quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Temperança

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O País ferve. Mas é melhor baixar a temperatura política para o lume brando, que coze sem queimar. A precipitação do fogo rápido pode incendiar a casa. Anotemos factos, vejamos uma previsão e ajustemos a táctica.

Os factos:
  1. O Governo vendeu ontem obrigações de dívida pública, no valor de 1,2 mil milhões de euros, em montante inferior às necessidades de financiamento do Estado até ao final do ano de 2010 previamente comunicadas (o que obriga à emissão extraordinária de bilhetes do Tesouro para pagar salários, pensões, subsídios e compromissos urgentes como pagamento de juros...), numa taxa média na parte emitida a dez anos, de 6,8% - presume-se que o Governo fechou a venda quando a taxa subiu acima dos 7% e suspeita-se que tenha sido o grupo Caixa Geral de Depósitos (e os seus fundos de investimento) a tomar (quase) firme uma grande parte da emissão de 10-11-2010
  2. Contrariando o comportamento da taxa nas emissões anteriores, quando o efeito especulativo levava a um pico antes da emissão, seguido de uma ressaca nesse dia e nos seguintes, a taxa de juro da dívida pública a dez anos cruzou ontem, 10-11-2010, o limiar psicológico dos 7% e seguiu disparada por aí acima (esta tarde de 11-11-2010, estava em 7,25%...), não se prevendo que volte para baixo dos 7%. O próximo limiar psicológico será os 8%.

Uma previsão:
  1. O apelo ao FMI, após confissão de bancarrota se não houver ajuda extraordinária, parece inevitável (mesmo que seja disfarçado com a oferta da União Europeia e renitência do Governo), para tentar obter empréstimos a taxa mais suportável, como a do fundo da União Europeia/FMI. Provavelmente, o FMI já cá está - chega sempre de véspera e não só quando é anunciada a chegada oficial da missão - , nos preparativos logísticos e burocráticos da intervenção inevitável. Coisa que os jornalistas verão, se cobrirem o(s) palácio(s) e os hotéis. A declaração do secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, João Tiago Silveira, nesta tarde de 11-11-2010, de que «não está previsto pelo Governo pedir a intervenção do FMI» é apenas a confirmação dessa súplica...
  2. O tandem FMI/União Europeia imporá condições draconianas de corte na despesa, para lá do PEC IV da negociação parlamentar, de 2.ª feira, dia 15-11-2010, dos cortes adicionais na despesa para introdução no orçamento a discutir na especialidade. Desta vez não serão os funcionários públicos os principais afectados, caindo também maior perda de rendimento nos pensionistas e empregados do sector privado, bem como nos subsídios. Compreende-se o desejo de travar a descida no inferno da dívida e do crescimento dos juros, mas a perda de soberania nunca é vantajosa: mais valia que se tivesse feito em tempo o trabalho de casa.
A táctica (que se insere na estratégia da IV República):
  1. Não pode ser consentido um Governo de Salvação Nacional que apenas seria de salvação do Partido Socialista e de procrastinação do ressurgimento do País. Nem eu acredito que o Prof. Cavaco Silva se precipitasse ou deixasse envolver, e comprometer, numa manobra palaciana de reciclagem do sistema socialista corrupto, demitindo o primeiro-ministro por o substituir por qualquer outro socialista - como seria hipoteticamente qualquer tarado da «chuva dourada» ou uma opção meta-sistémica pigmeia de alcance e referida a negócios nebulosos com o Estado que teriam, depois, de ser investigados minuciosamente. O dever patriótico é a recuperação do País, não é a salvação do Partido Socialista;
  2. O primeiro-ministro Sócrates terá de executar agora a redução de despesa que os credores impõem a Portugal: comeu a carne, roa os ossos. No fim de realizar esse trabalho, será, então, demitido e julgado.
  3. O PSD não deve participar no aventureirismo de governo provisório algum, nem em qualquer novo pacto que o responsabilize pela austeridade de que os socialistas negligentes são culpados. Depois da eleição presidencial, transcorrido o prazo legal, será, então apresentada uma moção de censura, aprovada também pelo Bloco e pelo PC interessados nos despojos eleitorais do PS. Será uma ocasião esplêndida de limpara a III e fundar a IV República portuguesa.
Aqui, e por onde e com quem possa, combaterei qualquer tentativa de reciclagem do sistema socialista corrupto, com o mesmo vigor que tenho usado no enfrentamento do socratismo.

E para os espíritos em desespero com a situação e o futuro do País, deixo uma palavra de confiança que esta manhã reli, numa pagela de Santa Teresa de Ávila, que minha mãe há tempos me deu:
«Nada te perturbe.
Nada te espante.
Tudo passa,
Deus não muda.
A paciência tudo alcança.»


Actualização: este poste foi emendado às 2:42 de 14-11-2010. Um erro inadamissível, pois a Teresa de Jesus da pagela não era a de Lisieux (Santa Teresinha do Menino Jesus), mas a de Ávila, como confirmei... agora. Grato ao leitor que me preveniu do erro.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A tua vitória?

