segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Cartãogate: queixa-crime por desobediência e os indícios de eventuais crimes


O diário i noticia, hoje, 20-2-2012, que a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) vai apresentar queixa-crime contra o Ministério das Finanças por desobedecer ao acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que obriga os ministérios lhe fornecer os documentos de despesa em cartões de crédito, telemóveis e outras, dos governos socratinos. Diz o i, na notícia, assinada por Sónia Cerdeira, intitulada «Juízes vão apresentar queixa-crime contra Ministério das Finanças»:

«A Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) tenciona apresentar uma queixa-crime no Ministério Público contra as Finanças. Motivo: o ministério de Vítor Gaspar não disponibilizou, no prazo previsto, os documentos relativos às suas despesas (no mandato do anterior governo) violando uma decisão do Supremo Tribunal Administrativo (STA). Contactado pelo i, o ministério das Finanças esclarece que “os documentos solicitados são inexistentes”.
Em finais de Janeiro um acórdão do STA deu razão, em definitivo, à Associação de Juízes que, em Outubro de 2010, avançou com um pedido de informações sobre as despesas dos ministérios do governo de José Sócrates. Em causa estava a utilização de cartões de crédito, despesas com telefones fixos e móveis, pagamento de despesas de representação e de subsídios de residência por parte de membros do anterior governo. Mas foi já no tempo do actual governo que os ministérios tiveram de fornecer estes dados e num prazo de dez dias úteis.
Das Finanças, a Associação dos Juízes não recebeu nem os documentos pedidos, nem justificação para falhar o prazo. “Vamos apresentar queixa-crime porque há um claro desrespeito do Ministério das Finanças pelo acórdão do STA uma vez que o prazo já foi excedido”, afirma ao i o presidente da ASJP, António Martins, salvaguardando que esta decisão ainda será validada pela direcção da Associação.
Segundo António Martins, apenas o Ministério da Justiça entregou “toda a informação completa e transparente”. “Os outros ministérios parece que estão a esconder não sei o quê”, afirma. Com excepção do ministério de Paula Teixeira da Cruz, os restantes ministérios deram pouca informação ou “procuraram artificiosamente não dar respostas”, acusa o presidente da Associação de Juízes.»

Quatro comentários sobre esta notícia.

O primeiro comentário é sobre o não fornecimento de informação pelo Governo. O jornal diz ainda que foi o próprio gabinete do ministro Vítor Gaspar que respondeu a dizer que esses documentos são «inexistentes» (sic). O caso é mais aborrecido do que eu supunha. Admiti que fosse algum alto funcionário resquício do socratismo que tivesse negado a informação pedida, mas o jornal diz que foi o próprio gabinete do ministro. E, portanto, dificilmente podemos acreditar que o ministro não tivesse sido consultado sobre esta declicadíssima matéria. Tal como não cremos que a excepção da corajosa ministra Dra. Paula Teixeira da Cruz não confirme a regra do Governo não fornecer a informação pedida. Teme o Governo o juízo final do socratismo, possível pela investigação dos cartões de crédito?!...

O esclarecimento do Dr. António Martins, presidente da ASJP, sobre a marcha dos pedidos, mesmo após a decisão do supremo que intima o Governo a cumprir, é terrível para nova (e desnecessário cisma) entre poder político e poder judicial, por ingenuidade de um Governo que deveria promover a congregação do Estado. Diz o Dr. António Martins que os outros ministérios, com excepção do da Justiça, «estão a esconder não sei o quê» e «deram pouca informação ou procuraram artificiosamente não dar respostas». Quer o Governo, e em especial o Ministério das Finanças que tutela a tal conta do Tesouro, banco particular dos gabinetes, uma espécie de saco rosa, ficar com a fama do Ministério dos Negócios Estrangeiros que demorou e dificultou ao máximo o fornecimento ao processo Casa Pia da ficha do embaixador Jorge Ritto?... Quer o Dr. Vítor Gaspar, e qualquer dos outros ministros, sofrer o enxovalhado - e a vergonha perante os portugueses (e a troika...) - de uma queixa crise por desobedecer ao tribunal e não colaborar com a justiça?!...

Mais cedo ou mais tarde, todos os ministérios têm de fornecer a informação requerida, bem como indicarem os procedimentos internos de realização e registo dessas despesas. Então, se assim é, por que não colaboram imediatamente?!...

O segundo comentário é sobre o que fazer com a informação fornecida. Conta o jornal:
«Sobre os documentos fornecidos, António Martins diz que ainda vão ser analisados e será “equacionado” o que fazer com a informação. Mas não descarta que essa informação possa ser entregue aos tribunais. “Poderemos dá-la a conhecer a outras entidades no âmbito do Estado, mas para já vamos analisá-la”, diz.»

Qualquer indício de irregularidade ou ilegalidade nessas despesas, ou no seu registo, deve ser enviado ao novo Ministério Público. Deste nada mais se espera, até porque o próprio procurador-geral Dr. Pinto Monteiro é contra o que designou, em 14-2-2012, à Sic, «julgamentos políticos» porque isso seria «o fim da democracia» - presume-se que não estão nessa categoria perigosa os processos de políticos contra cidadãos, por exemplo, jornalistas, como aquele contra o jornalistae que julgamentos políticos são apenas aqueles em que políticos são arguidos... E mandar para o Tribunal de Contas - cujo presidente político filo-socialista, Dr. Guilherme de Oliveira Martins, devia ter sido demitido imediatamente após a tomada de posse do novo Governo (já que não se demitiu ele próprio) - é o mesmo que arquivar. Esse «tribunal» ainda diria essa análise não era legítima porque poderia conhecer o pagamento de matinés de hotel com o cartão de crédito do Estado, o que «estaria coberto pela reserva da intimidade da vida privada»...

O terceiro comentário é sobre a natureza das despesas, a qual tem de ser despistada para eliminar qualquer dúvida de ilegalidade, ou de irregularidade, na utilização ministerial, e secretarial, dos cartões de crédito: despesas sem relação, mesmo que remota, com a função; despesas fictícias;  e o levantamento de dinheiro a crédito, sem reposição.

Despesas sem relação com a função são aquelas para lá dos almoços, dos cafés e dos bares, do cabeleireiro, das roupas (do próprio...), do perfume, do whisky e dos charutos: são jóias, viagens e estadas acompanhadas (e familiares) para resorts, mercearias, móveis, etc.

Despesas fictícias são aquelas que simulam compras de bens e serviços em fornecedor cúmplice que cobra uma comissão e devolve o dinheiro em espécie ao prevaricador ou ainda aquelas que constituem contas abertas, ou saldos remanescentes, em determinadas lojas, serviços ou agências. Nem umas nem outras parecem poder caber no conceito de legalidade.

O levantamento de dinheiro a crédito pelo governante, com o expediente do cartão, não pode deixar de ser visto como o proibido «suplemento remuneratório», sem justificação, nem legitimidade.

E o quarto e último comentário é sobre o eventual não-registo dessas despesas do cartão de crédito do nosso Tesouro, tesouro do Estado, tesouro público - e não próprio, não deles. Não creio que. mesmo nesses casos, não seja possível, com paciência e diligência, reconstituir o rasto desse dinheiro. Mas, mesmo nesse caso extremo, será possível reconstituir do outro lado, solicitando ao Banco de Portugal, o registo desses movimentos com o cartão do Tesouro. E, se a conta era num banco comercial, basta ao Ministério Público, intimar o banco a fornecer a listagem das despesas. Em qualquer caso, o não registo dessas despesas, o apagamento dos ficheiros ou a obliteração física dos dcoumentos em papel, deverá motivar o competente processo-crime.

Uma sugestão final para os governantes: colaborem no requerimento dos juízes e forneçam todos os documentos, indicam os procedimentos seguidos, e refiram as ilegalidades ou irregularidades. É melhor do que cada um dos ministros não colaborantes com o requerimento dos juízes ser objeto de uma queixa-crime... pessoal.


* Imagem picada daqui.

Limitação de responsabilidade (disclaimer): As personalidades e entidades, referidas nas notícias dos media, que cito e comento, não são suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Saco rosa



O Correio da Manhã, de hoje, 18-2-2012, pp. 1 e 4-5 (ver fac-simile na Porta da Loja), aprofunda o tema das despesas dos ministros do Governo anterior e dos seus gabinetes, nomeadamente as realizadas com cartão de crédito ou pagas, que a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) solicitou no tempo do Governo Sócrates, e o Supremo Tribunal Administrativo decidiu finalmente. O quadro que pinta é ainda mais negro, e contrastante, do que os traços plúmbleos que a princípio se percebiam.

