segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Reencontro



Mais cedo, que mais tarde é tarde, voltamos. Voltamos a nós. Voltamo-nos. Para dentro com saudades de fora. Voltamos a pele para a carne viva que nos renova e reúne. Voltamos. A um desígnio que nos conjura. A um destino onde fomos - e somos - felizes. Porque a felicidade não está no repouso do que se atinge, mas na ação da procura. Na esperança e na persistência. Voltamos. Portanto.

Estive por terras de Bragança, na apresentação do livro do meu amigo Padre Fernando Calado Rodrigues, «O Futuro da Igreja», editado pelo Clube do Autor. Padre Fernando Calado Rodrigues também é autor do blogue Igreja e Mundo. Um livro sobre estes tempos líquidos, composto de crónicas publicadas no Correio da Manhã, organizadas em capítulos e entretanto desenvolvidas. Um livro heterodoxo, alumbrado pela figura do Papa Francisco que foi descrito, como notou o padre Fernando Calado, pelo cardeal alemão Walter Kasper como um «conservador inteligente» (ver também, em abono dessa tese desmistificadora do dilúvio, o artigo «The Pope's true agenda», na First Things, de 1-12-2014). Um livro muito bem escrito e de leitura fácil - porque o autor tem essa qualidade rara de escrever em linguagem simplificada, e modo sintético, sobre questões complexas -, onde se abordam, sem receio da norma de aplicação doutrinária nem do ateísmo dominante, problemas concretos. Problemas, cujas soluções alternativas, como as propostas pelo autor em determinados assuntos, podem ser criticadas, como qualquer exercício de reflexão, mas que têm de ser respondidos por uma Igreja que está no mundo e não fora dele. É no debate, concordando ou discordando, aqui e ali, da opinião manifesta, mesmo que por um amigo, como o padre Fernando, que esclarecemos, que discernimos, que nos encontramos.

Uma viagem em tempos de confronto e de conceção. De Nossa Senhora da Conceição, que hoje celebramos, como padroeira de Portugal. E de conceção - esta «conceção» em vez de «concepção»!... - do tempo que nos espera. Um tempo que é sempre novo, ainda que eternamente retornemos à origem. Um tempo que toma novas qualidades e onde o exercício, sujeito à tensão íntima, à pressão dos raios e à força centrífuga, é o de nos mantermos no mesmo plano como eixo de uma roda em revolução, conforme referia um professor meu, de um trecho de Charles Morgan.

É nas fronteiras que Portugal é mais Portugal. Mais profundo do que na promíscua babilónia, mesmo que esta seja a cabeça, choca e chocha, de uma Pátria em saldo. Uma Pátria, agora em sobressalto judicial e cívico que pode criar as condições da mudança, mas que carece da união dos patriotas para a consolidar. Engana-se quem não conta as favas.

Na igreja de Gimonde, o cântico das mulheres rugosas toma o tom áspero de um lamento imprecativo, um brado metálico que reclama a ajuda divina para a dureza da vida, ao estilo rude das lavradoras de Graça Morais. Por aqui, mesmo com uma luz límpida de uma paiusa do outono triste, os campos ásperos, de pedras brutais, de árvores nuas e de lameiros verdes que parecem à distância, campos de golfe burgueses, despovoam-se de jovens, perdem algumas culturas, como o lúpulo, devido à concorrência chinesa, mas há sinais interessantes de recuperação. O Politécnico de Bragança, numa transformação do funcionamento habitual, cerrado e narcísico, da academia portuguesa, criou cursos em inglês, e atrai, com um programa ativo de promoção e visitas, anualmente cerca de 1.200 estudantes estrangeiros. Avança o projeto do parque de ciência e tecnologia (Brigantia EcoPark), os restaurantes regionais crescem à volta da cidade e sucedem e dois competentes e dinâmicos jovens locais tomaram de exploração a Pousada de São Bartolomeu, ao grupo Pestana, com evidente melhoria do serviço. Notam-se agora as casas mais arranjadas e cuidadas e menos imóveis à venda do que no centro do País. Mas para quebrar o isolamento, e apesar das vias rápidas, é preciso retomar a disponibilidade de voos para Lisboa (que o promissor bispo D. José Cordeiro reivindicou na apresentação do livro), pois de carro é um esticão bastante grande e os cidadãos do Nordeste não podem ser tratados pior do que os de Lisboa ou do Porto.

A viagem, qualquer uma, mas em especial aquela que nos leva às origens, culturais de resistência civilizacional de uma sociedade tornada fluida e gelatinosa pela corrupção das elites e o amolecimento relativista, funciona como retiro espiritual. Na terra, nas pedras, nas obras e nas gentes, sentimos a comunhão humana num destino único que temos de resgatar. Somos devedores desse sentimento antigo lusitano, rijo e firme, e devemo-lo integrar, humildes, na gesta moderna do Portugal profundo. Volto de longe, do lado de lá das serras - e se Deus quiser, a mim.

A.B.C.. Janela transmontana. Bragança. Dezembro de 2014.


