quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Os grandes, os pequenos e o Estado

As explicações de anteontem, 19-1-2008, do Governador do Banco de Portugal, na Assembleia da República, sobre a negligência na supervisão bancária e a intervenção directa no favorecimento da tomada de poder da clique socratina de Santos Ferreira e Vara na nova Emaudio no BCP, nem merecem a extensão de um comentário detalhado de tão patéticas que foram. Constâncio já era. Pode durar no cargo principesco - que até se chama "Governador" como se de vice-rei de uma colónia se tratasse... -, mas a partir de agora é um fantasma sem poder, nem qualquer consequência, um refém afectado pelo síndroma de Estocolmo, submisso ao colérico primeiro-ministro.

Está, portanto, enterrado esse caso e coitados dos pequenos accionistas e clientes da nova Emaudio do BCP: os grandes cobrarão ao assobiado José Sócrates a estratégia de saída - deles e dele.

O negócio bancário é um negócio de confiança. Sem confiança, não há investimento, nem depósito, nem entrega de garantias para empréstimos. Ora, a tomada de poder da clique socratina implicou a denúncia dos podres do BCP, necessária para destronar a anterior direcção, abalando o seu prestígio. Portanto, não adianta à administração comunicar resultados positivos, nem ratios sólidos, nem sequer a promessa de alienações (que, agora, depois de terem sido oficialmente desmentidas, temos a certeza de virem a ser realizadas...) de participações do BCP noutras instituições pelo novo "responsável pelo pelouro do desinvestimento de activos", "rede corporate e empresas", o bancário/banqueiro dr. Armando Vara, porque a confiança não será rapidamente estabelecida. Uma eventual manipulação das cotações através da compra agressiva de acções, mesmo se contar com a mesma vista grossa do Banco de Portugal (BdeP) e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) que aconteceu anteriormente, não será suficiente para os grandes accionistas venderem com ganhos as suas participações qualificadas porque quem lhes pode comprar os grandes lotes, os grandes fundos de investimento e grandes investidores, não se deixam iludir por essas manobras. Além disso, depois da crise do sector do sub-prime (crédito hipotecário de alto risco), a situação internacional está terrível para o negócio bancário e os value investors só entram abaixo do limiar da pechincha.

Se tiver que haver nacionalização, como se prevê em Inglaterra com o banco Northern Rock - se bem que Gordon Brown compense com um gigantesco acordo comercial com a China -, ela será justificada pela exigência prudencial da estabilidade do sistema financeiro... Mas o povo conhece já a verdade. Não chega a suspensão de juros, e a não exigência de garantias adicionais, nos empréstimos concedidos pela clique socratina na Caixa Geral de Depósitos (CGD) que agora tomou conta do BCP com os votos conseguidos com o dinheiro desses créditos. Afastada que está, por enquanto, a fusão com o BPI, por degradação das cotações do BCP e pela independência do banco nortenho face ao Governo de Sócrates, outra possibilidade será a intervenção da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e EDP na Emaudio no BCP, comprando as participações dos accionistas entalados que apoiaram a tomada de poder pelo clique socratina, com mais-valia - em vez do prejuízo que agora sofrem -, depois de um movimento artificial de subida das cotações...

Já o presidente da República tem assistido calado e esquivo a estes desmandos, aparentemente conformado com o saldo da nomeação de Fernando Faria de Oliveira para presidente da CGD, numa partilha do poder do Estado que repugna ao povo.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): Do Portugal Profundo, não tenho qualquer interesse particular no Millennium BCP ou empresas concorrentes.

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