Quais as novidades?
  1. «Governo Sócrates usava cartões de crédito e fundo de maneio para despesas sem rasto».
  2. «Verbas secretas esticam salário  [de ministro] para 10 mil euros».
A situação descrita, a ser verdade, é gravíssima. Por pudor, talvez devêssemos mudar a pontuação e nos números acima transformar os pontos finais em pontos de interrogação com reticências, para sinalizar o nosso espanto. Espanto pela falta de rasto do dinheiro e pelo plafond do crédito ser alegadamente usado para esticar salário. Creio que a lei tem nome para ambas as coisas, aliás vários nomes para cada um desses eventuais desmandos...

O jornalista António Sérgio Azenha, que assina esta investigação do CM, recorda que, «como já deixou claro o Tribunal de Contas, o cartão de crédito funciona como um suplemento remuneratório». O jornalista continua: «No orçamento dos gabinetes dos membros do Governo não há referência a gastos com cartões de crédito ou dinheiro de fundo de maneio». A Secretaria de Estado da Cultura disse que esses gastos dos gabinetes «eram pagos com verbas provenientes das rubricas "despesas de representação e prémios, condecorações e ofertas». Porém, o que está em causa, acrescento eu, não é a utilização do cartão para «pagar almoços e jantares dos governantes» que mascara a real utilização do cartão. Além de que um almoço ou jantar, ou outra qualquer despesa oficial, podem ser faturados ao Ministério e ser paga depois.

O CM indica que a ex-ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, tinha um plafond mensal no cartão de crédito de 5.000 euros, o seu secretário de Estado Elísio Summavielle 3.700 euros, o ex-ministro Alberto Martins 4.000 euros e o seu secretário de Estado José Magalhães outros 4000 euros... Segundo o CM, o atual secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas não tem cartão de crédito oficial.

É ainda útil ler, neste trabalho do CM, a história gutérrico-socratina da utilização de cartões de crédito no Governo: em 1996, Manuela Arcanjo analisa, em 1996; após quatro meses, o seu diretor-geral do Orçamento permite que sejam usados pelos membros do Governo; uma semana depois, é alargado o bodo aos chefes de gabinete; e em Junho de 2009, o secretário de Estado, Costa Pina, cria a figura do «cartão de crédito do "Tesouro" Português"». Do Tesouro?... Diretamente, como a esposa do general Ben Ali?... Todavia, há de haver registo dessas operações - e se tiver sido destruído, há de ser possível recuperar.

O CM revela ainda que a associação de juízes admite «queixa-crime contra gabinetes que não entreguem documentos». O juiz Dr. António Martins, cujo papel patriótico como presidente da Associação de Juízes tem sido excecional, conta que «o Ministério da Justiça foi o único que transmitiu  [à ASJP] toda a informação de forma clara e transparente, sem nada a esconder» e que «os outros ministérios enviaram alguma informação (...) mas o Ministério das Finanças não enviou nada». Contudo, ou os ministros entregam os documentos pedidos ou, conforme explica o Dr. António Martins, «os ministérios que não entregarem os documentos "incorrem em responsabilidade civil, disciplinar ou criminal»...

Este Governo, e nomeadamente o ministro das Finanças, Dr. Vítor Gaspar, que aqui temos encorajado, não hão de gostar de sofrer o enxovalho de uma queixa-crime pessoal por desobediência ao tribunal. O atual Governo - todo ele! - deve fornecer essa informação à associação de juízes, como fez a extraordinária ministra da Justiça, Dra. Paula Teixeira da Cruz, uma mulher firme e de coragem - ao modo de uma senhora Thatcher lusitana, tanto dos Governos anteriores, como do atual. Sem medo, o atual Governo deve também entregar os gastos dos seus próprios gabinetes, se foram usados, e, se os tiver usado, terminar essa utilização, demonstrando auseridade também nos gastos próprios.

O Governo, por mais  ablutófobo que seja, não pode tapar os desmandos do anterior; antes deve cumprir, fornecendo todos os documentos que a lei, e os tribunais, exijam. E é melhor que - todo o Governo! - o faça já, entregando a informação completa à asssociação dos juízes - em vez de opor uma resistência passiva à barrela geral do Estado. O Governo deve liderar em vez de, contrafeito, ir a reboque da automotora patriótica, chiando o seu incómodo pelos carris torcidos. É o Governo quem tem de pôr o Estado na ordem, impondo, com o apuramento de responsabilidades, a pedagogia do rigor e da probidade.

Estou certo de que, como é da obrigação de cidadãos - e magistrados - e do patriotismo dos seus dirigentes, a associação de juízes portugueses remeterá para o Ministério Público qualquer indício de irregularidade ou ilegalidade nessas despesas.


Nota
: o José, da Porta da Loja, comenta e começa a tipificação destas condutas no poste «A imoralidade política em tom criminal».


Pós-Texto (22:01 de 18-2-2012): O ministro Miguel Relvas garantiu esta tarde, de 18-2-2012, que «nenhum actual ministro ou secretário de Estado tem direito a cartão de crédito pago pelo orçamento dos ministérios». E esclareceu: «Quando os governantes fazem uma despesa em nome do ministério pagam do seu bolso e a despesa é depois ressarcida».

Melhor. Se já está emendado o procedimento perigoso, menos difícil será aos vários ministérios cederem todos os documentos de despesas dos gabinetes dos governos socratinos pedidos pela associação dos juízes...


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As personalidades e entidades, referidas nas notícias dos media, que cito e comento, não são suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

Tudo isto podia ser evitado...

O Presidente da República, Prof. Cavaco Silva, cancelou visita à Escola António Arroio, em Lisboa, em 16-2-2012, onde tinha uma manifestação à espera. A impopularidade do Presidente bem podia ser evitada.

Frequentemente, a linha de menor risco no curto prazo é a mais perigosa no prazo longo. O resultado atual do prestígio do Presidente é o produto acumulado dessa escolha de compromisso contra natura. É altura de arrepiar caminho. Agora. Ou nunca.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Quanto mais nos bates...




No tempo do socratismo até enjoavam os panegíricos governamentais do DN até enjoavam. No desemprego, quando muito admitiam os oficiais 689 mil (1.º trimestre de 2011), Hoje, o jornal de Marcelino-Oliveira faz manchete com um número de 1,2 milhões de «desemprego real» (sic), que daria o fabuloso número de 21,6% de taxa de desemprego - embora, nesta mesma edição, refira que o Instituto Nacional de Estatística (INE) regista 770 mil desempregados e uma taxa de 14%...

Na miséria, os grupos de media portugueses vão atirando pedradas ao Governo, que lhes apara o jogo em vez de parar, de vez, direta e indiretamente, o fluxo extraordinário de dinheiro público, além de crédito e garantias.

O julgamento final do socratismo



Tem razão o Rui Costa Pinto, na sua crónica no i, de 11-2-2012, «À beira do inimaginável»: o Governo deve fornecer todos os documentos de despesa e subsídios dos gabinetes ministeriais que a Associação Sindical dos Juízes Portugueses solicitou, nomeadamente  «gastos com recurso a cartão de crédito, ao uso de viaturas e telefones móvel e fixo». A associação liderada pelo juiz Dr. António Martins viu-se forçada a recorrer aos tribunais para obter os dados do desperdício dos gabinetes dos governos socratinos. Porém, escreve Rui Costa Pinto:
«Pedro Passos Coelho e outros membros do governo ainda não respeitaram uma dupla decisão do Supremo Tribunal Administrativo (7 de Dezembro de 2011 e 24 de Janeiro de 2012) que obriga à disponibilização de documentos relativos às despesas e subsídios auferidos pelos elementos dos gabinetes governamentais no exercício de funções.»

O fornecimento desses dados, nomeadamente pelo ministro das Finanaças, Vítor Gaspar, que aqui tão isoladamente temos defendido, é fundamental para se abrir o julgamento final do socratismo. - já que a via da auditoria geral das contas públicas foi bloqueada pelo novo Governo PSD-CDS, eventualmente na expetativa (furada) de perdão futuro dos socialistas.

