quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Referendo da coadoção enviado para o Tribunal Constitucional: a traição de Cavaco Silva ao seu eleitorado

(Atualizado)

O pedido, em 28-1-2014, de fiscalização preventiva pelo Presidente da República Cavaco Silva da constitucionalidade e da legalidade da proposta de referendo sobre a possibilidade de coadoção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo e sobre a possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, casados ou unidos de facto, aprovada pela Resolução n.º 6-A/2014 da Assembleia da República, constitui uma traição ao seu eleitorado.

Juízos de oportunidade, custos de referendo, impossibilidade de referendar direitos que o povo não consagrou, são tudo desculpas de interesse.

Cavaco Silva trai quem o elegeu sem ganhar o apoio do setor relativista que defende a coadoção e a adoção de crianças por casais homossexuais. Ziguezagueando por bissetrizes móveis de ângulo cínico, fica mal com as duas linhas: a esquerda não esquece a sua história e a sua filiação ideológica; e a direita agonia-se com a promiscuidade que cultivou com o socratismo e agora com o relativismo socialista.


Pós-Texto (19:22 de 30-1-2014): Erros e traições
Chamou-me um leitor à atenção para o teor do artigo 26.º da Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril (Regime jurídico do referendo):
«Nos oito dias subsequentes à publicação da resolução da Assembleia da República ou do Conselho de Ministros, o Presidente da República submete ao Tribunal Constitucional a proposta de referendo, para efeitos de fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade, incluindo a apreciação dos requisitos relativos ao respectivo universo eleitoral.»
Na verdade, a própria Constituição no número 8 do art.º 115.º estabelece que

 «O Presidente da República submete a fiscalização preventiva obrigatória da constitucionalidade e da legalidade as propostas de referendo que lhe tenham sido remetidas pela Assembleia da República ou pelo Governo».

Assim sendo, importa reconhecer que errei: o Presidente tinha obrigatoriamente de pedir a fiscalização preventiva da proposta de referendo ao Tribunal Constitucional (TC). E, se o TC verificar que a proposta de referendo é inconstitucional ou ilegal, então, nos termos do art.º 28.º número 1 da Lei n.º 15-A/98, o Presidente é obrigado a devolver a proposta à Assembleia da República para reapreciuação e eventual reformulação da proposta (número 2 do art.º 28.º). É devida, portanto, uma desculpa ao visado porque Cavaco Silva tinha obrigatoriamente de enviar a proposta para o Tribunal Constitucional.

Outra coisa, além deste procedimento legal obrigatório, é a opinião do Presidente da Repúbica Cavaco Silva sobre o referendo da coadoção e adoção. E essa foi filtrada para o Expresso, de 18-1-2014: «Cavaco Silva contra referendo à coadoção». Uma opinião que não foi desmentida depois - e nem vejo como o Expresso se atreveria a trazer essa notícia peremptória sem que a Presidência da República lha comunicasse... expressamente.

Nos termos do número 10 do art. 115.º da Constituição e dos art.os 34.º e 36.º da Lei n.º 15-A/98, mesmo após o pedido de fiscalização, o Presidente pode recusar a realização do referendo, inviabilizando a sua convocação na mesma sessão legislativa (o que, aliás, já poderia fazer antes da consulta ao TC).

Mas se o Presidente faz constar publicamente que é contra a realização do referendo, conforme transparece da referida notícia do Expresso:
«Nada é menos certo do que uma apreciação positiva do tema por parte de Belém. Cavaco Silva é um homem conservador em questões de costumes, como demonstrou ao longo do seu primeiro mandato, e está hoje totalmente virado para as questões relativas à situação económica e financeira do país.»


Dir-se-á que esta notícia do Expresso é contraditória, pois põe Cavaco na pele de um «conservador em termos de costumes» que não se opõe à reengenharia liberal/socialista de codoação e adoção de crianças por casais homossexuais!... Ou que justifica a sua oposição ao referendo dos novos costumes aprovados pela Assembleia com a «situação económica e financeira do país»!... Como se o custo, ou a atenção dessa circunstância económica e financeira não pudesse consentir a realização de um referendo...

Mas o que importa realçar é que o condicionamento objetivo do Tribunal Constitucional, que faz através da filtração prévia da sua oposição ao referendo, constitui realmente uma traição ao seu eleitorado.

Portanto, Cavaco Silva não trai o eleitorado conservador pelo trâmite, aliás obrigatório: trai o seu eleitorado por fazer constar a sua oposição a um referendo que poderia impedir a reengenharia da coadoção e adoção de crianças por casais homossexuais e manter o direito de qualquer criança ter um pai e uma mãe. E, o que é mais censurável, fá-lo por cálculo político: para se aconchegar no regaço da esquerda e obter melhor aprovação de um setor que o abomina e despreza.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A praxe académica: abuso e equilíbrio

«Porque esta casa é uma casa... de trabalho!» - berrava, com ar grave, um professor sessentão, de cabelo grisalho e bigode farto, de casaco e gravata, ladeado de outros docentes, sentados ao longo da comprida secretária da Sala Magna do velho ISCSP, no palácio Burnay, em Lisboa. A sala cheia de três centenas de alunos, quase vinha abaixo de tanto riso, apupos, assobios, bocas e pateadas, de veteranos. A aula era ainda despudoradamente interrompida pela entrada na cena de um contínuo cabeludo e de bata, o senhor Martins (o Jojó...). Vencido pela barulheira purgatórica, depois da arenga disciplinar, o professor abriu um período de perguntas e respostas. Um aluno queixou-se da avaliação do ano transato e perguntou-lhe pela possibilidade de solicitar revisão de provas, no ano que começava: o professor respondeu-lhe, que não percebia o que era isso de «revisão de provas», e repetiu o seu desconhecimento, mesmo depois de o aluno explicar em que consistia... Aparvalhado, como qualquer caloiro, olhando circunspecto tamanha insurreição, procurava noutros rostos tão incrédulos quanto o meu, um sinal de tranquilidade, um beliscão racional de que não tinha alunado, nesse início do outono de 1983, numa balbúrdia de continuidade do PREC. Mas o delírio continuou por mais uma hora. Até que saíu a corte praxística e, na aula seguinte, já a sério, entrou «o Roboredo» (como era conhecido Fernando Seara), para ministrar Princípios Gerais de Direito e avisar os caloiros da sua fama terrível, discutida - dizia ele -, na Flor da Junqueira e no Indelével do Marquês. Depois do logro anarquista, a normalidade pós-revolucionária.

Foi assim a minha primeira aula no ISCSP e, enquanto aluno, o meu contacto breve com a praxe académica. Em ano intermédio, ainda se intrujaram os caloiros/as [escrevo com «linguagem inclusiva» (sic) em vez de pôr «o género feminino entre parênteses», para não ofender o trotskismo do Público, de Bárbara Reis e Cláudia Azevedo!...] com um pretenso rastreio inicial, num gabinete com radiografias penduradas em caixa de luz e o Heitor, de bata branca nas consultas, mas não participei nessa atividade de socialização. No último ano, na bênção das pastas, não fui de batina, quanto mais capa, entendendo que não fazia sentido pedir roupa emprestada para o cumprimento de uma tradição que efetivamente não tinha havido.

Depois da alma mater, andei por outras. E mesmo na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra não senti, numa pós-graduação que ali cursei, que fizesse parte da tradição. Ainda novo, tinham, todavia, passado por mim as neves de outrora, sem que jamais as tivesse vivido. Coisas desse tempo de cinzas: nem o braseiro da revolução, nem o ferro da tradição.

