num conflito com acusações sobre a gestão de Manuel Damásio, resolvido por acordo financeiro). Mas, sobre o reitor Fernando dos Santos Neves, prepondera na universidade o Prof. Manuel de Almeida Damásio, maçon do Grande Oriente Lusitano - uma questão que não é nada «irrelevante» - até porque pertence à mesma obediência de Miguel Relvas, de acordo com a revista Sábado de 12-7-2012... Segundo a TVI, em 2006, quando Miguel Relvas se candidata à Universidade Lusófona, já seriam, ele e Manuel de Almeida Damásio, «irmãos» no GOL. E o Grupo Lusófona terá cedido instalações à campanha interna de Passos Coelho à liderança do PSD, em 2008 e 2010, segundo o CM, de 9-7-2012.

Progride primeiro lentamente, no fundo da tabela da qualidade, com o Instituto Superior de Matemática e Gestão (ISMAG) de Lisboa, criado em 1989, através da Portaria n.º 808/89, de 12 de setembro, nos tempos de ressaca após a cisão da Universidade Livre, em 1986, até à constituição como Universidade Lusófona, já no consulado socialista, em 1989, pelo Decreto-Lei n.º 92/98, de 14 de abril. Em seguida, ganha uma velocidade de cruzeiro, aproveitando as autorizações socialistas para a criação de licenciaturas, apostando em mestrados e depois em doutoramentos, aproveitando a decadência das outras, expandindo-se pelos canais maçónicos existentes no Brasil e desenvolvidos em África, absorvendo escolas universitárias pelo país inteiro com relevo para o ISG, INP e ISLAs, até se tornar a maior universidade privada portuguesa e o maior grupo universitário português a nível mundial: «onze instituições de ensino superior em Portugal, seis instituições universitárias noutros Países de língua Portuguesa, nomeadamente no Brasil e em Moçambique, para além de catorze escolas não superiores em Portugal e no Brasil», atingindo os 25 mil alunos. Um projeto de raiz universitária, que se alonga para outros níveis educativos - secundário, básico e pré-escolar -, se prolonga pelas rotas lusófonas para o Brasil e África, se alarga a outros setores como a saúde.

Mas o projeto da Maçonaria com banqueiros/construtores e a Lusófona para a tomada do PSD, 2008-?, é diferente daquele executado na Moderna, ainda que tenha um princípio semelhante de articulação entre a Maçonaria e uma universidade. O que os distingue é o financiamento construtor e bancário. É um projeto discreto, e calculado, de um setor da Maçonaria do Grande Oriente Lusitano, radicado na Loja Universalis com um setor irregular da Maçonaria regular, com base na Loja Mozart. Tratava-se de defender as colunas do poder político, já controlado pela maçonaria socialista e bloco-centralista (com ligação ao CDS, do tesoureiro Abel Pinheiro ao líder parlamentar Nuno Magalhães!...) contra a ameaça católica. E, ao mesmo tempo que se manteria o PS em mãos de confiança, fosse nas fraternais de António Costa fosse noutras quaisquer, mas seguras, conquistar-se-ia o PSD, o partido dos católicos, de maioria sociológica anti-maçónica, o partido que foi de Francisco Sá Carneiro e de Aníbal Cavaco Silva, para a organização. Um take-over de aparência interno, estilo MBO, pelos uomini di paglia ex-jotas proletários dos cartazes e bares, a quem convinha que os banqueiros, construtores e académicos providenciassem currículo.

O projeto sucedeu. Está agora sob fogo, quando as colunas aliadas de esquivam e os sacos de areia se despejam. Sem força moralç, não creio que dure. E o País vai soçobrando nestes projetos de poder e dinheiro.

Em abono da tese que aqui descubro, atente-se a esta notícia explicativa da Sábado, de 12-7-2012:
«Lusófona: Relvas e Damásio são irmãos na Maçonaria
12-07-2012, por Fernando Esteves, Nuno Tiago Pinto e Vítor Matos

O ministro e o administrador da universidade pertencem à mesma obediência maçónica, o Grande Oriente Lusitano

Miguel Relvas e Manuel Damásio, presidente do Conselho de Administração da Universidade Lusófona, pertencem ao Grande Oriente Lusitano (GOL). No momento em que o então deputado do PSD entrou na universidade já faziam ambos parte da maior obediência maçónica portuguesa. Miguel Relvas frequentava a loja Universalis, a que ainda hoje pertence. Manuel Damásio estava numa loja em que se encontravam também outros elementos da Universidade Lusófona.
Essa loja sofreu entretanto uma cisão interna, tendo dado origem a outras de dimensão mais reduzida. É numa delas que se encontra Manuel Damásio, juntamente com alguns professores daquela instituição de ensino superior. Em resposta a uma pergunta da SÁBADO, Miguel Relvas diz apenas que nunca se encontrou com Manuel Damásio em eventos maçónicos, mas não nega a pertença à organização.
A loja Universalis é considerada a mais poderosa do GOL. Nos seus quadros estão empresários e políticos de todos os quadrantes. A Universalis tem relações privilegiadas com a influente loja Mozart, da Grande Loja Legal de Portugal (a outra obediência existente em Portugal), a que pertencem, entre outros, o ex-espião Jorge Silva Carvalho, Nuno Vasconcellos, presidente da Ongoing, Luís Montenegro, líder parlamentar do PSD, e vários elementos dos serviços secretos. As duas lojas chegaram a reunir regularmente em jantares no restaurante Vela Latina, em Lisboa, no sentido de concertarem esforços de aproximação das duas maçonarias.
A SÁBADO apurou que vários membros da loja Mozart são professores na Universidade Lusófona. Fontes ligadas à instituição garantiram à SÁBADO que esta “é uma universidade maçónica”, que acolhe numerosos membros das duas maiores obediências nacionais. Esse facto provoca incómodo junto de uma parte do corpo docente, que neste momento não esconde a sua insatisfação com a forma como esta polémica tem exposto os métodos de atribuição de equivalências praticados na universidade.»

Já se tinha percebido. Já comentei acima. Estamos no prelúdio de um fim anunciado. Agora vão tinir as armas.


Atualização: este poste foi atualizado e emendado às 17:48 de 19-7-2012.


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