sábado, 15 de maio de 2010

A visita do Papa Bento XVI a Portugal - um balanço

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ABC, Os sinos de Fátima, 13 de Maio de 2010


É altura de fazer um balanço sobre a visita do Papa Bento XVI a Portugal.

O balanço é muito positivo. Divido a análise em três partes: o Papa, o povo, os adversários, a organização e o Estado.

A visita do Papa foi um êxito extraordinário em condições muito adversas.

O momento da Igreja é muito doloroso pela acumulação das notícias, velhas e novas, de abusos sexuais de crianças por padres e colaboradores da Igreja e sobre o tratamento interno desses abusos. À parte as críticas justas à Igreja, pelo abafamento e circulação dos abusadores, e menosprezo do pior pecado sobre a Terra, Bento XVI tornou-se o alvo principal dos ataques malélovos, paradoxalmente ele que mais fez, contra esses abusos. Nomeadamente, ao chamar, em 2001, à Congregação para a Doutrina da Fé a resolução central desses casos, ao impor, já como Sumo Pontífice, uma nova política de prevenção e repressão mais atenta desses abusos, que culminou com a decisão de comunicação dos abusos às autoridades civis, esclarecendo, em 12-5-2010, em entrevista (ver abaixo) que «o perdão não substitui a justiça». Sublinho que a natureza dos ataques, e a sua motivação por causa da agenda conservadora de Bento XVI (as Igrejas protestantes, onde não há celibato obrigatório dos seus ministros, têm tido até maior incidência da pedofilia no seu clero do que a Igreja Católica, mas não sofreram contestação de nível semelhante por causa dos abusos sexuais), não diminui, em nada, a gravidade do problema, nem deve reduzir a necessidade de consolidar a política de prevenção rígida, repressão dura com comunicação obrigatória das denúncias às autoridades civis, e transparência, nem a catarse e nem a penitência interna. Mas se o momento era dramático, o Papa esteve à altura do desafio. Não fugiu ao assunto e não o diminuiu, antes sublinhou a gravidade do caso e assumiu a culpa da Igreja, construção humana sob inspiração divina, que vence, mas não elimina o pecado.

O Papa tem um carisma diferente de João Paulo II. Intelectual, professor, gestor administrativo, mais habituado, por força das funções que desempenhou, ao gabinete do que à pastoral de contacto, Bento XVI é um homem sereno, firme e da palavra. Que era um homem da palavra, escrita e pronunciada, reflectida e muito profunda, já se sabia. Mas Joseph Ratzinger é também um homem bondoso, amável e autêntico na coerência da prioridade ao amor verdadeiro. Essa imagem, reservada debaixo do ar sereno, finalmente verteu para o povo.

A novidade da visita é que o povo sentiu esse carisma de bondade e autenticidade do Papa e uniu-se a ele. E, por ter aderido ao carisma do Papa, para lá do estatuto solene de chefe da Igreja, também acolheu com abertura e atenção as suas palavras. Em Portugal, Bento XVI ganhou ouvintes, além de leitores. A Igreja que, à parte a questão da pedofilia, tem sofrido uma guerra do relativismo moral, por causa das suas posições face aos costumes (moral sexual, eutanásia, drogas, família) e economia (salários, preços e lucros justos), está a resistir e a constituir uma proposta de genuinidade de atitude, de procura radical de um sentido da vida, que, afinal, só se encontra em Deus. O povo toma consciência desse desígnio, da sua identidade religiosa, da moda da secularização da moda, da necessidade de recristianização, adere, junta-se e une. O desígnio da civilização do amor convoca e move. O povo aceita a mensagem do Papa de que não é possível mais ficar silencioso, recolhido, escondido.

Fora do povo, e à margem dele, ficaram confinados os adversários. Para estes bastou  a atitude tolerante do povo que despreza o desrespeito das provocações elitistas de distribuição de preservativos durante as cerimónias, de gozo do Papa, que não calça Prada (mas os sapatos oferecidos por um sapateiro italiano, Adriano Stefanelli), bem como a raiva elitista que se angustiou com a adesão popular ao Papa pelos cristãos. Como não se conseguiu atingir a sua mensagem moderna, ficaram apenas os costumeiros ataques sobre o estilo.