Aliás, a tradição académica era então censurada como resquício fascista, numa época em que o politicamente correto da academia era o tardotrotskismo do MATA (Movimento AntiTradição Académica) e o experimentalismo radical da Pornex (a primeira feira de pornografia em Portugal), em 1984, no quartel da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

Depois dos tempos acima descritos, vieram os anos 90, em que o traje académico foi recuperado para lá da Universidade de Coimbra e reinventado, num design artificial semelhante ao do SNI sobre o vestuário (com coulottes!...) do folclore português. A praxe restaurada na Universidade de Coimbra foi desvirtuada noutras instituições de ensino superior públicas e depois nas privadas. Em várias das instituições privadas, por dependência financeira dos alunos, a praxe, paradoxalmente, ainda se tornou mais severa, como no caso do Instituto Piaget, em Macedo de Cavaleiros, em 2002-2003 e até nas tunas, como no caso da morte do estudante Diogo Macedo, do pólo de Famalicão da Universidade Lusíada, em 1991. A ordem unida académica, e depois até os exercícios do tipo G.A.M. (nalguns casos, literalmente) substituíu, aqui e ali, o serviço militar obrigatório, entretanto extinto...

Vem esta história, a propósito do caso dos seis estudantes da Universidade Lusófona engolidos pelo mar da praia do Meco, em 15-12-2014, no meio do que consta ter sido um fim de semana de praxe académica de tropa de elite, mais parecida com um ritual de sociedade secreta do tipo Skull and Bones (ou maçonaria). Um caso que não pode ser branqueado, como parece fazer o administrador dessa universidade, Prof. Manuel Damásio, em 28-1-2014, no Primeiro Jornal, da SIC, em 28-1-2014. Os estudantes mortos não voltam à vida, mas é útil, e pedagógico, o apuramento integral dos factos desta história incompleta e mal contada, para que circunstâncias dolorosas, como esta, não se repitam.

Perante a praxe académica, distinguem-se três atitudes: a contestação, a regulação e o alheamento. O alheamento é a política de não ver nem ouvir e concretiza-se numa decisão diretiva de algumas escolas na externalização da praxe: a praxe continua mas fora das instituições e as direções das escolas podem alegar desconhecimento do que se passa. A constestação opõe-se à praxe, por princípio, independentemente da sua forma, pois entende-a como ritual do «fascismo», desde logo o traje. A regulação parte da pedagogia para prevenir abusos, e prevê normas e sanções dos órgãos da própria instituição,  com comunicação às autoridades dos atos de violência e de coação. 

Destas três atitudes perante a praxe académica a que entendo mais válida é a regulação. Não adianta proibir a praxe, toda e qualquer que seja. Importa que a praxe respeite a dignidade humana, que não se admita a violência física, psicológica ou a humilhação, nomeadamente de caráter sexual, sobre os caloiros, que se evitem atos perigosos para a vida, do género de exercícios militares, instruídos por protomilicianos insensatos. Para além de dever ser respeitado, integral e imediatamente, o direito de o aluno se declarar anti-praxe e não participar nas suas atividades, e o direito de se recusar a participar em qualquer ato perigoso ou repulsivo, sem sanção ou perseguição escolar.

Não é preciso alterar o código penal ou criar uma polícia privada das instituições, como nos EUA. Basta a comunicação aos órgãos judiciais e institucionais de qualquer abuso com relevo criminal ou de desrespeito humano. A dignidade humana tem de ser respeitada sempre, pois não é raro que o caloiro se possa sentir constrangido, por vontade de pertença, a fazer algo que sente degradante e insuportável. À parte a resolução dos censuráveis excessos que têm de ser tratados por outra via, a melhor política institucional perante a praxe é a persuasão e o bom senso. Há anos largos, veio um aluno meu ter comigo e disse-me: «Professor, estivemos a refletir na associação de estudantes e achámos que o professor tem razão no que nos disse em aula: vamos acabar com a cena do pudim Danone...».

E, se assim forem prevenidos os abusos, como assim deve ser, apesar do peso na eficácia letiva de algumas instituições - que tem de ser aliviado nas horas das aulas -, os rituais da praxe académica, como o traje, o apadrinhamento, o ensaio vocal, os desfiles, os eventos e as festas, o trabalho organizativo nas associações, as equipas desportivas e os grupos culturais, etc., podem ajudar à integração dos estudantes na escola.


Atualização: este poste foi atualizado às 14:56 e 16:12 de 28-1-2014.


* Imagem da Cabra, da Universidade de Coimbra, picada daqui.


Limitação de responsabilidade (disclaimer):  As entidades referidas nas notícias que comento não são, que eu saiba,arguidas pelo cometimento de qualquer crime, nem suspeitas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade.

domingo, 26 de janeiro de 2014

A rede e o peixe



Um documentário da BBC Four, citado pelo MailOnline de 25-1-2014, traz a público o horror da ditadura socialista do coronel Muamar al-Kadafi, na Líbia: a sua pedofilia sobre meninas e meninos, o sequestro, a tortura, o assassínio, até a conservação de cadáveres dos opositores em frigoríficos...

Os políticos portugueses que, ao longe dos anos, mantiveram um relacionamento próximo com Kadafi vão fingir espanto. Mas, como dizia alguém, eles sabem que nós sabíamos que... eles sabiam muito bem do horror líbio e do seu patrocínio do terrorismo internacional. Porque, muito antes, e de modo mais detalhado do que aparece nas notícias dos jornais, o poder político conhece o horror que esconde do povo. Prioridade aos negócios, que de Estado só têm o qualificativo dos estadistas que os aproveitam.

Está também ainda por fazer a história do apoio líbio aos partidos políticos portugueses, nomeadamente o PS. Veja-se um excerto do livro de Rui Mateus, «Contos de um PS desconhecido», Dom Quixote, 1996, p. 63:
«Mas, Manuel Tito de Morais, nas funções de secretário-geral "interino" ia recebendo alguns donativos e, nesta matéria, "tudo o que vinha à rede era peixe". (...)
(...) Creio que até ao I Congresso, que teria lugar em Dezembro [de 1974], o único contributo significativo recebido pelo Partido Socialista tinha sido angariado no seguimento da visita de Mário Soares a Trípoli, em Novembro de 1974, onde se encontraria com o coronel Kadhafi, tendo, a partir daí, a conta da Associação António Sérgio sido rapidamente transferida para o Nederlandsche Middenstandsbank (Anexo 4) de Hilversum, na Holanda, que, posteriormente, viria a ser titulada por José Neves, também ele fundador do Partido em, Bad Munstereifel. Escrever-lhe-ia [Mário Soares] posteriormente, aproveitando a visita a Trípoli de José Neves e Catanho de Menezes para agradecer e exprimir a sua "admiração pelo interesse e ajuda que (Kadhafy) deu à luta e libertação do Povo Português" assim como para o informar de que o PS estava "de novo em condições de reabrir os nossos contactos com todas as forças que no mundo lutam pela libertação dos povos. Entre essas forças, tanto a Líbia como V. Ex.a jogam um papel fundamental.»
(Realce meu)
O contributo do coronel Kadafi «para a libertação dos povos», mormente do seu, era já então público e notório... E mais se sabia, depois quando José Sócrates, nos seus governos de 2005 a 2011, andou enternecido com o «líder carismático» (sic) líbio, tendo o ex-primeiro-ministro visitado a Líbia «quatro vezes em seis anos» de poder.

Outros políticos tiveram contactos promíscuos com o regime líbio, e aturaram a loucura do coronel. Mas talvez nenhum tenha chegado ao nível do Partido Socialista. Porém, a indignação seletiva da esquerda negligencia sempre as culpas próprias.

E não apenas nos pragáticos socialistas. Também está por estudar a questão tabu do financiamento e acolhimento em campos de treino para instrução de atentados e de colocação de bombas, ao terrorismo da extrema-esquerda portuguesa, às FP-25 de Abril e a alguns dos seus embriões (nomeadamente, um grupo do catolicismo militante do tipo montonero).


