segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A tua vitória?

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Este ano não apareceu ninguém cá em casa a reclamar o Pão por Deus. Creio que foi o primeiro ano em que tal sucedeu e suponho que nunca nas últimas décadas houve tanta necessidade. Em vez da inocência e bondade dos santos do impronunciável Deus, as televisões destacam as bruxas do Halloween, uma tradição alienígena pagã, tornada politicamente correcta, com trevas, susto e sangue. A TVI abriu o telejornal do almoço com um desastre de viação algures no País, num tempo em que a morte, além do diabolismo desta brincadeira artificial, apenas interessa se for próxima - ou politicamente correcta - e as tragédias dos outros homens se desprezam por não convirem ao egoísmo da incerteza. Numa tendência paradoxal face ao egocentrismo e epicurismo dominante, a política torna-se totalitária, impondo negligência moral e resignação aos homens como condição do apoio paternal do Estado, mesmo quando o socialismo crónico (croonico e crooquico) faz do Estado português um moribundo (6,18% de taxa de juro, nesta segunda, 1-11-2010, após o prometido salvo-conduto do acordo orçamental, de 29-10-2010!). E nós, os vigiados da polícia política do Estado socialista, vamos oferecendo o bom combate, e, excepcionalmente, durando.

Porém, hoje, é Dia-de-Todos-Os-Santos, e mais destes mortos, ontem, 31-10-2010, na Igreja de Nossa Senhora da Anunciação, em Bagdad, no Iraque, pelo terror do Islão totalitário e bélico. Islão radical, castigador de quem pensa diversamente e opressor das mulheres, mas com forte apoio do chamado progressismo da esquerda anti-sionista (por exemplo, o Bloco de Esquerda), como é o caso do Irão (que também recebe o apoio do corrupto PT brasileiro da nova presidente lulista brasileira Dilma Rousseff, eleita no domingo, 31-10-2010) - ou noutra ex-religião, a China (por exemplo, o PS português face à violação de direitos humanos). Contra a liberdade dos homens, quer consolidar-se o totalitarismo do Estado e, quando o povo começa a reagir à corrupção e ao abuso, abre-se o acantonamento do Estado, onde se acoitam os ociosos, também aos aflitos desempregados e endividados, cercam-se as forças adversárias com a parafernália tecnológica e negra, e soltam-se os cães de guerra da fusilaria dos media e da (in)justiça obediente, com a barragem de fogo do pensamento único. Uma guerra sem quartel, nem vergonha, que é reservada ao inimigo interno, e a que é poupado o que se supunha ser o inimigo externo e, afinal, é um parceiro, numa trágica política de apaziguamento na linha da máxima (referida a Elton John?) da rendição e do recuo de que «é melhor viver de joelhos do que morrer de pé».

Lembrava-me um amigo, quando escrevi aqui, em 20-10-2010, «Quando o inimigo não se conforma com nada menos do que a nossa pele, não há outro resposta possível senão combater», que a pele pode não ser apenas o sentido figurado da vida, indicando-me o exemplo do martírio de Marcantonio Bragadin, capitão-general de Famagusta e provedor-geral do Reino de Chipre, que foi esfolado vivo pelos turcos de Lala Cara Mustafá Paxá, em Agosto de 1571. Retardado o socorro do reduto da Sereníssima República de Veneza em Chipre às forças do sultão Selim II - 6 mil venezianos contra 200 mil turcos -, enquanto se negociava e organizava a armada da Santa Liga, que sairia vitoriosa dos turcos na batalha naval de Lepanto em 7 de Outubro de 1571, Famagusta capitulava. Todavia, vendendo cara a derrota, como Bragadin prometera a Mustafá Pachá quando rejeitou render-se, respondendo ao comandante turco com a seguinte carta:
«Senhor da Caramania
Vi a sua carta. Também recebi a cabeça do senhor lugar-tenente de Nicosia [Niccolò Dandolo] e digo-lhe aqui que ainda que tenha tomado tão facilmente a cidade de Nicosia, terá de comprar com o seu próprio sangue esta cidade, que com a ajuda de Deus lhe dará tanto que fazer que se arrependerá doravante ter aqui acampado.
De Famagusta, 10 de Setembro.»

(Tradução minha da tradução em inglês, publicada em
SETTON, Kenneth M., The Papacy and the Levant (1204-1571), Vol. IV - The sixteenth century from Julius III to Pius V, Philadelphia, The American Philosophical Society, 1984, p. 996)

Em 31 de Julho de 1571, após onze meses de cerco e bombardeamento pela artilharia turca, Bragadin, com munições para apenas mais um dia de combate, rendeu-se finalmente, após conselho de notáveis e mediante promessa de Mustafá Paxá de poupar as vidas dos seiscentos militares e civis que restavam na fortaleza. Uma promessa que o general turco não cumpriu. Bragadin foi imediatamente decepado das orelhas e, após dias de tortura, durante a qual recusou converter-se ao Islamismo, foi esfolado vivo, sendo a sua pele, recheada de palha e cosida, enviada para Constantinopla como troféu ao sultão. Recuperada em 1680, a pele, com o perfume da alma dentro, repousa agora num mausoléu incrustrado na parede da nave direita da Basilica di San Zanipolo (Basílica de São João e São Paulo) em Veneza.

Na peça «The Life and Death of Julies Caesar», Shakespeare, na aurora desse século XVII, sintetizava a vantagem da bravura sobre a tragédia da cobardia: «Cowards die many times before their deaths; The valiant never taste of death but once». São Paulo (I Coríntios 15:55) já havia firmado essa glória na Bíblia: «Ó morte, onde está agora a tua vitória?».


Actualização: este poste foi emendado às 13:38 de 2-11-2010.

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