O apuramento de responsabilidades no desperdício dos gabinetes pode ser verificado através das autorizações de despesa e... das despesas sem autorização. E se as despesas realizadas com cartão de crédito não tiverem autorização legal, expressa e formal, nem documentos de suporte na tesouraria, e houver indícios de ilegalidade ou irregularidade, a associação dos juízes faria um notabilíssimo serviço à Pátria, se remetesse os elementos colhidos (e as falhas detetadas, nomeadamente falta de registo dos movimentos de cartão de crédito, de faturas e de recibos) para o Ministério Público. O novo Ministério Público - o antigo, com nova liderança... - poderia, então, caso já não existam, ou tenham sido obliterados, os recibos e as faturas dos ministérios, obrigar os bancos dos cartões de crédito usados a enviar a listagem das despesas de cada um e a verificar em que foram realizadas, aferindo do seu cabimento legal. Se tudo estiver certo, ninguém tem nada a temer.

A pedagogia da probidade exige a transparência e o apuramento de responsabilidades. A partir desse apuramento, é mais viável escrutinar, e obrigar à prestação de contas, os governos futuros, qualquer que seja a sua cor. O povo tem direito a saber em que foi gasto o seu dinheiro, e por quem, e a impor aos seus representantes o devido rigor e escrúpulo utilização do dinheiro público.


Atualização: este poste foi emendado às15:15 de 18-2-2012.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As personalidades e entidades, referidas nas notícias dos media, que comento, não são suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Reagrupamento da fação férrica com António Costa


Entrevista de Ferro Rodrigues ao Expresso (Cristina Figueiredo), 11-2-2012, caderno principal p. 14
(com chamada de primeira página)
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António Costa prepara a conquista da liderança do PS, para 2013, e do Governo, para 2015. A propósito, leia-se a entrevista de Ferro Rodrigues, em 11-2-2012, ao jornal do mano Ricardo, que acima recortei e colei.

A entrevista, pela ocasião e pelo destaque na primeira página do jornal, parece significar um realinhamento da fação férrica, que migra do socratismo para o costismo, e, ao mesmo tempo, uma promoção de António Costa. Recordo que a fação férrica refugiou-se no socratismo após a detonação do escândalo de pedofilia da Casa Pia e o seu ecónomo Vieira da Silva até pontificou instrumentalmente nesta organização. O negócio, que a entrevista denuncia, consiste no enfileiramento dos ferristas no grupo de António Costa em troca de uma candidatura oficial socialista de Ferro Rodrigues a Presidente da República, em 2016. As bases deste projeto de conquista do poder são a Câmara de Lisboa e o ISCTE.

Na entrevista, Ferro Rodrigues critica António José Seguro, ataca Manuel Maria Carrilho, afasta Sócrates e presta vassagem a António Costa.

Critica Seguro: «já tive ocasião de dizer ao secretário-geral: estou de acordo em que temos de ser responsáveis, mas temos de ter firmeza e combatividade, porque sem ela não somos oposição, somos um partido de conformismo»; e «é preciso um discurso sério e honesto sobre o País e a crise» (uma frase que o diretor Costa endurece e puxa para o título da peça maior da entrevista - «Já disse a Seguro: temos de ser firmes»); e «tem de haver alargamento e inclusão» (mas só de alguns que parece não estarem ainda incluídos...).

Ataca Carrilho: «rancor pessoal em relação a José Sócrates».

Afasta Sócrates: «há uma responsabilidade enorme de quem estava na Europa na forma como atacou esta crise»; e respondeu à pergunta «E Sócrates tem futuro na política portuguesa?» com «Viveu um processo muito personalizado e rancoroso... Ele próprio estará numa fase de distanciação mas compete-lhe a ele tomar as suas opções», embora, batendo na ferradura, depois de ter espetado o cravo, admita «não me parece que se possa afastar muito deste mundo».

Finalmente, presta vassalagem a Costa, o novo chefe, que era um compagnon de route sobresselente em 2002-2004: «Lisboa está muito bem entregue a António Costa»; e «Se há pessoa que tem grande juízo ético e de responsabilidade no comportamento político é António Costa». Ferro Rodrigues já parece ter-se esquecido da gestão da crise socialisto-casapiana em 2004 pelo ex-ministro da... Justiça, António Costa. Ferro Rodrigues ainda manifesta preocupação com «o próprio funcionamento do regime democrático»... E critica Passo Coelho, dizendo que «é inaceitável que o primeiro-ministro venha agora falar que é preciso evitar a pieguice!» - na verdade, segundo o Expresso, de 11-2-2012, o que, em 6-2-2012, Passos Coelho terá dito às jovens alunas (5.º ao 12.º ano) e aos docentes do Instituto de Odivelas foi «devemos persistir, ser exigentes, não sermos piegas e não termos pena dos alunos, coitadinhos, que sofrem tanto para aprender»...

Finalmente, na oportuna peça à parte, da entrevista, à pergunta sobre uma candidatura sua à presidência da República, retorque, alinhando na corrida, com «haverá muito tempo para conversar» - isto é, com ele...


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As personalidades e entidades, referidas nas notícias dos media, que comento, não são suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

As réplicas da Defesa e a necessidade de justiça

O ministro da Defesa, Dr. José Pedro Aguiar-Branco, proferiu um discurso no almoço-debate de lançamento do n.º 20 da Revista Segurança e Defesa, em 1-2-2012. Tive dificuldade em obter o texto do discurso escrito, mas finalmente obtive-o no sítio do PSD Valongo. Embora não conste do original, naquilo que designou «um mergulho na verdade das coisas», segundo o Expresso, de 2-2-2012, o ministro terá dito: «Tal como existem hoje, as Forças Armadas não são sustentáveis». Aliás, o texto tem a seguinte advertência: «só serão válidas as palavras proferidas pelo orador». Transcrevo, no final deste poste, a versão escrita do discurso do ministro Aguiar-Branco. E a seguir transcrevo também a carta aberta do presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA), Coronel da Força Aérea Manuel Martins Pereira Cracel, ao ministro da Defesa, de 8-2-2012, a propósito desse discurso.

Comento.

As associações sindicais de militaresAssociação de Praças, Associação Nacional de Sargentos e Associação de Oficiais das Forças Armadas (AOFA) - têm tomado posições, e realizado manifestações, que põem em causa a cadeia de comando e o poder político. Como, aliás, se previa  quando o poder político as consentiu. Contudo, com a inclinação da balança política para a esquerda, lá foram autorizadas. O poder político, que conheceu a experiência radical dos SUV (Soldados Unidos Vencerão), fundados pelo PRP, tentou evitar a sua criação, pois temia que fossem correias de transmissão do Partido Comunista e uma forma de neutralizar a cadeia de comando militar e a direção política.  Isto é, as associações militares tendiam a ser vistas como  parte da tática comunista habitual da superioridade de forças, em pirâmide, na qual a vanguarda revolucionária ultraminoritária, domina uma organização mais vasta, depois, em orquestração com outras, estruturas superiores, e sucessivamente até à direção do Estado. E quando vi o oficial de informações, de Otelo, e seu homem de confiança, no Copcon, o na altura capitão e agora coronel, Tasso de Figueiredo, como presidente da AOFA, mais desconfiado fiquei. Parece evidente alguma proximidade entre estas associações e o Partido Comunista, mas isso não quer dizer que sejam organizações comunistas ou que, por exemplo, a AOFA, ou os seus dirigentes e membros, ou o coronel Cracel (de coração-ao-pé-da-boca), estejam a mando do PC. Não creio que seja isso que, nesta altura, acontece. Ainda que seja clara uma inclinação esquerdista: na carta do presidente da AOFA lá vem o ataque político (extrassindical) ao caso BPN, mas não consta que outros casos políticos, como o alegado atentado contra o Estado de direito pelo controlo dos media (prévio às eleições de 2009) ou outros casos de corrupção de Estado tenham merecido igual crítica.