Atualização: este poste foi emendado às 14:50 de 28-1-2014.

* Foto picada daqui.

Limitação de responsabilidade (disclaimer): O coronel Muamar Kadafy foi linchado em 20-10-2011, durante a guerra civil na Líbia. As demais entidades referidas nas notícias que comento não, que eu saiba,arguidas pelo cometimento de qualquer crime, nem suspeitas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade, no caso das relações do Partido Socialista ou do Estado português com o ditador líbio.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Referendo sobre coadoção e adoção de crianças por casais homossexual e a primária presidencial da direita

Não interessa ao povo português se o motivo do referendo sobre a coadoção e adoção de crianças por casais homossexuais é a primária mediática do candidato da direita.

É crível que Passos Coelho tenha acordado há muito tempo o apoio a Durão Barroso na eleição presidencial de 2016. É crível que os apoiantes de Marcelo Rebelo de Sousa, como Marques Mendes, queiram, por isso, derrrubar Passos para que o candidato presidencial seja o professor e comentador televisivo. E, para tal, a possibilidade de um referendo que aproxime Passos da direita conservadora é nociva para o objetivo de erosão da sua base de apoio nas eleições próximas.

Porém, não é moralmente admissível o ataque dos apoiantes de Marcelo ao referendo por questão tática. O mesmo motivo invocado no ataque aos adversários. Com a denunciadora marca cínica do juízo de oportunidade. 

Passos é useiro e vezeiro na sedução da direita conservadora para acumular o seu apoio sobre a irregular base ideológica tardo-liberal - veja-se o caso da incumprida promessa, em 25-5-2011, antes das eleições legislativas, de novo referendo sobre o aborto. É difícil que a proposta de referendo sobre a coadoção e adoção de crianças por casais homossexuais se realize: por estar armadilhada, pelo desconforto do Presidente Cavaco que pretende boa vontade da esquerda e por maioria desfavorável no Tribunal Constitucional ciente de que o povo se oporia à coadoção e adoção de crianças por casais homossexuais.

Mas, em qualquer caso, o povo vislumbra na hipótese de referendo sobre a codoção e adoção de crianças por casais homossexuais a oportunidade de travar o delírio da engenharia social relativista. Essa oportunidade tem de ser cuidada e favorecida em vez de destruída.

Para nós, interessam-nos mais as políticas do que as pessoas e os quinhões. Portanto, viva o referendo!


* Imagem picada daqui.

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Manuel Alegre e o direito seletivo à honra: o caso Brandão Ferreira

O tenente-coronel piloto-aviador, na situação de reforma, João José Brandão Ferreira, do blogue O Adamastor, está a ser julgado no 1.º juízo criminal de Lisboa, no Campus da Justiça, por dois crimes de difamação contra Manuel Alegre por, em escritos de meados de 2010, lhe ter imputado «traição à Pátria». A acusação de Manuel Alegre foi aquela; e a contestação do tenente-coronel, defendido pelo advogado Alexandre Lafayette é esta - louve-se a galhardia de Brandão Ferreira que as publicou no seu blogue.

Do Portugal Profundo, não concordo com a defesa que o tenente-coronel Brandão Ferreira faz do regime salazarista e marcelista e concordo com a independência dos territórios colonizados pelos portugueses em África e na Ásia - bem como dos territórios coloniais que ainda persistem no mundo, se tal for da vontade maioritária das respetivas populações (o que não é sempre o caso como se sabe dos territórios ultramarinos dos EUA, da Grã-Bretanha, da França, da Holanda...), bem como com a independência de parcelas dos Estados habitados maioritaria e historicamente por povos originários distintos. Reiterada, uma vez mais, a minha declaração de interesses sobre estes temas, importa dizer que o tenente coronel Brandão Ferreira merece a minha, e nossa, solidariedade neste processo injusto. Injusto não apenas por causa do princípio sagrado da liberdade de expressão, mas principalmente porque as informações e os comentários em que o tenente-coronel  são suportados por base factual e munidos de direito justificativo (seja o da época dos factos imputados, na década de 1960 e princípios dos anos 1970, seja o atual).

Em qualquer caso, e para lá do argumento da traição à Pátria, qualquer cidadão tem direito a afirmar publicamente as suas ideias e a informar o público do que pretenda, sem temor de perseguição judicial. Mais ainda se o fizer sem dolo, ou sem, como se diz no direito norte-americano, «actual malice» («publication of defamatory material "with knowledge that it was false or reckless disregard of whether it was false or not"»). E além disso, se se tratar de um comentário político. Como se defende neste sulco: é nos média (hoje ubíquos e disponíveis) que se contestam as ofensas que nos média se publicam - não nos tribunais. No caso de Alegre, é triste que um poeta recorra ao martelo em vez da pena.

Importa ainda dizer que o contexto dos postes do tenente coronel Brandão Ferreira era o do choque patriótico pela candidatura de Manuel Alegre a Presidente da República, que implica a função de Comandante Supremo das Forças Armadas. Não vejo nos tempos atuais outro país democrático em que um candidato carregado com a saída das Forças Armadas pelos factos que lhe foram apontados e que assume e com o passado de locutor, e diretor, da Rádio Voz da Liberdade (Argel) onde se atacavam verbalmente as tropas portuguesas em campanha na Guerra do Ultramar e se incentivavam os movimentos guerrilheiros que as combatiam, ousasse apresentar-se ao escrutínio para Presidente da República e muito menos conseguisse o resultado que, mesmo assim, obteve em 2006 e 2011. Mas num Portugal de matriz mediática esquerdista tal foi possível. Tratei dessa circunstância no meu poste «O passado triste», de 4-8-2010.

Contudo, importa ainda aduzir o comportamento dúplice de Manuel Alegre sobre o Direito, um curso que deixou incompleto no «terceiro ano» cujo certificado de conclusão, segundo a revista Sábado, de 22-12-2010, pediu, em 1964, já refugiado em Paris, ao seu cunhado que «se ‘arranjassem’ as coisas de modo a que o certificado dissesse ter eu o 3.º ano completo» (o que segundo a revista não havia feito) - isto apesar de, em 2008, o não licenciado ter obtido o doutoramento honoris causa pela Universidade de... Argel (conforme se gabava no seu sítio extinto). É que o mesmo Manuel Alegre que, afetado pelo prurido da reputação alegadamente ferida, se queixa de difamação por um escrito político de um adversário relativamente à sua conduta política, é o mesmo que, sem respeito pelos órgãos judiciais (porque lhe incumbe a denúncia dos factos que considere criminosos e deve respeitar os tribunais enquanto órgãos de promoção da justiça), imputou, segundo o Sol, de 6-1-2011, nessa noite, na RTP, ao Presidente da República Cavaco Silva, os crimes de «tráfico de influências» e de «favorecimento pessoal»!... Como pode esse comportamento ser ignorado pelo poder judicial e até por quem tem a responsabilidade de decidir sobre queixas de difamação, como esta? Não tem esse comportamento de ser salientado em tribunal e referido à delicada honra do político Manuel Alegre? Ou aquilo que serve para si não serve para os outros?...