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Este ano não apareceu ninguém cá em casa a reclamar o Pão por Deus. Creio que foi o primeiro ano em que tal sucedeu e suponho que nunca nas últimas décadas houve tanta necessidade. Em vez da inocência e bondade dos santos do impronunciável Deus, as televisões destacam as bruxas do Halloween, uma tradição alienígena pagã, tornada politicamente correcta, com trevas, susto e sangue. A TVI abriu o telejornal do almoço com um desastre de viação algures no País, num tempo em que a morte, além do diabolismo desta brincadeira artificial, apenas interessa se for próxima - ou politicamente correcta - e as tragédias dos outros homens se desprezam por não convirem ao egoísmo da incerteza. Numa tendência paradoxal face ao egocentrismo e epicurismo dominante, a política torna-se totalitária, impondo negligência moral e resignação aos homens como condição do apoio paternal do Estado, mesmo quando o socialismo crónico (croonico e crooquico) faz do Estado português um moribundo (6,18% de taxa de juro, nesta segunda, 1-11-2010, após o prometido salvo-conduto do acordo orçamental, de 29-10-2010!). E nós, os vigiados da polícia política do Estado socialista, vamos oferecendo o bom combate, e, excepcionalmente, durando.

Porém, hoje, é Dia-de-Todos-Os-Santos, e mais destes mortos, ontem, 31-10-2010, na Igreja de Nossa Senhora da Anunciação, em Bagdad, no Iraque, pelo terror do Islão totalitário e bélico. Islão radical, castigador de quem pensa diversamente e opressor das mulheres, mas com forte apoio do chamado progressismo da esquerda anti-sionista (por exemplo, o Bloco de Esquerda), como é o caso do Irão (que também recebe o apoio do corrupto PT brasileiro da nova presidente lulista brasileira Dilma Rousseff, eleita no domingo, 31-10-2010) - ou noutra ex-religião, a China (por exemplo, o PS português face à violação de direitos humanos). Contra a liberdade dos homens, quer consolidar-se o totalitarismo do Estado e, quando o povo começa a reagir à corrupção e ao abuso, abre-se o acantonamento do Estado, onde se acoitam os ociosos, também aos aflitos desempregados e endividados, cercam-se as forças adversárias com a parafernália tecnológica e negra, e soltam-se os cães de guerra da fusilaria dos media e da (in)justiça obediente, com a barragem de fogo do pensamento único. Uma guerra sem quartel, nem vergonha, que é reservada ao inimigo interno, e a que é poupado o que se supunha ser o inimigo externo e, afinal, é um parceiro, numa trágica política de apaziguamento na linha da máxima (referida a Elton John?) da rendição e do recuo de que «é melhor viver de joelhos do que morrer de pé».

Lembrava-me um amigo, quando escrevi aqui, em 20-10-2010, «Quando o inimigo não se conforma com nada menos do que a nossa pele, não há outro resposta possível senão combater», que a pele pode não ser apenas o sentido figurado da vida, indicando-me o exemplo do martírio de Marcantonio Bragadin, capitão-general de Famagusta e provedor-geral do Reino de Chipre, que foi esfolado vivo pelos turcos de Lala Cara Mustafá Paxá, em Agosto de 1571. Retardado o socorro do reduto da Sereníssima República de Veneza em Chipre às forças do sultão Selim II - 6 mil venezianos contra 200 mil turcos -, enquanto se negociava e organizava a armada da Santa Liga, que sairia vitoriosa dos turcos na batalha naval de Lepanto em 7 de Outubro de 1571, Famagusta capitulava. Todavia, vendendo cara a derrota, como Bragadin prometera a Mustafá Pachá quando rejeitou render-se, respondendo ao comandante turco com a seguinte carta:
«Senhor da Caramania
Vi a sua carta. Também recebi a cabeça do senhor lugar-tenente de Nicosia [Niccolò Dandolo] e digo-lhe aqui que ainda que tenha tomado tão facilmente a cidade de Nicosia, terá de comprar com o seu próprio sangue esta cidade, que com a ajuda de Deus lhe dará tanto que fazer que se arrependerá doravante ter aqui acampado.
De Famagusta, 10 de Setembro.»

(Tradução minha da tradução em inglês, publicada em
SETTON, Kenneth M., The Papacy and the Levant (1204-1571), Vol. IV - The sixteenth century from Julius III to Pius V, Philadelphia, The American Philosophical Society, 1984, p. 996)

Em 31 de Julho de 1571, após onze meses de cerco e bombardeamento pela artilharia turca, Bragadin, com munições para apenas mais um dia de combate, rendeu-se finalmente, após conselho de notáveis e mediante promessa de Mustafá Paxá de poupar as vidas dos seiscentos militares e civis que restavam na fortaleza. Uma promessa que o general turco não cumpriu. Bragadin foi imediatamente decepado das orelhas e, após dias de tortura, durante a qual recusou converter-se ao Islamismo, foi esfolado vivo, sendo a sua pele, recheada de palha e cosida, enviada para Constantinopla como troféu ao sultão. Recuperada em 1680, a pele, com o perfume da alma dentro, repousa agora num mausoléu incrustrado na parede da nave direita da Basilica di San Zanipolo (Basílica de São João e São Paulo) em Veneza.

Na peça «The Life and Death of Julies Caesar», Shakespeare, na aurora desse século XVII, sintetizava a vantagem da bravura sobre a tragédia da cobardia: «Cowards die many times before their deaths; The valiant never taste of death but once». São Paulo (I Coríntios 15:55) já havia firmado essa glória na Bíblia: «Ó morte, onde está agora a tua vitória?».


Actualização: este poste foi emendado às 13:38 de 2-11-2010.