Quando o poder político passou a escolher os chefes militares dos ramos e das forças armadas sem prévia shortlist dos ramos não tardaram os governos a sucumbir à tentação de escolher para comandantes os oficiais mais submissos, e mais silenciosos, ao poder político, atendendo a um critério de nomeação de proximidade política (!), em vez de optar pelos oficiais mais valorosos, que poderiam melhor comandar e representar os seus homens e mulheres. Essa atitude alargou-se às posições intermédias. O take-over das estruturas das forças armadas incluíu também, nos tempos do Partido Socialista mas não só, a nomeação de militantes, e dependentes, para posições até aí ocupadas por militares no Ministério da Defesa, como foi o caso do Instituto de Defesa Nacional. E, para ministro ou secretário de Estado, nomearam-se indistintamente civis que jamais passaram pelas fileiras e sofrem, no terreno, a humilhação de não perceber nada de ordem unida e passar vergonhas nas cerimónias, onde se costumam apresentar sem decoro e com embaraço dos militares que se perfilam, marcham, saúdam ou lhes apresentam armas (lembro-me de ter visto na televisão uma parada em que o ministro da Defesa, Dr. António Vitorino, voltou as costas aos militares quando estes lhe apresentavam armas...). Claro que deve ser o poder político a escolher os chefes militares: o problema não está no sistema, está na irresponsabilidade das escolhas que degradam a representatividade. Não é um caso episódico, é uma tendência que provoca consequências e que só pode ser vencida com a responsabilidade patriótica dos governantes escolheram os oficiais mais capazes e prestigiados e respeitarem a sua posição.

Porém, as reclamações das associações de militares têm de ser aguentadas pelo ministro da Defesa e pelos secretários de Estado - a não ser que excedam os limites do respeito e da disciplina e para isso existem órgãos específicos - e lidadas com o relevo que têm, que não é a importância de declarações de chefes do estado-maior!... A cadeia de comando há de apresentar ao ministro o sentir das forças e representar os militares; e o ministro há de ter em conta essas posições para não fragilizar o comando, explicando as contingências e representando também ele as forças armadas,  com as cinco estrelas que ostenta no casaco do uniforme que a custo veste. Mas, neste tempo mediático, não existe validade na reivindicação, ou no conselho, dados no gabinete, porque não constitui pressão pública, não diminui a popularidade e não tira votos. Assim, só existem as queixas públicas e essas os chefes não as fazem, por educação... militar. Então, por conveniência imediata do poder político, coloca-se o ministro perante as associações militares porque se desintermedeiam as forças armadas dos seus chefes e a seguir este sofre os efeitos colaterais desse mesmo modelo. Perante a desconsideração dos chefes, as associações assumiram o protagonismo, e  garantiram popularidade interna, que o poder político lhes consentiu - chegando a manifestações à civil ao estilo, passe a diferença,  do pinochetiano Picnic de Punta Peuco, em 22-7-1995. Hoje, as associações são encaradas pelos media como representantes dos militares; e são vistas pelos próprios militares como quem melhor defende os seus interesses de soldo, condições e promoção, em detrimento dos chefes, numa dupla representação, contraditória com a condição militar, que poderá ter reflexos na coesão e na operacionalidade.

Um ministro não tem estados de espírito. Não pode ter desabafos públicos. Se não aguenta a pressão, como o ministro Carlos Brito, demite-se. Não pode descer ao nível das associações porque senão acaba embaraçado no jargão violento e desrespeitoso que estas copiam dos sindicatos civis.  Por mais que a sua vaidade o inste a fazê-lo. O ministério, e o gabinete, há de ter pessoal para fazer comunicados serenos, mais ou menos firmes, para estas ocasiões: não é preciso o ministro responder quase cara a cara, acusando as associações disto e daquilo, em críticas que os demais militares tomam contra si próprios, pois não gostam dos seus serem criticados. Se é um risco, em qualquer área, discursar em público para meter subordinados na ordem, nas forças armadas o risco é maior. Não se pode falhar, senão erode-se a autoridade e perde-se força. Para além disso, devido às contingências orçamentais, derivadas da ruína do Estado, e à corrupção do poder político, este está mais frágil e deve abster-se de falar de cátedra perante os militares, que cumprem um serviço que tem prestigiado Portugal nas missões internacionais para as quais os governos os convocam.

Um ministro da defesa de Portugal não pode dizer como, segundo o Expresso, de 2-2-2012, Aguiar-Branco terá dito: «Tal como existem hoje, as Forças Armadas não são sustentáveis». Uma afirmação que não desmentiu em entrevista à inevitável Ana Lourenço, na Sic Notícias, numa entrevista que deu no mesmo dia, 8-2-2012, da divulgação da carta da AOFA. Aguiar Branco representa os militares. Não pode copiar o absurdo alheamento de Alberto Costa, ministro da Administração Interna, em 1998, quando ele disse: «esta não é a minha polícia»!... O que o Dr. Aguiar Branco deveria ter dito era que, como existem e em cada momento, cabe ao poder providenciar meios de as sustentar e que ele ministro, as vai prover, como sempre se fez. Se o ministro não tem condições de as sustentar, não deve declará-lo publicamente: deve passar a pasta a quem o possa, e saiba, fazer, para além de qualquer lei de programação militar. Tal como os militares, que sabem o que está em causa, não estão isentos dos sacrifícios que o País está a fazer para manter a sua soberania, eles que contribuem em última instância com a sua vida para esse desiderato nacional.

Por conseguinte, o que importa é a defesa da soberania e não os protagonistas. Estes devem ser modestos e sóbrios. Consultando o sítio da internet do Ministério da Defesa Nacional - no modelo internético dos outros ministérios deste Governo -, dei-me conta do destaque, e dimensão, do ministro face aos sítios dos ministérios de outros países, como da Espanha, da França, da Itália, do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, da Alemanha, dos EUA, do Brasil e de Angola.

O problema está criado. O ministro não pode ser demitido porque, de outro modo, arrogava-se a uma associação de oficiais o poder de destituir governantes e mandar no executivo. Nem o ministro se deve demitir agora porque poria o Governo na mesma situação delicada. Mas a capacidade do ministro, perante a hierarquia militar - que, quiçá, até pode ter ponderado demitir-se na sequência da declaração - , e os próprios militares, fica debilitada e dificilmente recuperará deste transe.

Conutod, a questão maior não é o incontornável aperto financeiro do Estado: é a falta de justiça. A impunidade da corrupção de Estado, a decisão de não responsabilizar quem nos conduziu à ruína financeira e a demora na limpeza do Estado. Não são as associações que o Governo deve temer: são os patriotas, entre os quais os militares, que estão amargurados com a ruína e impacientes perante a injustiça. Este episódio fornece uma oportunidade para o Governo mudar de rumo.





«Discurso do Ministro da Defesa Nacional
José Pedro Aguiar-Branco
Almoço-Debate Revista Segurança e Defesa
Lisboa, 01 de Fevereiro de 2012
Só serão válidas as palavras proferidas pelo orador

Senhoras e Senhores convidados

Tenho defendido, em todos os fóruns em que tenho participado, que a solução para a crise que vivemos - para o equilíbrio das nossas contas públicas - não está, apenas, na nossa capacidade de captar nova e mais receita.
A solução não passa por um ministro das finanças especialmente iluminado, por uma política governamental messiânica ou apenas pela existência de uma maioria parlamentar coesa.
A solução para a crise está em nós. Em todos nós. Em cada um de nós.
Com mais ou menos responsabilidade e na forma como assumimos o exercício dessa mesma responsabilidade. Seja qual for o patamar da tomada de decisão e o grau de quem a toma.
Tão importante como rever ou reestruturar as orgânicas e os funcionamentos das instituições é rever ou reestruturar a nossa forma de encarar os problemas.

É rever e reestruturar a nossa forma de pensar e agir.

Esta é uma casa de pensamento. Como poucas no nosso país, infelizmente.
Os senhores pensam, discutem e escrevem sobre segurança e defesa.
E é por isso que ao elogio que seria devido contraponho o pedido de assumpção da responsabilidade de, neste momento crítico, contribuir, de forma ainda mais determinante para a concretização das reformas que também nós temos de efectuar.
À semelhança do que está a acontecer noutros sectores tudo está, entre nós, a ser repensado.
Não digo, apenas, por necessidade - porque não gosto do termo – mas também por uma questão de oportunidade.

A Defesa, nesse sentido, não é, pois, uma excepção.

Podia vir aqui falar-vos de intenções. Mas não quero.

Calculo que todos nesta sala tenham lido, com especial interesse, o que diz o Programa de Governo sobre esta área.

Por isso vou fazer diferente. Vou falar-vos do que já fizemos. Vou prestar contas, a quem sabe, destes curtos mas intensos, sete meses de governo:

- A nível interno concluímos o PREMAC com a redução substancial das estruturas e cargos dirigentes dos serviços do Ministério da Defesa. Uma redução de 27% das unidades orgânicas e poupança de um milhão de euros. Não é tudo o que se pode fazer mas é o início do que é preciso fazer.