Transcrevo o que escrevi no meu poste de 28-1-2011:
«O candidato socialista Manuel Alegre imputou ao Prof. Cavaco Silva os crimes de «tráfico de influências» e «favorecimento pessoal» (Sol, 6-1-2011); outro candidato socialista, Defensor de Moura imputou ao Prof. Cavaco Silva os crimes de «negócios ilícitos, favorecimentos» (RR, 28-12-2010), tendo insistido no crime de «favorecimento» (DN, 5-1-2011); e outro candidato, que terá concorrido com o apoio da máquina socialista na recolha de assinaturas e certidões, José Manuel Coelho, fez também insinuações directas de corrupção - a excepção foi o contido e educado Dr. Fernando Nobre. Do que foi esclarecido, as imputações são falsas e não foram apresentadas provas desses sugeridos crimes, nem nas notícias posteriores foi evidenciada a prática de qualquer crime. (...)
Não defendo, na política, o recurso aos tribunais para lavar ofensas de presumida difamação, que na praça pública se devem resolver e o povo, mais esperto do que o julgam, acaba por decidir. Mas o que diria a esquerda mal-pensante, se o Prof. Aníbal Cavaco Silva, Presidente da República, fosse tão implacável  com Manuel Alegre, que lhe imputou os crimes de corrupção acima referidos, e apresentasse queixa judicial contra ele, como Alegre foi, com queixa por difamação (Processo nº 2544/10, 7TDLSB DIAP, Secção 02/04, 23/6/2010), contra o tenente-coronel João José Brandão Ferreira que lhe fez acusações sobre o seu comportamento político?!...»

Esperemos que o direito seja servido em tribunal em vez da corrente política esquerdista (e socialista...). Seria uma pena, dupla, que alguém fosse punido, não por razão de absoluto dolo do que disse ou escreveu e por inexistência absoluta de motivo do que afirma, mas por causa da sua orientação ideológica e da sua interpretação da história de Portugal. Vale dizer que, tenho verificado que, apesar de exceções sistémicas identificadas, existe nos tribunais portugueses uma noção moderna de liberdade de expressão em vez da vergonhosa colaboração promíscua na «bofetada do poder» político.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

G(PS) e bloco-central de interesses

Foi ontem, 22-1-2014, noticiado que a Polícia Judiciária (PJ) estava a fazer «buscas em vários colégios GPS».

A investigação da PJ teria sido aberta após a reportagem da gloriosa jornalista Ana Leal - em processo de despedimento na TVI!... - de 3 de dezembro de 2012, na TVI, sobre aquele grupo privado de educação - dirigido pelo socialista António Calvete e onde preponderam políticos e quadros do bloco central de interesses -, e a sua rede endogâmica de fabulosos «contratos de associação», subsídios e apoios do Estado.

Também aqui, nesta leiva Do Portugal Profundo, assinalei o crescimento excecional do grupo, abrigado pelo poder socialista, e o efeito que isso tinha na escola pública: em 27-6-2008 («GPS, educação e escola pública»); e depois em 6-2-2011 («Totalitarismo socialista na educação») e em 11-5-2013 («Mais vale Crato que nunca»).


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias que comento não, que eu saiba, arguidas pelo cometimento de qualquer crime, nem suspeitas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade; e, mesmo quando arguidas, gozam do direito constitucional à presunção de inocência até trânsito em julgado de sentença condenatória; e quando condenadas em primeira, segunda e terceira instâncias, dispõem legalmente da garantia de recurso para o Tribunal Constitucional.

domingo, 19 de janeiro de 2014

Coadoção e adoção por casais homossexuais: democracia versus escol relativista




Ontem, 17-1-2014, foi aprovado no Parlamento o Projeto de Resolução n.º 857/XII/3.ª do PPD/PSD que «propõe a realização de um referendo sobre a possibilidade de coadoção pelo cônjuge ou unido de facto do mesmo sexo e sobre a possibilidade de adoção por casais do mesmo sexo, casados ou unidos de facto». A favor votaram os deputados do PSD, imposta a disciplina de voto; o CDS PP absteve, além de dois deputados do PS; e contra votaram os demais deputados do PS, PCP e os deputados do BE e PEV. Comento e depois destaco as posições do PSD e do CDS-PP.

O resultado constitui uma extraordinária vitória sobre o relativismo e sobre a promiscuidade da direita liberal. A viragem, a contragosto, da direção do PSD e da sua direção parlamentar relativamente à sua atitude face à co-adoção foi determinada pelo combate cultural movido pelo setor patriótico cristão. Após a denúncia da manobra das faltas e das abstenções na votação em plenário, em 17-5-2013, do projeto de Lei n.º 278/XII do PS, que aqui fizemos e da indignação popular relativamente a esse resultado, a direção de Passos Coelho compreendeu que tinha alienado a sua base eleitoral. E, atenta ao contexto francês e espanhol, preocupada com a previsão do veredicto das eleições europeias, sujeita à pressão popular, a direção de Passos decidiu conceder o referendo sobre o assunto. Aqui, e por aí, na rede resiliente que tecemos, orgulhamo-nos do trabalho feito que contribuíu para este resultado.

Pode agora, vir a pressão sobre o receoso presidente da República, que, incomodado como está por não poder continuar o aggiornamento esquerdista, até a pode aceitar por cinismo político... Pode até vingar num Tribunal Constitucional dominado pela esquerda o argumento da engenharia social relativista, e da ideologia do género, de que é inadmissível que se votem duas matérias diferentes (?!...) no mesmo referendo (ainda que em perguntas separadas...) - ou outra justificação qualquer. Mas ninguém nos rouba esta vitória temporária - ainda que venha a ser desvirtuada pelo tacticismo político que usa destruir o respeito devido  pacta sunt servanda.

A tática do relativismo moral mudou, nos EUA (veja-se o caso da California) e pelo mundo ocidentalizado fora: como o favor popular recuou da agenda relativista radical e as sondagens e os referendos começaram a dar-lhe resultados negativos, neste momento os relativistas recorrem aos tribunais para que estes bloqueiem a vontade maioritária do povo. Portanto, também agora, em Portugal, se quer prestidigitar na secretaria o que o povo deseja decidir no campo. Claro que o recurso aos tribunais é uma tática temporária, pois não há condição política para suportar uma vontade popular consistente e duradoura. Mas, enquanto podem, forçam antidemocraticamente uma agenda radical relativista, cada vez mais desligada dos valores humanos constitutivos da sociedade.

O argumento de não se votam os direitos de minorias, baseado na suspeita antidemocrática de que a maioria não respeita a minoria, parece só valer quando a vontade da maioria não é concordante com a minoria progressista iluminada. Nessa interpretação, uma teoria elitista próxima da doutrina salazarista do «escol», em certas matérias escolhidas pelo escol, só esse escol as pode decidir.

O escol é cooptado pelos próprios, independentemente do valor académico, profissional ou simples valor. Nessa hermenêutica elitista - antidemocrática, insisto - o povo é burro, atrasado e mau. Em oposição à massa fedorenta do povo, os donos da política, o escol é ilustrado, progressista e solidário, o único grupo habilitado a entender e deliberar sobre matérias complexas como a adoção de crianças por casais homossexuais. Compreendem que o escol tem de ser ratificado pelo povo em eleições de menu fechado, mas também sabem por experiência de promiscuidade dos poderes democráticos de controlo, como os média tradicionais, que os representantes não têm de indicar os valores fundamentais que defendem, por exemplo: casamento homossexual, adoção e coadoção de crianças por casais homossexuais, aborto livre, liberalização de drogas, criação artifical de embriões exclusivamente para experimentação científica e produção de tecidos e de órgãos, eutanásia.

Assumem que o escol eleito não tem de servir o povo, mas apenas a sua consciência - e um ou outro interesse, cuja avença o povo não tem de o direito de conhecer... Mas o escol, representativo de si próprio, não é obrigado a informar o povo de quais os valores que defende, para além de ter a liberdade de esconder dos eleitores as suas convicções e, inclusivamente, a sua decisão (ou abstenção), que justificam como facto da vida privada ou consciência iluminada. Sem vergonha da contradição intrínseca, os defensores desta doutrina antidemocrática do escol justificam como moralmente irrepreensível que o candidato A do Partido X, eleito pelo povo numa lista partidária para representar os valores do programa ideológico do partido sem revelar os verdadeiros valores em que acredita e que pratica, logo que eleito passe a defender, de forma mais ou menos camuflada, os valores opostos, aliás identitários do partido Y. Ora, isso está até para além da interpretação setecentista da democracia representativa do discurso de Edmund Burke aos eleitores de Bristol, de 3-11-1774.