A organização da visita, liderada pelo bispo auxiliar de Lisboa, D. Carlos Azevedo esteve muito bem. Moderna, desempoeirada, aplicada. Parabéns pelo programa, pelo atento secretariado de apoio, e pela execução do programa. Mesmo a crítica ao selecto Encontro com o Mundo da Cultura, se menos feliz no nome, acabou por conseguir a rendição dos adversários e neutros ao respeito e diálogo com a Igreja, representada pela intelectualidade do Papa - veja-se a notável crónica de Eduardo Lourenço, no Público de 11-5-2010, «Um Papa alemão na tormenta». Apesar da visita decorrer durante a semana, contra a expectativa da vanguarda anti-católica, acorreram multidões ao encontro do Papa, em Lisboa (280 mil pessoas - e não 80 mil como foi noticiado, contando apenas com os espectadores ordenados no Terreiro do Paço), em Fátima (500 mil pessoas) e no Porto (150 mil pessoas), com grande sacrifício físico e financeiro - a maioria dos portugueses vive nesta altura com grandes dificuldades financeiras para poder tirar dias férias (e a tolerância de ponto que ocorreu no dia 13 de Maio foi só para os funcionários públicos...). A inclusão do Porto honra a Cidade Invicta e o seu bispo D. Manuel Clemente, que se tem constituído como uma autoridade moral de enorme relevo nacional, mesmo perante os media controlados pelo ateísmo radical do Governo. A visita teve o mérito extraordinário de revigorar o Papa para a sua missão de reevangelização da Europa e do mundo tradicionalmente cristão.

No comportamento do Estado durante a visita considero os seguintes aspectos: a neutralização, certamente por instrução governamental, dos media directa e indirectamente controlados (quase todos!...) que evitaram a temida afronta mediática ao Papa e à Igreja; o aproveitamento da visita para enterrar o impacto negativo do pacote de austeridade pós-bancarrota do País (na sexta-feira negra, 7-5-2010); a provocação - premeditada, premeditada... - do primeiro-ministro de Portugal, o radical anti-católico José Sócrates, ao Papa, visível na veiculação pelos media de que era Sócrates que recebia o Papa e não o contrário, no tratamento por Sócrates do Papa ao nível de um simples bispo (Eminência...) e em mandar sentar o Papa que o recebia em sua casa (a Nunciatura...) - segundo li no João Gonçalves do Portugal dos Pequeninos (que merece um louvor especial no trabalho de cobertura e protecção no acolhimento mediático do Papa); e culminando na distribuição, por jovens (Quanto receberam à hora? Quem os contratou? Seria uma dessas agências de trabalho temporário? Quem pagou a acção?  Os jovens sabiam mesmo ao que iam ou a organização dissimulou a tarefa, como no caso da Adecco?),  às portas do Santuário de Fátima, imediatamente antes da missa papal de 13-5-2010, de propaganda, folhetos e bonés (verdes e brancos), do Governo socialista, na era da austeridade (!), do programa Mais Centro da CCDRCentro-Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território (exemplar colhido in loco, por mim). Se o Governo socialista tem uma das agendas mais radicais do mundo, em países de tradição católica, contra a doutrina da Igreja, não deveria, no âmbito da separação do Estado, pelo menos respeitar os locais de culto não fazendo propaganda da sua acção durante as celebrações religiosas?



Folheto desdobrável distribuído aos peregrinos junto ao Santuário de Fátima, no início da Missa Papal, de 13-5-2010
Programa Mais Centro (Programa Operacional da Região do Centro - QREN)
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro
Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território



ABC, Propaganda do Governo na Missa Papal de Fátima, do 13-5-2010
Boné distribuído aos peregrinos junto ao Santuário de Fátima, no início da Missa Papal, de 13-5-2010

Programa Mais Centro (Programa Operacional da Região do Centro (QREN)
Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro
Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território



Junto ainda os linques das intervenções do Papa em Fátima e no Porto:
  1. Oração do Papa na Capelinha das Aparições, Santuário de Fátima, 12-5-2010
  2. Homilia do Papa aos sacerdotes e religiosos na celebração das Vésperas, Igreja da Santíssima Trindade, Santuário de Fátima, 12-5-2010
  3. Discurso do Papa na recitação do Rosário, Capelinha das Aparições, Santuário de Fátima, 12-5-2010
  4. Homilia do Papa na Missa solene de celebração do 10.º Aniversário da Beatificação dos Pastorinhos Jacinta e Francisco, Santuário de Fátima, 13-5-2010
  5. Saudação do Papa aos doentes, no final da Missa, Santuário de Fátima, 13-5-2010
  6. Discurso do Papa às organizações de pastoral social, Igreja da Santíssima Trindade, Santuário de Fátima, 13-5-2010
  7. Homilia do Papa na missa na Avenida dos Aliados, no Porto, em 14-5-2010
  8. Discurso de despedida, no Aeroporto Francisco Sá Carneiro, na Maia, em 14-5-2010


Actualizações: este post foi actualizado às 11:16 de 16-5-2010.

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