- Decidimos a localização do novo Hospital das Forças Armadas. Em breve tomará posse a comissão instaladora que irá coordenar o processo de transferência de todos os recursos materiais, humanos e clínicos para a nova unidade. Quem conhece da importância deste tema, o longo historial que o mesmo arrasta – com início no já esquecido Conselho da Revolução – as falhadas opções do passado recente, tem a perfeita consciência da relevância do que decidimos. A bem da racionalização dos meios e do benefício para os utentes, a família militar.

- Concluímos o estudo que prevê a reformulação do Dia da Defesa
Nacional, de forma a optimizar os processos de recrutamento, divulgação e comunicação das Forças Armadas. A análise definitiva do estudo apresentado, que merecerá um debate aberto e transparente, permitirá uma maior aproximação do sentido cívico da participação no âmbito da Defesa Nacional e em particular do papel fundamental das Forças Armadas na afirmação da nossa soberania.

- Concluímos um outro estudo sobre a Polícia Judiciária Militar que conduzirá, nas próximas semanas, a uma decisão que permitirá uma racionalização, significativa, de recursos e meios, sem quebra da especificidade da natureza da intervenção em causa.

- Iniciámos o Processo de Revisão da Lei de Programação Militar. É uma matéria sensível em época de grande austeridade, que obriga a revisitar compromissos assumidos, debater níveis de ambição e encarar com frontalidade e realismo novos desafios que conduzam a partilha de capacidades como os que então em debate no seio da Nato como a “Smart Defense”, ou na União Europeia, como o “Pooling and Sharing”.
A este propósito não podemos ignorar que este tema não é específico de Portugal e é por todos conhecido as alterações significativas que estão em discussão, por exemplo, quer nos EUA, Alemanha ou Suécia.

- Resolvemos a questão da transposição para a nova tabela remuneratória que se arrastava desde 2009. E fizemo-lo, sem que houvesse lugar à devolução de qualquer verba e salvaguardando o princípio da antiguidade.

- Lançámos as bases, em colaboração com o IDN, para a revisão do novo Conceito Estratégico de Segurança e Defesa Nacional que pretendemos levar a cabo, ainda este ano. O tipo de ameaças de hoje, a convergência cada vez maior entre segurança e defesa e o reforço das missões de interesse público ou duplo uso devem ser, entre outras, revisitadas.

- Constituímos uma equipa técnica com o objectivo de repensar e reorganizar o funcionamento de todas as estruturas que integram o Ministério da Defesa Nacional, no sentido de lhes conferir uma maior coerência e capacidade de resposta no desempenho das funções que devem assegurar.

- Demos início ao processo de reorganização e reestruturação orgânica das Forças Armadas, tendo em vista conciliar a sustentabilidade, hoje em causa, com o nível de eficácia e prontidão exigíveis.

- Estamos a trabalhar no sentido de encontrar numa solução que permita desbloquear a questão das promoções, sem encargos adicionais para o Estado, respeitando a hierárquia das Forças Armadas, condição fundamental da cadeia de comando e especificidade que justifica a diferença de tratamento.

- Estamos igualmente a trabalhar em conjunto com o Ministério da Economia no estudo de viabilidade do aeroporto complementar de Lisboa.

- Estamos a preceder a um estudo sobre os Estabelecimentos Militares de Ensino, procurando gerir melhor os recursos, de forma mais racional, sem olhar a dogmas ou preconceitos, nomeadamente de casta ou de género e mantendo a identidade de natureza militar.

Estes são apenas alguns exemplos. Julgo que, independentemente de eventuais e saudáveis diferenças ideológicas, não encontrarei nesta sala alguém que não reconheça a necessidade destas medidas. Medidas que têm tanto de essenciais como de básicas. Tudo está a ser refletido. Em alguns casos chegaremos a soluções diferentes das que hoje existem, noutros perceberemos, pelo menos, o porquê das coisas.

Mas podemos e devemos ir mais além questionando, mesmo, se o papel das Forças Armadas é apenas o da defesa.

Ainda esta semana lembrava, no Instituto Superior Técnico, que a engenharia militar portuguesa, tão próxima de outros estados, continua ainda distante das nossas próprias administrações locais.

Minhas senhoras e meus senhores
Podemos e devemos aproveitar o momento para verdadeiramente distinguir o que é estratégico e o que foi tático.
Podemos e devemos aproveitar o momento não para reinventar as Forças Armadas mas para reafirmar a sua natureza.

Este é o tempo de fazer todas as reformas. E nós vamos fazê-las. Os portugueses não perdoariam se assim não fosse. Queremos passar das páginas da Revista à realidade do terreno. Mas para isso não basta o poder político. Por maior que seja a bondade e vontade das decisões.

São precisos todos aqueles que pensam a segurança e a defesa, como esta casa.
São precisos todos aqueles que no terreno têm o comando efectvos das operações.
Esta reforma faz-se convosco, faz-se com os militares, faz-se com os hefes. Ou não se faz de todo.
Porque esta nossa missão não se faz para se mostrar em Bruxelas ou à Troika. Para se mostrar no parlamento ou nas páginas dos jornais. Faz-se para nós, por nós e para a República.

Minhas senhoras e meus senhor
No momento em que faço um balanço dos primeiros sete meses enquanto Ministro da Defesa Nacional é impossível não falar, também, de algum descontentamento.
Seria um erro da minha parte ignorar as palavras e os actos de alguns movimentos associativos, nos últimos meses.
Não porque estes representem um incómodo ou um descontentamento generalizado nas Forças Armadas, mas porque pretendem fazer uma espécie de contraponto às políticas do Estado.
Na prática fazer política onde a política não devia ter lugar.
Deixem-me ser implacável na objetividade: um militar não é um funcionário público.
Não trabalha das nove às seis. Não é um funcionário da CP. Não conta nem cobra os quilómetros que faz ao serviço do país. Não é um professor. Não discute a avaliação que dele é feita.
Ser militar não é uma profissão como as outras. Ser militar não é um emprego como os outros.
Ser militar não é sequer carreira com progressão automática ou com as regras que conhecemos lá fora.
Ser militar é servir o país em armas, por mais duro, por mais trabalhoso, por mais difícil que seja. Ser militar é uma vocação. Que ninguém tenha dúvida alguma sobre isso.
E neste fórum compreendem certamente, melhor do que eu, que umas Forças Armadas com militares sem vocação são umas forças armadas que não funcionam.
Que não são capazes de cumprir os seus objetivos.

Durante anos alguns confundiram a profissionalização das Forças Armadas com a profissionalização dos militares que nela serviam. Nada mais errado.

Deixem-me ser ainda mais claro: se algum destes homens não sente a vocação, está no sítio errado.
Se algum destes homens não sente a vocação, antes de protestos, manifestações ou conferências de imprensa, precisa de mudar de carreira.
Ninguém é obrigado a ficar. Sem dramas, sem ressentimentos, sem problemas de parte a parte. Nem um homem sem vocação pode servir as Forças Armadas, nem as Forças Armadas, chegado o momento da verdade, podem servir-se de um homem assim.

Deixem o que é militar aos militares, às Associações o que é das Associações e à política o que é da política.
Disse várias vezes que o protesto é legítimo. Disse até que algumas das medidas podem não ser justas e que eu próprio preferia governar com outras condições financeiras.
Mas banalizar o protesto militar desprestigia a instituição que jura cumprir as leis da república. Utilizar o protesto militar como forma de intervenção pública, política e partidária é grave.
E compreendo a insatisfação dos milhares de homens e mulheres que servem na Forças Armadas quando alguém fala em seu nome para dar opiniões partidárias sobre a extinção de um feriado ou as condições salariais na Função Pública.

Repito: deixem o que é militar aos militares, às Associações o que é das Associações e à política o que é da política.

Quem viver mal com isso enganou-se na farda que escolheu.

Disse.»





«CARTA ABERTA A SUA EXª O MINISTRO DA DEFESA NACIONAL
[do Presidente da Associação dos Oficiais das Forças Armadas (AOFA), Coronel Manuel Martins Pereira Cracel

Entendeu Sua Ex.ª o Sr. Ministro da Defesa Nacional (MDN), em almoço/debate promovido pela Revista Segurança e Defesa, fazer afirmações que, consideramos, desprestigiam os militares e a própria Instituição Militar.

Entretanto, em troca de impressões com vários oficiais dos três Ramos das Forças Armadas, constatei que existe um sentimento generalizado de desagrado pelo teor das afirmações proferidas por Sua Ex.ª, razão que levou a que fosse incumbido de lhe dirigir esta carta aberta.

As Forças Armadas são insustentáveis, Sr. MDN?