A posição do PSD
Como se sabe, não tenha a mínima ilusão sobre Pedro Passos Coelho, os seus negócios de Estado, a sua costela melífluo-cínica de beijos a criancinhas entremeados de roubos de chupa-chupas e a sua crosta tardo-liberal mal sarada. Não confio. E admito que na sombra do bastidor se fundam as lâmpadas que acenderam na ribalta, através de justificações tecnicalistas, e depois se procure demonstrar ao povo de que se fez tudo o que era possível para que o desiderato fosse outro. Isto é, a aprovação do referendo pode ter, em si, já a pista da sua recusa.

Porém, se as manobras de bastidor tiverem êxito, não será fácil convencer o povo de que não o deixam pronunciar por um arranjinho político feito nas suas costas por representantes que lhe ignoram a vontade e a eleição. Ou Paula Teixeira da Cruz, mais Teresa Leal Coelho (ex-administradora SAD do Benfica no tempo de Vale e Azevedo e ex-CCB), mais Francisca Almeida e Carina João Oliveira (atual presidente do PSD de... Fátima!... com uma no cravo e agora outra na ferradura) tão modernas, tão eme-dê-emes, tão ingénuas em busca daquilo que um amigo meu chama o atestado de bom comportamento esquerdista, mais o novo Paulo Rangel tão avesso à decisão da «turba popular» (16-1-2014) não se dão conta que o povo os elegeu, num menu peixe-ou-carne em que não pode escolher entre bife ou galinha, apesar de tudo num programa ideológico respeitador da categoria política da doutrina social da Igreja e não num programa socialista?!... Se a sua convição íntima os propele na direção de outros valores, não estarão no partido errado: no PSD de Sá Carneiro em vez do PS de Sócrates?...

A posição do CDS
O CDS de Paulo Portas, como tenho salientado, é um partido contraditório entre os valores que representa e os interesses que, na hora crítica, defende. O CDS de Portas, e da sua camarilha, não é um partido «democrata-cristão» como ainda afirma no ponto 1 do seu programa: é um partido liberal na economia e ainda mais liberal nos costumes. A abstenção na proposta de referendo sobre coadoção e adoção por casais homossexuais é mais um episódio de promiscuidade ideológica, coerente aliás, com a promiscuidade política, coerente aliás com toda a incoerência moral.

Admito que Portas possa chegar ao porto de abrigo de comissário europeu no outono de 2014. Os líderes da União Europeia não aceitam que Passos siga o exemplo de Durão, em 2004. Aliás, a birra de Portas com Passos pode ter tido como motivo o desejo do líder dos centristas ficar com o lugar de comissário e o entendimento entre os dois pode ter tido esse preço. Espero que depois de Portas abandonar o partido à sorte seguinte, Nuno Melo ou Filipe Anacoreta Correia possam resolver a contradição ideológica do CDS, ainda que isso implique uma transferência (outra...) para o Partido Socialista dos relativistas morais radicais que agora mandam no partido.


* Imagem picada daqui.

sábado, 18 de janeiro de 2014

Portugal: donos e escravos

Tenho pena que Manuel Monteiro tenha saído do CDS para a aventura da Nova Democracia em 2003, em vez de esperar que o futuro lhe desse razão. Porém, é útil que, como em 15-1-2013 no Jornal das 9 da SIC-Notícias frente a Mário Crespo, conte a história de como Paulo Portas lhe tomou o partido por dentro, três anos antes do desfecho no Congresso de Braga, de março de 1998.

São informações dessas que nos ajudam a compreender a natureza do regime atual, sujeito à promiscuidade do poder político português com interesses estrangeiros, como também se denuncia no recente livro de Francisco Louçã e João Teixeira Lopes, «Os donos angolanos de Portugal» ou no documentário «Os donos de Portugal», de Jorge Costa - ver ainda a entrevista de Jorge Costa e Francisco Louçã, de 13-1-2014 na SIC-Notícias.

Que espécie frouxa de país temos nós agora, que nos deixamos governar pela miséria de líderes como Passos, Portas, Sócrates, Seguro?... Que tivemos procuradores-gerais da República como Fernando Pinto Monteiro? Ou presidentes do Parlamento como Jaime Gama?!... Ou a fingimos ignorar a decadência de um presidente como Cavaco Silva?... Ou aturamos a fantochada mediática de Mário Soares?... Ou a fanfarra de outro ruinoso como é António Costa?... Que país mole fizemos de uma nação rija de criadores de mundos?

Obama Gates

Chamo a atenção para o livro do ex(traordinário)-secretário de Estado da Defesa dos EUA Robert Gates, que acaba de ser publicado: «Duty: Memoirs of a secretary at war». Pode ler-se um excerto no WSJ, de 7-1-2014. Lá se esfuma mais um setor da aura mítica de Obama...

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Arik



O general, e ex-primeiro-ministro, israelita Ariel Sharon faleceu no dia 11 de janeiro de 2014, após oito anos em coma.

Na hora em que parte um leão (Arik), é útil conhecer os factos duros da sua vida guerreira, bem distantes da lenda negra vitimista em que o mundo ocidental, nesta era de raposas medrosas, de lamentos e de moleza confortável, se atrofiou desde a segunda metade do século XX. E assim perceber como, em contraste com a Europa e a América do Norte,  um país do tamanho do Alentejo, como é Israel, com oito milhões de pessoas (dos quais 1,6 milhões são árabes) e rodeado de inimigos arabo-islâmicos (mais de trezentos milhões), se aguenta e desenvolve.

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

A fabulosa efabulação de José Sócrates


 


Nem queria voltar ao tema do comentário de José Sócrates, em 5-1-2014, na RTP-1, com a sua efabulação do jogo Portugal-Coreia do Norte, no Mundial de 1966. A efabulação é um desvio psicológico de misturar «elementos reais e fictícios», que parece recividar com frequência no ex-primeiro-ministro (cf. José da Porta da Loja).

No poste que escrevi aqui, em 7-1-2014, «Eusébio, Soares e Sócrates» - com base nas fontes indicadas, com relevo maior para Tó Zé Silva, que creio ter sido, na noite de segunda-feira, o autor da descoberta, imediatamente amplificada de que o dia 23 de julho de 1966, data da tarde desse jogo, era... um sábado - forneci-lhe uma saída para a efabulação detetada: Sócrates «ia brincar para o recreio da escola ao fim de semana» e «a "explosão de alegria na escola» foi um modo de falar sobre o contentamento dos seus amigos que tinham levado um rádio de propósito para ouvir o jogo... enquanto brincavam».

Porém, em vez de ficar com a dúvida razoável gritada pela trupe patética do eu-até-não-tenho-nada-a-ver-com-Sócrates-mas, este, como analisa o José da Porta da Loja, jamais resiste à tentação do desmentido fulminante. Mesmo que face a «uma invenção de uma memória necessariamente falsa, sem a noção assumida que o poderá ser». E espalha-se: não se conforma em encostar para golo, tem de tentar fintar o guarda-redes... A emenda desarticula a eufonia do soneto sistémico. Conta novo conto e cose-se em novo ponto de agulha incerta. Tenho, então, por isso, de voltar ao caso.

Recordo o que disse José Sócrates, em 5-1-2013, sobre esse jogo glorioso com a Coreia do Norte no Campeonato do Mundo de Futebol de 1966, no estádio de Wembley, em Londres:
«Lembro-me que saí de casa com Portugal a perder 3-0 e fui ouvindo nas ruas da Covilhã, enquanto ia para a escola, gritos de alegria através das janelas (...) pelos golos de Portugal. E cheguei à escola já Portugal ganhava e foi uma explosão de alegria na escola.» (Transcrição minha).
João Figueira que andava na mesma escola de Sócrates, na Covilhã, referiu no seu mural de Facebook, logo na madrugada de 6-1-2014, e ao CM, de 8-1-2014, que nessa altura a escola estava em férias. Para além de Sócrates ter dito que ia para a escola primária num sábado à tarde. Em vez de dizer que ia brincar para o recreio da escola, como diria se desse outro modo fosse.