14 comentários:

floribundus disse...

em 2005 conheci o Doutor Cordeiro em Roma como Reitor do Pontifício Colégio Português

tenho dele óptima impressão

a Igreja é intemporal não pode seguir modas, como alguns pretendem

sem ser crente espero muito do actual Papa

Anónimo disse...

Se o autor do livro é seu amigo e lhe merece tanto entusiasmo, está dado o lamiré para não comprar. É tudo da mesma seita venenosa.

Anónimo disse...

Prof. Caldeira,

Que bom que é, ser livre, poder pensar livre e sobretudo ter cabeça para pensar. O comentador anterior é um acorrentado qualquer. Coitado.

Anónimo disse...

Salgado confessa-se surpreendido com Carlos Costa. "Bastava que ele tivesse feito um sinal para eu sair"

Anónimo disse...

Um anjo, este Salgado. Aproveitaram-se da sua inocência e ingenuidade.

Anónimo disse...

Engraçado Portugal, Sócrates na cadeia, Salgado a brincar aos deputados. Há 3 anos, eram os donos disto tudo. Portugal acabou, pois está preso a estrume. Estrume nauseabundo, na política, nas empresas, no Estado.

DDT-DOCE DISTO TUDO disse...

Afinal não é um Salgado...é uma Doce...

Anónimo disse...

http://www.jornaldenegocios.pt/opiniao/colunistas/manuel_falcao/detalhe/2014_12_05_a_esquina_do_rio.html

José Sócrates foi medicado, no estabelecimento prisional de Évora, para regular a tensão arterial, que estava elevada.

Anónimo disse...

Espero que a Octópode....pharma lhe faça um desconto nos medicamentos.

Anónimo disse...

http://observador.pt/2014/12/09/socrates-manuel-alegre-visita-ex-primeiro-ministro-na-prisao-de-evora/

Um traidor visitou um gatuno.
Que raio de notícia.
Já as declarações do transgender Ana Gomes têm água no bico.
Afirma que se o Vigarista for vigarista, deve receber um castigo exemplar. Mas, se estiver inocente, o próximo governo tem que blindar os políticos à lei.
Como ela prevê e as sondagens apoiam isso, que o partido corrupto vença as próximas eleições, pode traduzir-se o discurso no seguinte:
Vamos formar governo em breve, travaremos o processo com uma tonelada de Pintos Monteiros e Cândidas e depois faremos uma lei à medida para que nunca mais um político corrupto possa ser apanhado com a boca na botija!

Anónimo disse...

«Queremos que ninguém fique impune por fraude ou evasão fiscal»
Alberto Martins, ministro socretino
http://www.tvi24.iol.pt/portugal/ps/governo-prepara-novas-medidas-de-combate-a-corrupcao

Ahahaha!
Estava convencido da impunidade.

osátiro disse...

Creio que o Papa Francisco, se veio trazer algum ar fresco à ICAR, começou a meter-se em problemas desnecessários...e mostrar falta de coragem apostólica.
temos de ser frios e analisar com serenidade os factos.
e não dizer que tudo é bem feito só porque Sua Santidade é simples, alegre e....tem boa imprensa.
só alguns exemplos:
1- Que interesse tem para a ICAR em crescimento/sofrimento (ÁSIA, por ex...) o problema gay/lesbos??!!
Onde está tanta relevância ou tanta dúvida sobre a REAL natureza Humana nos Evangelhos??!!
2- O silêncio sobre o genocídio dos ortodoxos arménios pelos Otomanos islâmicos na recente visita à Turquia é no mínimo uma supresa desagradável.
Se há coragem para denunciar a Máfia...e a pedofilia...porquê esquecer essa matança, ainda para mais trantando o patriarca Bartolomeu como "irmão"?
3- O despedimento/saneamento do Cardeal R. Burke!
Porquê? Porque tem a coragem de defender a natureza sagrada do casamento entre homem e mulher, tal como SEMPRE foi defendido pela ICAR e na Bíblia?
se fosse Bento XVI teríamos um coro mediático contra uma decisão dessas.
Mas a ICAR não pode ser governada ao sabor dos media, principalmente porque os media dominantes nada ou mto pouco têm de CRISTÃO.
O saneamento do Cardeal Burke foi um ato autoritário.....tenhamos coragem de o dizer....e creio que inédito nos últimos papados.
4- A principal preocupação da ICAR e do Papa DEVE SER o sofrimento incomensurável dos Cristãos no Médio Oriente, China, Coreia do Norte , Vietname, Cuba, etc..etc.. em geral em TODOS os países islâmicos.
Ao lado disso, a discussão sobre os gays num SÍNODO (!!) DOS BISPOS da ICAR.....parece ..peixeirada.

Anónimo disse...

Ouvir, meditar, divulgar:

http://www.dailymotion.com/video/x2b6cva_eric-zemmour-le-pape-francois-va-a-strasbourg-et-ignore-la-cathedrale_news

Zemmour é que tem razão.

Anónimo disse...

http://www.dailymotion.com/video/x2b6cva_eric-zemmour-le-pape-francois-va-a-strasbourg-et-ignore-la-cathedrale_news


Um papa de avental??????