Não são! Estão!

Porque entre respeitar os militares e a Instituição que se honram de servir ou dar continuidade a muitas desconsiderações que os seus antecessores cometeram, o Sr. Ministro escolheu trilhar o mesmo caminho destes, como repetidamente temos vindo a afirmar:

1. Em manifesta e aberta desconsideração pela condição de quem é militar, deu-se seguimento ao congelamento das promoções, situação que, conjugada com a redução de efectivos e a persistente suborçamentação, desde logo considerámos constituírem ingredientes propositadamente aplicados e que objectivamente contribuem para a descaracterização e desarticulação das Forças Armadas.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

2. Em nome da convergência com os restantes subsistemas de saúde públicos foi materializado um dos maiores atentados à condição militar, em resultado da qual os militares viram significativamente agravadas as condições sanitárias (comparticipações, desconto obrigatório de 1,5%, pagamento de taxas moderadoras pelos familiares, extensão aos reformados das regras aplicadas aos restantes militares, nomeadamente no que respeita às comparticipações, com as gravosas consequências que daí advêm para inúmeros camaradas a braços com um estado de saúde mais e mais exigente em matéria de gastos na farmácia, frequentemente, para os ex-combatentes, devido a sequelas da Guerra, etc.).

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

3. Como se tal não bastasse, o OE2012 prevê uma redução de 30% nas verbas para a saúde no corrente ano, sabendo-se que está prevista a redução de mais 20% em 2013 e outras reduções até 2016, visando o autofinanciamento do subsistema de saúde militar, numa postura de manifesto desrespeito pela Lei de Bases Gerais da Condição Militar (Lei nº 11/89, de 01 de Junho).

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável.

4. As Forças Armadas aproximam-se da paralisia por falta de recursos que lhes permitam suportar as despesas de funcionamento e de manutenção. O nível de instrução está abaixo do que é minimamente exigível por iguais motivos.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

5. A óbvia desmotivação, insegurança e falta de confiança reinantes entre os militares, constituem claros sinais, cuja natureza deveria ser motivo de preocupação de qualquer responsável pela Defesa Nacional, mas que o Sr. Ministro parece não levar em conta.

Isto, sim, Sr. Ministro, é insustentável!

6. Mais do que qualquer outra Instituição, as Forças Armadas são aquela que maior número de reestruturações sofreu desde 1974, a última das quais se verificou em 2009. Sem que, de uma vez por todas, o poder político decida e defina qual deverá ser a estrutura que permita às Forças Armadas exercer capazmente a sua competência constitucional de defesa militar da República.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

7. Depois da redução das remunerações em 2011, da aplicação de uma taxa extraordinária ainda em 2011, dos cortes nos subsídios de férias e Natal em 2012 e 2013, dois anos passados sobre a transição para a Tabela Remuneratória Única, entendeu o Sr. Ministro penalizar ainda mais a remuneração de cerca de 4.000 militares, numa lógica que mais se assemelha a punição colectiva.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

8. Afirmar que os militares não são funcionários públicos (pelos quais nutrimos, aliás, o maior respeito), e tecer-lhes outros encómios mas, na prática, reduzir gradualmente a condição militar em termos de direitos e regalias, equiparando-os, deste modo, ao funcionalismo público em geral, continuando contudo a sujeitá-los à totalidade de especiais deveres (incluindo a permanente disponibilidade para o serviço e o sacrifício da própria vida), sem que existam contrapartidas morais e materiais adequadamente justas, consubstancia uma atitude muito pouco séria.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

9. Entendeu o Sr. Ministro discorrer acerca das Associações Profissionais de Militares (APM), com uma insanável contradição subjacente ao que disse: se, por um lado, reconhece existirem razões de descontentamento entre os militares, depois, quando as APM, que, procuram, como V. Exa. sabe, privilegiar o diálogo e exercer as competências estabelecidas na Lei Orgânica nº 3/2001, de 29 de Agosto, tentando contribuir para as necessárias soluções, vêem o Sr. Ministro ignorar esse quadro legal.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

10. Confrontados com tudo o que lhes vai acontecendo, os militares, por se fecharem as portas do diálogo e da concertação, utilizam, com toda a dignidade, os seus direitos, nomeadamente os de reunião e manifestação constantes na Lei da Defesa Nacional, para darem pública conta dos problemas com que são confrontados.

As APM deveriam ser auscultadas ou envolvidas em matérias do seu âmbito, situação que não acontece porque o Sr. Ministro não cumpre a referida Lei.

Isto sim, Sr. Ministro, é insustentável!

Importa, no entanto, sermos claros Sr. Ministro. A Associação de Oficiais das Forças Armadas, se e quando auscultada ou envolvida em matérias do seu âmbito, situação que não acontece simplesmente porque não é atendido o quadro legal que obriga o Sr. Ministro a fazê-lo, dará nota das suas posições de modo frontal e com toda a lealdade. No entanto, só concordará com aquilo que merecer a sua concordância e nunca com medidas que ponham em causa o sentir profundo dos oficiais, contrariamente ao que parece ser o desejo do Sr. Ministro.

11. E diz mais, o Sr. Ministro; que as APM"s fazem política, até partidária.

Como assim, Sr. Ministro?

Denunciar perante a opinião pública as medidas lesivas e, consideramos nós, carregadas de falta de respeito pela dignidade de quem jurou e serve abnegadamente (sem se servir) a Pátria, é fazer política?

12. Porque, na realidade, sendo verdade que os militares estão sujeitos a severos deveres e restrições de vária ordem, nada os obriga a serem submissos, acomodados (pelos vistos, daria jeito ao poder político que assim fosse), ignorantes e apolíticos, alheados do que vai acontecendo no País e, concretamente, com o que de uma forma mais directa interfere com a sua condição militar e com as Forças Armadas.

13. Tudo nos leva a crer que o Sr. Ministro anda mal informado, pois senão saberia das conversas que correm em Messes, nos corredores das U/E/O e na NET, sobre as situações que ocorrem e que provocam a indignação da maioria dos oficiais. Conversas que têm como tema, não só as notícias que surgem nos órgãos de comunicação social, como, até, as situações descritas no livro "Como o Estado gasta o nosso dinheiro", cujo autor, o Juiz Jubilado do Tribunal de Contas, Carlos Moreno, o ofereceu à AOFA com uma amável dedicatória, onde constam palavras como "respeito", "consideração" e "estima".

14. Será, portanto, política alertar para situações de que poderão decorrer a penalização dos militares e das Forças Armadas, dando a conhecer, a título de exemplo, a forma como, nessas conversas, os oficiais vêem o modo como tem vindo a ser tratado o "dossier" BPN, obrigando uma significativa parcela do orçamento a ser desviada para dar cobertura, tudo leva a crer, às consequências de criminosos desmandos?

Será que é política ter consciência, formada nessas conversas dos oficiais (neste caso, graças aos dados insuspeitos trazidos para a opinião pública pelo analista económico Gomes Ferreira, no dia 24 de Janeiro passado, no programa da SIC Notícias iniciado às 22H00) de que o "dossier" das PPP"s, com as astronómicas verbas envolvidas, deveria constituir-se como primeira prioridade, de modo a fazer reverter para o interesse de todos, as milionárias verbas de que alguns beneficiaram a coberto de leoninos contratos celebrados?

A rápida eliminação destas situações, permitiria, por exemplo, entre outras, criar condições para evitar onerar da forma como o estão a ser, os militares e as Forças Armadas.

Não consideramos política e, muito menos, política partidária, tal postura.

Trata-se, isso sim, do uso de um direito que a própria cidadania impõe.

15. "...se algum destes homens não sente a vocação, está no sítio errado"; "... Se algum destes homens não sente a vocação, antes de protestos, manifestações ou conferências de imprensa, precisa de mudar de carreira", disse o Sr. Ministro.

Sr. Ministro: nunca lhe ocorreu que falava de gente honrada, de cidadãos que, sendo militares, aprenderam a amar a sua Pátria, muitos deles louvados e condecorados pela forma exemplar como vêm cumprindo ou cumpriram o seu Juramento de Honra?

Sr. Ministro: nunca lhe ocorreu que, nessa condição, é legítimo pronunciarem-se (acerca das questões que, em seu entender e no quadro que a Lei lhes permite), sobre matérias que consideram colocar em causa um dos principais pilares do que sobra da Soberania desta nossa Terra?