Mas, depois da trupe paleo e neosocratina vir relhar o terreno, lá surgiu o confirmativo desmentido oficioso. Jorge, irmão de Luís, veio servir o patrão. No DN, de 9-1-2014, diz, em entrevista oportuna a João Céu e Silva, o mano Jorge, com uma memória ainda mais prodigiosa que a do seu camarada ex-primeiro-ministro:
«Nós morávamos no centro histórico da Covilhã e a escola ficava a muito poucas centenas de metros das nossas casas. Por isso, fosse em que dia fosse, houvesse aulas ou não, estivéssemos de férias ou não, fazíamos de um dos pátios da escola o nosso lugar de encontro habitual. Éramos um grupo de miúdos muito unido e íamos frequentemente para lá jogar à bola, ao berlinde e fazer travessuras. Quanto a ele, recordo-me bem de já lá estar com outros colegas quando eu cheguei após o jogo acabar.
- Já estava ou poderia já estar?
- Podia, não! Já estava, posso dizê-lo com toda a certeza porque tínhamos combinado antes do jogo entre nós esse encontro, e essas pessoas [os colegas] que lá estavam com ele a festejar eram também dos meus amigos mais próximos».
Portanto, vamos lá  reconstituir os factos e os ditos desse sábado, 23 de julho de 1966 (o jogo Portugal-Coreia do Norte começou às 15 horas GMT):
  1. Se Sócrates saíu - como diz que saíu - de casa com o resultado em 0-3, isso aconteceu entre as 15:25 e as 15:26. É que às 15:27, Eusébio reduziu para 1-3...
  2. Porém, quando Sócrates chegou - como diz que chegou - ao pátio da escola (que Jorge Patrão identifica como o Externato do professor Cerdeira) «já Portugal ganhava». Ora, como Eusébio marcou o quarto do seu poker, aos 14 minutos da segunda parte do jogo, após o canónico intervalo de 15 minutos, então, Sócrates só chegou ao externato depois das 16:14. O que perfaz, pelo menos, 49 minutos - como também deduz, na Pantominocracia, outro Pantomineiro Mor. 
  3. Diz o seu amigo Jorge Patrão: «Nós morávamos no centro histórico da Covilhã e a escola ficava a muito poucas centenas de metros das nossas casas». Então, o rapaz Sócrates, de oito anos, terá demorado, pelo menos, 49 minutos a fazer «poucas centenas de metros». 
  4. Claro que Jorge pode dizer que ele é que morava a poucas centenas de metros do Externato, que o seu futuro patrão morava muito longe, a mais de três quilómetros... Mas um servo não costuma usar o plural majestático.
  5. Poderá ainda argumentar-se que as «poucas centenas» eram... trinta, o que corresponde a um passo razoável para um petiz ansioso por ir comemorar a reviravolta... Mas essa explicação também seria demais. 
  6. Outra justificação defensiva é de que Sócrates se tenha detido pelo caminho a apreciar «os gritos de alegria através das janelas» - que diz ter ouvido - e que outro José também realça (para lá de estranhar o «tempo de caminho»).
  7. Já a «explosão de alegria na escola» também não é uma personificação pirotécnica da escola. Jorge recorda-se de o patrão «lá estar com outros colegas (...) a festejar». Deviam ser muitos, porque, se fossem poucos não se poderia falar de «explosão de alegria na escola». Para mim, a «explosão» deve ter sido ao quinto golo de José Augusto, cerca das 16:35 (aos 80 minutos de jogo)... Com certeza que um dos miúdos da escola primária levou um rádio para ouvirem enquanto jogavam. Jorge conta que só chegou no fim, pois ficou em casa a assistir ao jogo. Mas os outros colegas, como José Sócrates não. Foram, como iam sempre, para o pátio do externato, jogar à bola, sem qualquer oposição do liberal dono do espaço, enquanto ouviam o relato no aparelho bifado por algum dos petizes. Deve ter sido assim, tal e qual. E «ali mesmo», como relembrava o Anastácio do «Leão da Estrela» sobre a sua fantástica caçada à «onça» na «bacia do Limpopo»...

Atualização: este poste foi emendado às 11:14 e 12:00 de 14-1-2014.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): É desnecessário lembrar que a efabulação não é crime. Indesculpável é dar crédito político a quem a faz com frequência.

domingo, 12 de janeiro de 2014

O modus operandi do lulismo e do socratismo

A revista brasileira Veja, de 11-12-2013, pp. 74-80, traz uma entrevista ao ex-secretário nacional de Justiça brasileiro, o delegado Romeu Tuma Junior, com informação muito útil para compreender o modus operandi do socratismo no poder. A entrevista ocorre na sequência da publicação do livro de Romeu Tuma Junior em entrevista a Claudio Tognolli, «Assassinato de reputações: Um crime de Estado», TopBooks, 2013Ceteris paribus, o fabrico pelas operações negras em colaboração com as operações suaves, de dossiês sobre opositores, filtrados em seguida por operacionais políticos de relevo a editores de confiança nos jornais, com amplificação para as televisões. Depois, basta repetir nos média mil vezes a mentira até que se transforme numa verdade que resista a qualquer rigor. 

Na entrevista do delegado Tuma Junior, destaca-se a revelação de que o líder sindical Lula (uma criação do general Golbery do Couto e Silva) terá, alegadamente, colaborado com os serviços de segurança da ditadura brasileira, na prevenção de confrontos. Diz Romeu Tuma Junior (p. 80 da revista): «Lula era informante do meu pai no DOPS» (Departamento de Ordem Política e Social, em São Paulo). 

Um dia - um dia... - publica-se a história de como José Sócrates chegou ao poder no PS/Estado. Fiquemos, por enquanto, com o modelo de exercício de poder do lulismo: «um lado sem escrúpulos, sem lei, no qual o Governo é usado para proteger os amigos e e triturar aqueles que são considerados inimigos».



«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 74


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 75


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 76


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 77


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 78


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 79


«O livro bomba - entrevista de Robson Bonin a Romeu Tuma Junior», Veja, 11-12-2013, p. 80
(realce meu, a amarelo)


Atualização: Malvadas gralhas. Há pouco uma sujou-me o título... Desculpem-me.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades referidas nas notícias dos média, que comento, não são suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Democracia direta e ativismo

A propósito de uma excecional reportagem - «Loosing Aaron», na Boston Magazine «Losing, de janeiro de 2014,  sobre o caso de Aaron Swartz. A maior pressão sobre os percursores da liberdade é um sintoma da decadência da democracia representativa/ditadura dos representantes caciques. A democracia representativa tem resistido, através das maçonarias e do controlo dos média tradicionais empobrecidos, à instituição de uma democracia direta com livre escolha dos representantes em eleições primárias para todo e qualquer lugar elegível, transparência, prestação de contas, responsabilização e maior número de referendos.

Abstraindo do caso de Swartz, a bofetada do poder (SLAPP) pretende reprimir e prevenir o acesso e a distribuição de informação sensível. Contudo, a força da tecnologia e a ânsia dos cidadãos irão prevalecer sobre a corrupção  e o arbítrio dos representantes. A democracia direta é inevitável.

