sexta-feira, 22 de julho de 2011

A galinha gorda e o regime

O resultado do Conselho Europeu extraordinário e, ao mesmo tempo, cimeira da Zona Euro, que terminou ontem, 21-7-2011, começa agora a ser esventrado para ler as suas entranhas. Como ajuda pode ler-se a análise de Ambrose Evans-Pritchard, no Telegraph, de ontem à noite, «Europe steps up to the plate». Como alguém disse, o euro parecia uma galinha de cabeça decepada a correr para um destino curto e inevitável. Agora, foi-lhe transplantada a cabeça: esperamos para ver se o enxerto funciona neste corpo ainda obeso e como se fornece ração de... subsistência. A galinha gorda só sobrevive se renovar o regime e esforçar-se.

Nas principais medidas desta cimeira destaco:
  1. «Bancarrota técnica» parcial da Grécia (o tal voluntarismo à força dos credores para prolongamento dos empréstimos e redução da dívida...).
  2. Uma espécie de Plano Marshall para a recuperação da economia da Grécia
  3. Antecipação de fundos estruturais para a recuperação da economia dos países em dificuldade.
  4. Criação de um Fundo Monetário Europeu (a partir do Fundo Europeu de Estabilização Financeira - FEEF), que é entendido por alguns como primeiro passo para um Tesouro federal comum.
  5. A redução das taxas de juro para 3,5% (até 2014) e 4,5% (depois de 2014) e prolongamento do prazo de pagamento (no caso da Grécia, de 7,5 anos para 15, e podendo chegar a 30 anos com período de carência de 10 anos) dos empréstimos aos países mais aflitos (Grécia, Irlanda e Portugal) - não é ainda claro até quantos anos se prolonga o prazo de pagamento do empréstimo a Portugal e 4,5% serão muito difíceis de pagar numa economia estagnada.
  6. A possibilidade de intervenção maciça preventiva do Fundo nos mercados secundários para controlar a subida especulativa da taxa de juro nos países financeira e economicamente mais débeis.
  7. Tecto de 3% no défice orçamental face ao Produto Interno Bruto (PIB) desde 2013 (pelo menos).
  8. Disciplina orçamental mais firme.
  9. Empréstimos indirectos, através dos governos, aos bancos em dificuldades.
Só não se disse quem paga, e como se paga, este pacote financeiro e económico de resistência da Zona Euro e da própria União Europeia. Fica a incógnita sobre a aceitação pelo eleitorado dos países do norte da Europa (nomeadamente, Alemanha, Holanda e Finlândia ) deste financiamento e deste risco para o euro e para a inflação. Embora exista a vantagem de baixar a taxa de câmbio do euro que tem estado anormalmente alta, devido à política norte-americana de depreciação cambial para aumentar as exportações e reduzir importações.

O saldo financeiro e económico para Portugal deste Conselho histórico, no qual o nosso País aproveitou a boleia grega, é o seguinte:
  1. Maior disciplina orçamental (implicando a renegociação mais dura das parcerias público-privadas socratinas) - maior pressão para o equilíbrio orçamental no curto-prazo, no qual vimos insistindo.
  2. Uma folga na taxa de juro e na maturidade do empréstimo europeu. No mercado secundário, a taxa de juro das obrigações do Estado português a três anos desceu, nesta manhã de 22-7-2011, aos 15,53% (tinha subido acima de 21% no dia 18-7-2011) e a taxa a dez anos desceu aos 11%.
  3. Antecipação dos fundos estruturais.
  4. Maior intervenção do Banco Central Europeu (BCE) nos mercados secundários para controlar as taxas de juro (mas teremos de ir mais cedo financiar-nos aos mercados)
  5. Maior financiamento para os bancos com problemas de solvência.
  6. E, no horizonte, a expectativa de também merecer um Plano Marshall para a recuperação da economia nacional, mais pródigo do que o da Comissão Europeia/BCE/FMI.

Uma condição implícita parece ser o abafamento do «desvio colossal» (Declaração atribuída a Passos Coelho, no Conselho Nacional do PSD, em 12-7-2011) no défice deixado pelo socratismo. Corrigiu o primeiro-ministro Passos Coelho, em 21-7-2011, em Bruxelas:
«Não há nenhum buraco colossal nas contas públicas. Creio que todos aqueles que seguem a política em Lisboa já o perceberam nesta altura. Houve uma utilização abusiva de uma alusão, que eu fiz, a um esforço colossal que o Estado vai precisar de fazer, em praticamente meio ano, para poder acomodar um desvio de despesa de quase mil milhões de euros.»
Este abafamento do buraco orçamental do socratismo constitui um problema político muito sério, porque PSD e CDS podem receber o mesmo destino do que os gregos da Nova Democracia que também foram forçados a abafar o défice camuflado de onze anos de Governo do Pasok e depois foram engolidos nas eleições de Outubro de 2009. Durante os próximos anos, e depois nas eleições, ouviremos o PS gabar-se de que o socratismo não deixou nenhum buraco nas contas do Estado, sem que o PSD e o CDS o possam desmentir, porque o afirmaram expressa e peremptoriamente. Isto tem implicações políticas imediatas, que tratarei depois, à parte.

O Governo ganhou uma folga da União Europeia e, espero, fôlego para proceder às reformas estruturais no Estado e na economia. O povo aceitará a austeridade desde que veja rigor no Estado e preparação da recuperação económica e social.

2 comentários:

Mani Pulite disse...

A REALIDADE DO QUE SERÁ O PORTUGAL TROITSKIZADO JÁ SE TORNA CLARA.DE FACTO, DEBAIXO DA APARÊNCIA DE UM GOVERNO PSD-CDS E DA NÃO EXISTÊNCIA DE UM BLOCO CENTRAL, O QUE EXISTE É UM GOVERNO TRILATERAL PSD-PS-CDS QUE IRÁ DISTRIBUIR ENTRE SI A CARNE DA GALINHA E OS OVOS.PARA OS PARTIDOS TERÁ DE HAVER MAIS CARNE E OVOS PORQUE TRÊS À MESA EXIGEM MAIS DO QUE UM OU DOIS.PARA QUE TUDO CORRA BEM O FANTASMA DA "EUROPA" DE JEAN MONNET OU JACQUES DELORS ESTARÁ PRONTO PARA APOIAR A UNIÃO NACIONAL TÃO CARA AO CHEFE SILVA CUJO PROJECTO ESTRATÉGICO É ESSE DESDE QUE FOI ELEITO ATÉ TERMINAR O SEU SEGUNDO MANDATO.REFORMAS,RESPONSABILIZAÇÃO,ÉTICA,LIMPEZA,CUMPRIMENTO DE PROMESSAS TUDO ISSO VAI SER ENTERRADO NUM BURACO TÃO FUNDO COMO O DESVIO COLOSSAL.PARA OS TUGAS ARRUINADOS RESTA PAGAR A FARTA ALIMENTAÇÃO DA GALINHA GORDA E ROEREM-LHE OS OSSOS NOS DIAS DE FESTA.SE REFILAREM LEVAM LOGO COM O CASSE-TÊTE DO "INTERESSE NACIONAL" À LA SAUCE BOLIQUEIME-MASSAMÁ.

Anónimo disse...

Senhor Professor

Sobre ISTO

http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=1923296

é que eu gostaria de ler COMENTÁRIOS seus.

O resto é "alta política" da gatunagem conhecida.