16. O Sr. Ministro, bem poderia, ponderando de outra forma o pensamento, ter evitado pronunciar o que pronunciou, respeitando quem o merece, porque, ao contrário de outros que se servem da coisa pública e dos cargos que ocupam, para vultuosos proveitos privados, os militares são cidadãos de uniforme, investidos da responsabilidade maior de defender a sua Pátria, se necessário com o sacrifício da própria vida, e que, por esse e outros motivos que a sua condição lhes impõe, consideram consubstanciar uma falta de consideração a forma e os termos como se lhes dirigiu.

17. Parafraseando Martin Luter King, um cidadão do mundo atento às injustiças a que assistia, "O que mais preocupa, não é o jeito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem carácter, nem dos sem ética. O que mais preocupa, é o silêncio dos bons!"

Sem qualquer presunção, procuramos fazer parte do grupo daqueles para quem o silêncio, a passividade e o conformismo não são modos de estar na vida, seja na condição de cidadãos e, por maioria de razão, como militares que somos, na forma e com a alma, e esta, Sr. Ministro, não há vocação, como a entende, que a substitua!

18. Bem gostaríamos que o Sr. Ministro olhasse de outro modo para o que vai acontecendo aos militares e à Instituição Militar.

Pode crer, Sr. Ministro: os militares compreendem como ninguém o sentido de reformas, desde que colocadas ao serviço da Nação a que pertencem e cuja perenidade se deve à forma como se bateram ao longo dos séculos e não merecem, longe disso, as palavras que proferiu.

Face ao que precede, pela acção, mas fundamentalmente pela inacção relativamente ao que vai acontecendo aos militares e à Instituição Militar, mas também dando voz ao descontentamento de muitos que se sentiram humilhados com as palavras proferidas, nos termos em que o fez, entendemos que o cargo de que V. Ex.ª , Sr. Ministro, é responsável, bem mereceria outra clarividência ao serviço de uma causa maior: a da Pátria a que pertencemos.

Tudo isto, Sr. Ministro, é insustentável!

7 de Fevereiro de 2012

Manuel Martins Pereira Cracel
Coronel»



Atualização: este poste foi emendado às 23:47 de 14-2-2012.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Desemprego jovem: socialismo e falta de formação qualificante

elevada dimensão do desemprego jovem é um dos problemas económicos e sociais mais preocupantes do hemisfério norte. Por mais que se tentem novas fórmulas, a política do Estado Social(ista) não consegue resolvê-lo. Este artigo do Libertad Digital, de 8-2-2012, de D. Soriano, «Porque é que metade dos jovens espanhóis estão no desemprego?», refere os dados e indica uma causa.

Segundo o Eurostat, a percentagem de desempregados jovens (menos de 25 anos) no final de 2011, é: 30,8% em Portugal; 48,7% em Espanha; 47,2% (dados do final de Outubro de 2011) na Grécia; e 22,1% na União Europeia (27 países). Já a taxa de desemprego geral no final de 2011 foi: 13,6% em Portugal; 22,9% em Espanha; 19,2% (dados do final de Outubro de 2011) na Grécia; e média da União Europeia de 9,9%. No gráfico, elaborado pela Zero Hedge, que a seguir publico, o retrato fica mais simples:



A curva grega (laranja) parece ir cruzar, no sentido ascendente, a curva espanhola (vermelha) e a curva portuguesa (azul), ainda que distante destas duas, segue a um ritmo mais elevado do que a da União Europeia (verde). A curva portuguesa é mais errática, sujeita a altos e baixos, algo que dificilmente pode ser explicado pelo emprego sazonal (que a Espanha e a Grécia também têm...), mas mais pela denunciada manipulação socialista das estatísticas de emprego, nomeadamente o abate estatístico regular de desempregados reais.

Sobre a realidade espanhola, a Prof. Sara de la Rica, da Universidad del País Vasco, e Brindhusa Angel, do Observatorio Laboral de la Crisis, citadas neste artigo da Libertad Digital, afirmam: «A idade em si mesma não tem nenhuma relevância na explicação da perda de emprego». Não se pode todavia, concluir, como sugerem as autoras de que o motivo é a legislação laboral: se os empregos fossem sem termo não haveria tão grande destruição de emprego. Ora, como só tratam da destruição de emprego, e não falam da criação de emprego, ficam com uma realidade parcelar. Os empregos sem termo resultam da estabilidade e produtividade das empresas e não o contrário. E os contratos a prazo são a resposta possível para a criação de emprego: sem essa possibilidade, muitos desses empregos nem sequer seriam criados. Portanto, o caminho não pode ser uma legislação laboral que elimine os contratos sem termo, mas a resolução do problema político-económico que determina a falta de iniciativa e a dificuldade em mater as empresas de pé.

No artigo do Libertad conclui-se, com base na informação deste observatório, que «os jovens têm mais dificuldade para conservar o seu trabalho porque são temporários e têm menos tempo de empresa, não por serem jovens». De acordo com os dados do final de 2011, semelhante nos outros períodos estudados, os contratados a prazo (20,4%) perdem muito mais o seu emprego do que os empregados sem termo  (1,6%): 12 vezes mais. Daí a procura dos jovens, e dos adultos, por empregos sem termo, vítimas muito menores da destruição de emprego.

A causa do desemprego jovem apontada no artigo da Libertad Digital é a falta de formação. Ou formação inadequada. Para lá do socialismo - Estado Social(ista) - enquanto causa maior de políticas económicas e laborais erradas, que a autora não aborda. Em qualquer caso a informação que estes artigos trazem é útil. Para reduzir o desemprego jovem, em vez do desperdício de dinheiro na certificação de competências  das Novas Oportunidades, é decisivo dar prioridade à formação qualificante - já que não podem ser vencidos os bloqueios de natureza político-ideológica. Por isso, insisto num Programa de Reconversão Profissional de Jovens Desempregados, nomeadamente dos licenciados em áreas com escasso emprego, com especializações e pós-graduações e bolsas de estudo (em substituição de subsídios de desemprego mais ou menos ociosos).

sábado, 11 de fevereiro de 2012

A forma das conversas privadas na União Europeia


Nada de vi de submissão do ministro das Finanças, Vítor Gaspar, perante o seu congénere alemão, Wolfgang Schäuble, na conversa privada, na reunião do Eurogrupo de 9-2-2012, em Bruxelas, que a TVI de José Alberto Carvalho (sem respeito pela deontologia) gravou e tornou pública, nem de sobranceria do ministro germânico. Pelo contrário, vi Gaspar consciente do lugar de Estado que ocupa, agradecendo a disponibilidade do governo germânico, mas lembrando os progressos significativos que Portugal fez nos últimos tempos, e um ministro alemão, respeitoso e responsável, concordando com isso. Schäuble explicava a Gaspar que, depois de resolvido o novo acordo com a Grécia, os alemães estavam preparados para discutir uma revisão do pacote de ajuda financeira a Portugal que terá de ser estendido, em dinheiro e prazo, porque o Estado português jamais teria condição de voltar aos mercados financeiros tão cedo e em tão grande montante, quanto o fugitivo Sócrates aceitou... Essa disponibilidade não deve, porém, ser usada para o abrandamento, e o alargamento, do equilíbrio das contas públicas em Portugal. A conversa abona a favor de Gaspar.


Note-se que Wolfgang Schäuble ficou paralizado dos membros inferiores, após ter sobrevivido,  a um atentado de um radical, em 12-10-1990, em Oppenau, na Floresta Negra, que lhe disparou dois tiros que lhe atingiram a face e a medula espinal na terceira vértebra torácica. Está confinado, desde então, a uma cadeira de rodas. Diz que isso não é um impedimento para o seu trabalho e só lamenta que «os seus colegas tenham de se deslocar até ele e não vice-versa», mas deseja que «eles saibam que isso não tem nada a ver com arrogância». O facto não é desconhecido de Nuno Saraiva, que, todavia, em crónica no DN, de hoje, 12-2-2012, usou a infeliz expressão «se agachou» para explicar a postura de Vítor Gaspar... Da mesma forma que, nesta foto de Novembro de 2010, do Spiegel, a posição sobranceira e o dedo em riste de Teixeira dos Santos perante Schäuble não significa que o ministro socratino estava a mandar no seu congénere alemão...