Convinha que dentro dos partidos se organizassem correntes de defesa da democracia direta. O problema da corrupção da vontade popular pelos representantes não se resolve com a escolha desta ou daquela pessoa. Não é uma questão de pessoas: é uma questão de sistema. Porque, agora, esta ou aquela pessoa, qualquer que ela seja e por melhor que seja a sua intenção, é sujeita ao crivo prévio das plataformas de corrupção que controlam os meios - dinheiro para campanhas e acesso às televisões e jornais digitais. E se, nesta época, esta ou aquela pessoa, candidata ao lugar interno, não der garantias prévias de aprovação e de rejeição de determinadas medidas políticas, não terá meios de vitória.

Entendo que é uma questão de tempo até que a democracia direta prevaleça. Os sistema corruptos e autoritários não aguentam grande fluxo de informação e de comunicação. Mas o tempo que vivemos é o nosso tempo. Não é o tempo deles, o tempo dos outros. É nosso. Temos de resgatar a cidadania. A amargura tem de ser convertida em mudança. E a mudança carece de meios. Porque gente e ideias já existem.

Para a mudança do sistema político não bastam os blogues, nem a indignação lúdica das redes sociais. Sobre o slacktivism (ativismo preguiçoso) das redes sociais - e descontando a perspetiva ideológica -, veja-se o interessante estudo de Robert Muggah e Gustavo Diniz, «Black Bloc rising: Social networks in Brasil», de outubro de 2013, do Instituto Igarapé e da SecDev Foundation, publicado pela Open Empowerment Initiative. Segundo explica Gustavo Diniz, «no Brasil, a relação espaço cibernético/rua tende a se dar na direção da rua para o espaço cibernético», pois «o que acontece na rua é matéria prima para o que acontece na rede social, mais do que o contrário». Robert Muggah conclui que, através das novas tecnologias e especialmente das redes sociais, «um grande número de pessoas se associa temporariamente com o Black Bloc, mas a sua participação se manifesta mais como um “meme de protesto” do que como um compromisso de longo prazo».

Mais do que empenhar-se nos movimentos de protesto, muitos utilizadores das redes sociais (com destaque maior para o Facebook), ostentam o badge virtual e o like, eventualmente comentando na sua rede de amigos ou partilhando. Confortam-se com esses cliques, mas não saiem da sua concha virtual para a ação. Essa preguiça reduz a eficácia da ação de mudança porque descalça os organizadores, já sujeitos à censura noticiosa dos meios dominantes.

Não se pode contar a adesão fácil momentânea (o clique) como um compromisso regular e trabalho constante na divulgação de uma ideia e na promoção de um projeto. O furor dos eventos dificilmente passa para a atividade permanente. Portanto, importa criar os meios permanentes de atividade. Atividade em vez de eventos.

Transpondo, para a nossa circunstância, os meios permanentes de ação, que estão disponíveis para a mudança e são viáveis, são os jornais digitais. Nesta era de smartphones, tabletes, portáteis, wireless, bluetooth, um pequeno jornal digital não precisa de grande despesa de equipamento, nem de grande investimento em instalações (a casa serve...): apenas de um pequeno grupo de pessoas, em trabalho cooperativo, remunerados pela receita publicitária googleana e, a pouco e pouco, por outras. E nem precisamos de um só jornal digital: precisamos de vários, em concorrência de valor. Esses jornais digitais de segunda geração, com linha editorial assumida, com opinião franca, são fundamentais para a mudança de paradigma político e de Estado.


* Imagem picada daqui.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Mário Soares e Juan Carlos: a contradição mediática da evidência

A proteção dos média sistémicos portugueses ao desnorte das últimas intervenções de Mário Soares - como foi o caso do rancoroso epitáfio de Eusébio - é ainda maior do que o amparo da imprensa espanhola ao rei D. Juan Carlos na sua fase decadente. Oiça-se o discurso embaraçante, atrapalhado e enrolado, do rei espanhol, em 6-1-2014, perante altas patentes militares. Porém, contrariando a evidência das imagens e dos sons, a imprensa faz um «lifting de luxo» ao monarca, cuja debilidade constitui, nesta altura crítica, um problema muito sério para o Estado espanhol. O mesmo lustro seboso se passa em Portugal a Mário Soares.

Como se estivéssemos num regime autoritário, o destempero e as gaffes - objetivamente notícia - são varridos dos média tradicionais, suscitando maior perplexidade ainda no caso da omnipotente televisão. E, todavia, as notícias movem-se nos blogues, nas redes sociais, nos mails, no passa-palavra, em comparação com a obsoleta censura da sistémica imprensa tradicional, que a torna ainda mais anacrónica e patética...

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Eusébio, Soares e Sócrates

Quando éramos pequeninos, eu e o meu irmão, um pouco mais velho, jogávamos à bola, junto à adega, na quinta de minha avó. Teria eu por aí uns quatro anos. O clube dele era o Benfica; o meu, por diferença fraterna, o Sporting. Nas fintas, ele fazia de Eusébio e eu tinha de lhe opor um rival de igual valia. Nos relatos dos jogos, que ambos ouvíamos, e que nos criava a euforia de ir replicar o entusiasmo logo a seguir, apercebi-me de que havia um nome tão falado quanto o de Eusébio. Era o «Esférico», um jogador (cria eu...) mencionado constantemente pelo narrador desportivo na rádio: o «Esférico» passa por Fulano, o «Esférico» corre para Beltrano, o «Esférico» é maltratado por Sicrano... Menino, antes do moço que também já fui, longe de perceber as coisas dos adultos, decidi que o meu ídolo passaria a ser esse «Esférico», um jogador (do Sporting...) de tanta notoriedade quanto a do ídolo do meu irmão. Pouco depois, numa idade em que o tempo não se contava, e antes ainda da época gloriosa de Héctor Yazalde, descobri, embaraçado pela ignorância, mesmo a de menino, que, afinal, o «Esférico» não era um jogador: o «Esférico» era uma metonímia da bola. A importância futebolística de Eusébio era, então, essa toda: igual a ele... só a própria bola.

Formado no antigo Sporting Clube de Lourenço Marques, raptado depois pelo Benfica - alegadamente depois de uma observação falhada de Otto Glória -, Eusébio valia por si, para além da rivalidade clubística, por motivo da sua habilidade, velocidade, força e sentido de baliza, do sucesso no clube e na seleção nacional, da identificação patriótica e do seu desportivismo. Eusébio morreu neste 5 de janeiro de 2014. Mas a memória do seu jogo, dos seus feitos e da sua atitude, perdurará eterna.

Na hora da sua morte, quando é altura de glorificar alguém que foi mito em vida - um privilégio dos jogadores de génio -, Eusébio não merecia a indignidade do ataque de Mário Soares. Soares, até podia ter feito como António Costa, que instrumentalizou, com a colaboração inexcedível de Luís Filipe Vieira, a morte de Eusébio para seu benefício eleitoral na candidatura à presidência da República, e fez o seu corpo deslocar-se até à praça do Município. Ou como os ensaios de outros políticos, como o presidente Cavaco Silva e a sua declaração das 12:30 de domingo. Mas Soares não resistiu a rebaixar Eusébio a um homem de «pouca cultura», que não era «um pensador», que «bebia muito whisky, todos os dias, de manhã e à tarde»!... Diz o povo que, na altura da morte, se não há bem para dizer, nada se diz. E Eusébio tinha muito bem para dele se dizer.

Soares, propalado como bonacheirão, revela-se, enfim, rancoroso. Não terá perdoado a Eusébio os êxitos nacionais dos anos 60, nas provas europeias do Benfica e no Mundial de 1966, e nem sequer teve a humildade de os integrar. Do seu filho João Soares, enquanto presidente da Câmara de Lisboa, se conta que terá recusado homenagear Eusébio, que via como um aliado do fascismo. Como me sugeriu um amigo, Soares ressente na homenagem de Eusébio, o funeral que um dia gostaria de ter - e sabe não ser possível. Não obstante, podem os editores dos média dominantes abafar o episódio, que ele circula por aí nos blogues, redes sociais e mails, como expressão sectária definidora de um político venenoso.