Já na conversa do novo ministro espanhol da Economia, Luis de Guindos, e o comissário europeu da Economia, Olli Rehn, em Bruselas, ainda em 9-2-2012, me pareceu a atitude do governante espanhol de inferioridade e a do comissário finalndês de algum desprezo. É certo que a reunião estava prestes a começar, mas o comissário europeu não tem paralisia das pernas, nem, que conste, do pescoço... A conclusão a tirar da prestação de contas é de que o socialismo desgraçou o tesouro dos países ibéricos e agora mais nada nos resta do que pedir e cumprir...


Pós-Texto (16:09 de 12-2-2012): Previne-me alguém que o Rui Carmo, no Insurgente, citando a Domadora de Camaleões, denuncia o comentário de Ruben de Carvalho, do PCP, na SicNotícias, em 10-2-2012, sobre a dita conversa privada. Ruben de Carvalho ainda falou em «vergonha», «inqualificável», «arrogância», «sentado na cadeira sem ter a gentileza», «chocante», «o arrogante ministro da Alemanha», «malcriado», «chá quando era pequeno que provavelmente não beberia» e «circunstâncias lamentáveis»... E o host do debate, Mário Crespo, também concorda que a postura de Wolfgang Schäuble é idêntica à de Martin Schülz na sua opinião, de 1-2-2012, sobre as relações entre Portugal e Angola... Razão tinha o próprio Schäuble em recear que a sua paralisia fosse confundida com arrogância...


Atualização: este poste foi emendado e atualizado às 16:09 de 12-2-2012.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Sobranceria alemã face a Portugal e a Angola



O senhor Martin Schulz, o socialista alemão presidente do Parlamento Europeu, deve estar calado sobre o vetor lusófono da política externa portuguesa em vez de se ousar arrogâncias e disparates como este, com laivos de desprezo racista, como este de 1-2-2012:
«Há umas semanas estive a ler um artigo no Neue Zürcher Zeitung que até recortei. O recém-eleito primeiro-ministro de Portugal, Passos Coelho, deslocou-se a Luanda. Passos Coelho apelou ao Governo angolano que invista mais em Portugal, porque Angola tem muito dinheiro. Esse é o futuro de Portugal: o declínio, também um perigo social para as pessoas, se não compreendermos que, economicamente, e sobretudo com o nosso modelo democrático, estável, em conjugação com a nossa estabilidade económica, só teremos hipóteses no quadro da União Europeia.»

Portugal é livre de desenvolver o vetor lusófono na sua política externa, de se relacionar economicamente com quem entenda e de dar prioridade a investimentos de países irmãos, como é o caso de Angola. Portugal não é obrigado a vender com desconto, a empresas alemãs, participações do Estado, como foi o caso da EDP, e se os incomoda que os chineses comprem, paguem mais... Nunca aceitámos que se cobrisse o nosso País com um stahlhelm imperial. Os dirigentes alemães não devem falar e agir como se fossem diretores da Europa ou suseranos de Portugal (como pareceu ser o caso da declaração da senhora Merkel sobre  Madeira, em 7-2-2012), que é um país independente e menos controverso. Melhor seria que as autoridades alemãs se preocupassem em punir criminalmente os envolvidos no caso Ferrostaal.

País médio em termos europeus, Portugal, que, apesar da depressão económica profunda, não está perante o seu fim histórico (como previu Amorim de Carvalho), e resiste à seca financeira, aos ventos políticos e às marés ideológicas, coxearia sem a perna lusófona funcional. Portugal não pode afunilar-se na estreita garrafa do ácido Riesling, onde se dilui. Portugal não existe sem língua. A lusofonia é um fator que o País deve projetar para alavancar a sua força na Europa, onde se afirma mais pela relação internacional do que pelos recursos endógenos.

O que a sobranceria sintomática do senhor Schulz justificava era ser apresentado um protesto formal do Governo português junto do Parlamento Europeu e o representante da União Europeia em Luanda ser chamado pelo Governo angolano a explicar a declaração hostil do presidente alemão do Parlamento Europeu.

Doping: política, verdade e saúde

Alberto Contador foi finalmente sancionado com dois anos de suspensão por dopagem com clembuterol. Os media, desportistas e políticos, espanhóis defendem o ciclista, insultam a Agência Mundial Antidopagem e a União Ciclística Internacional e dizem acreditar piamente no argumento do corredor de que ingeriu carne contaminada e no teste do polígrafo que ele apresentou, face às acusações de alta concentração da substância e de presença de ftalatos na análise. Na ressaca da proteção da presumida inocência dos atletas, da reposição do tabu do doping, com ataques politicomediáticos em Espanha sobre as polícias, os tribunais e as organizações internacionais - mesmo após a evidência da Operação Puerto, em 2006, ou as escutas e as análises da Operação Galgo -, é o desporto de alta competição espanhol, e os seus êxitos nos últimos vinte anos, que ficam contaminados e, como na RDA, debaixo de suspeita mundial, para lá do ciclismo e do atletismo, chegando à força dos tenistas e à pressão alta do Barcelona. A luta contra o doping não pode ceder à falsa ragion di Stato. Está até para além da da verdade desportiva: trata-se da preservação da saúde dos atletas e dos jovens que os emulam.

A questão é a necessidade de sanção social, já não de igualdade inter pares. Intrigado com o assunto do doping perguntei uma vez a um aluno meu, ciclista profissional. Respondeu-me com um sorriso categórico: "Professor: todos tomam...".


Atualização: este poste foi emendado às 13:58 de 10-2-2012.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Novas e velhas masculinidades



Ainda com maior radicalismo do que em Portugal, a política antirreligiosa e o desperdício do governo socialista em Espanha, chegou ao cúmulo de, após ter perdido as eleições de 20-11-2011, subsidiar a realização de um curso de «novas masculinidades»...

O Governo Zapatero promoveu uma política de divisão da Espanha, não apenas em termos das autonomias, mas principalmente em termos políticos e sociais, restaurando o fosso das «dos Españas», procurando uma desforra da guerra civil, que a própria esquerda revolucionária provocou e perdeu. Apesar dos oito anos de política antirreligiosa, no poder executivo e judicial (veja-se o exemplo de Baltasar Gárzon), os socialistas não ficaram satisfeitos, como se percebe do discurso radical de Carme Chacón, no Congresso do PSOE, em 4-2-2012, que, por uma unha vermelha, não venceu as eleições internas de sucessão a José Luis Rodríguez Zapatero. Vai ser muito difícil realizar a reconciliação social.


* Imagem editada daqui.

Austeridade na televisão do Estado... espanhol

O Governo espanhol ordenou a poupança de 205 milhões de euros na RTVE, segundo conta o Periodista Digital, de 9-2-2012 (dos 550 milhões de euros de 2011 o orçamento para 2012 desce para 345 milhões de euros). Em consequência foram reduzidos em 25% os salários das estrelas da televisão e efetuados cortes em colaboradores, estreitada em 10% a estrutura dirigente, eliminação de carros oficiais, diminuição dos gastos com refeições de trabalho, etc.

E a Espanha aqui tão perto... Já imaginaram a redução de salários e de mordomias, eliminação de carros oficiais e a dispensa de motoristas (só para o nível de ministro e secretário de Estado), o não pagamento de refeições fora, a ser também aplicada em Portugal aos cargos dirigentes do Estado e dos organismos dependentes?...


* Imagem picada daqui.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Vozes de zorros

Porque é que o Partido Socialista, o mais repressor das liberdades e garantias dos cidadãos desde a estabilização democrática de 1976, culminando no êxtase autoritário do consulado socratino, está agora, pelas vozes do Prof. Carlos Zorrinho, do Dr. Alberto Martins e do Dr. Ricardo Rodrigues, preocupado com a criminalização dos ricos ilicitamente afortunados?!... António José Seguro não risca...

E como é que hoje, 8-2-2012, o líder parlamentar socialista, o Prof. Carlos Zorinho, ousa, em jeito de ameaça, tentar mandar no Presidente da República ao dizer: «Não nos passa pela cabeça que o Presidente da república não envie o diploma para Tribunal Constitucional»?... Um desrespeito institucional desses só merece uma resposta, como, aliás, é previsível que tenha uma lei aprovada na Assembleia da República, com o consenso de todos os partidos menos por um (o PS): a sua promulgação rápida...


* Imagem picada daqui.

Venezuela "Judenrein"...

Recomendo a leitura de «Venezuela 'Judenrein'?», de Mario Noya, no Libertad Digital, de 6-2-2012. A deriva antissionista de um grande setor da esquerda mundial é um dos fenómenos mais incómodos da política internacional. Já Chávez beneficia da indignação seletiva da esquerda em geral e, portanto, no pasa nada...