José Sócrates tentou fazer melhor no seu comentário televisivo: revelou ter-se tornado benfiquista num momento célebre: o jogo dos 5-3 de Portugal contra a Coreia do Norte,  no Mundial de Inglaterra. Tinha o ex-primeiro ministro oito anos de idade. Disse Sócrates:
«Lembro-me que saí de casa com Portugal a perder 3-0 e fui ouvindo nas ruas da Covilhã, enquanto ia para a escola, gritos de alegria através das janelas (...) pelos golos de Portugal. E cheguei à escola já Portugal ganhava e foi uma explosão de alegria na escola.» (Transcrição minha).
O problema é, que como nota o jornalista Frederico Duarte Carvalho, quando esse jogo decorria, em Portugal era... sábado à tarde (o jogo começou às 15 horas), quando a escola primária estaria fechada... Mais ainda, a partida, histórica pela reviravolta, ocorreu em 23 de julho de 1966, mês de férias... Pode vir agora a explicação - arriscada, pois há gente daquela época e daquele local - de que ia brincar para o recreio da escola ao fim de semana e de que a «explosão de alegria na escola» foi um modo de falar sobre o contentamento dos seus amigos que tinham levado um rádio de propósito para ouvir o jogo... enquanto brincavam. Mas isso apenas agrava o mal feito e a convicção popular. Como é dito, e sabido, Sócrates não tem um problema com as datas, nem sequer com a memória: Sócrates tem um problema com a verdade.

Na hora em que parte o humilde Eusébio, o arrrogante Sócrates escaqueira-se: faz lembrar aqueles fracos jogadores que ficam, por acaso, na cara do golo e decidem embelezar a jogada com uma finta ao guarda-redes, perdendo a bola; e depois, sem vergonha perante os apupos do estádio, ainda se queixam ao árbitro da própria imperícia.


Pós-Texto (11:22 de 8-1-2014): O seu a seu dono
Percebo n'O Insurgente, através de Ricardo Campelo de Magalhães, que foi um facebookiano chamado Tó Zé Silva quem deu a notícia cerca das 22 horas de segunda-feira, 6-1-2013. A notícia foi também amplificada pelo desassombrado poste do eurodeputado Nuno Melo no Facebook, ao princípio da tarde de ontem.


Atualização: este poste foi emendado e reescrito às 20:37 de 7-1-2014; e emendado às 22:22 de 7-1-2014; e atualizado às 11:02 de 8-1-2014.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Sócrates em queda e o habitualismo de Passos



A manchete do Sol, de 3-1-2014, «Sócrates sempre a cair» do artigo «Sócrates é o menos visto dos comentadores», pressagia a saída do ex-primeiro-ministro da imunidade de comentador residente da RTP e, quiçá, novos avanços judiciais. Veremos se este novo ciclo socratino vai da clandestinidade prática, para a qual regressou, assolado todavia pelo repúdio popular, até outro exílio académico parisiense (ou nova-iorquino...).

A queda do protegido-protetor socratino Paulo Ferreira, da diretor de Informação da RTP, em 28-12-2013, tem um significado tático: Passos Coelho empurra o Pinto amigo para bode expiatório, tal como já tinha alijado o outro... Passos é um sobrevivente discreto, utilizando melifluamente a neutralização do habitualismo, a teoria salazarista de que os portugueses querem é viver habitualmente, desinteressados da política. E agora mais, quando se sabe que a União Europeia exige o protetorado em troca da liquidez. Um beco.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Undécima hora

Limpando a pilha de pendentes:
  1. «Co-adoção referendo divide deputados do PSD», ionline, 19-12-2013 - a divisão parece que é assumida, em nome dos defensores escondidos, pela deputada Francisca Almeida (da linha moderno-ateia de de Assunção Esteves, de Teresa Leal Coelho, e de Paula Teixeira da Cruz, sempre à procura de um atestado-socialista-de-bom-comportamento-esquerdista). Do que se trata é de torpedear um referendo em que a maioria do povo expressaria a sua vontade contra a co-adoção por casais homossexuais.
  2. «MP com duas versões diferentes sobre licenciatura de Relvas», no ionline, 9-12-2013 - veremos qual delas triunfa...
  3. Jeremy «Hammond calls his 10-year sentence a 'vengeful, spiteful act' by US authorities eager to put a chill on political hacking», Guardian, 15-12-2013 - whistleblowers sob fogo, mesma do socialismo obâmico.
  4. «Aaron Swartz, internet activist and builder of Reddit, dies at 26 - Advocate of freedom of information who faced trial over hacking allegations reported to have killed himself in New York», Guardian, 12-1-2013 - chiiiiiiuuuuu!
  5. «Greeks cheer as PM Samaras announces: Free Wi-Fi for all», Keep Talking Greece, 5-11-2013 - escasseia o pão, mas sobra o circo... Se cá se sabe disto, Passos-Portas ainda recuperam nas sondagens dos efeitos da austeridade desigual
  6. «Una diputada del PSOE intentó atropellar al vigilante del parking del Parlamento gallego», Libertad Digital, 18-11-2013.
  7. «Dirceu, Genoino e Delúbio estão presos em regime semiaberto», O Globo, 18-11-2013 - o controlo carcerário governamental atenua a dureza das penas do poder judicial independente, no Mensalão brasileiro (regime semiaberto), como no processo português de abuso sexual de crianças da Casa Pia.
  8. «L’extrême-droite séduit difficilement les catholiques», La Croix, 4-12-2013 - Em França, «só 7% dos católicos praticantes declaram que» a Frente Nacional «é o partido do qual se sentem mais próximos, contra 13% do conjunto dos franceses». Ainda que entre os jovens católicos exista maior proximidade do discurso «identitário» (ameaça islâmica, preferência nacional e imigração), económico e político, daquele partido de extrema direita que pode ganhar as próximas eleições europeias.
  9. Também em La Croix, de 20-10-2013, um artigo sobre a próxima «Lei da família» do Governo socialista familiofóbico de Hollande. A procriação medicamente assistida de casais de lésbicas fica ainda na gaveta. Mas as novidades são: a criação de um estatuto do padrasto/madrasto com determinados direitos sobre as crianças nos «atos usuais da vida quotidiana»; a obrigação de audiências com «mediação familiar» para casais divorciados, com vista ao aumento da mediação familiar»; a definição de uma «pré-maioridade» entre os 16 e os 18 anos (à qual se opõem 82% dos franceses), já que a «a maioridade sexual está nos 15 anos»; a restrição apenas a «dados não identificantes» (sic) ao conhecimento da identidade de dadores de gâmetas. Pergunta a UNAF (União Nacional das Associações Familiares) francesa: «cada padrasto/madrasta sucessivo vai beneficiar de um estatuto sobre a criança?». Não importam as críticas à ideologia do género à qual a sociedade se opõe, importa re(in)ventar a família!
  10. O radialista norte-americano da franja extrema direita republicana, metodista Rush Linbaugh, ataca o Papa Francisco, dizendo que a encíclica Evangelii Gaudium é «puro marxismo», Huffington Post, 2-12-2013 - é o que dá uma leitura apressada do texto da exortação apostólica do Papa, de 24-11-2013 defronte à cegueira fundamentalista do capitalismo...
  11. Ainda no Huffington Post, de 2-12-2013, especula-se se «o Papa Francisco sai do Vaticano à noite para falar com os sem abrigo», alegadamente «vestido como um padre normal» - na linha de outro «escaped prisioner» do comovente «As sandálias do pescador», de 1968.

Atualização (19:52 de 3-1-2013): Por enquanto, Dirceu e camarilha ainda estão em regime fechado, enquanto os seus recursos judiciais estão em análise. Veremos quanto tempo decorre até que se ponham ao fresco.