quinta-feira, 28 de março de 2013

Voltei, voltei..




A entrevista «Sócrates, o fim do silêncio», do ex-primeiro-ministro José Sócrates à RTP-1, canal público representado pelo próprio diretor de Informação, Paulo Ferreira, e Vítor Gonçalves, ontem, 27-3-2013, no horário mais nobre, depois do telejornal da noite, nas vésperas da ponte da Páscoa, obriga a um pequeno relato, que, a seguir, alinho.
  1. A entrevista começa com o anúncio pomposo pelo arauto Vítor Gonçalves: «Chegou a hora de quebrar o silêncio: José Sócrates está de regresso ao País...». Portanto, ficámos a saber, por informação que o jornalista deve ter obtido do próprio, de que o ex-primeiro-ministro acabou o seu exílio parisiense, para onde tinha ido após a tomada de posse do Governo PSD-CDS, num período de grande agitação judicial de processos que o referiam (sem chegar a ser arguido): aterro sanitário da Cova da Beira (do seu amigo Prof. António José Morais e de Horácio Luís de Carvalho...); Freeport; Face Oculta. E de queregressou ao comando das suas tropas fandangas.
  2. Portanto, José Sócrates parece ter abandonado o doutoramento em Ciência Política, na École Doctorale de Sciences-Po, na qual, segundo o anúncio da conferência em Poitiers, em 3-11-2011 «Quelques clés pour comprende le Portugal actuel», estava inscrito. Justificou ainda a mistificação da Filosofia, dizendo que Ciência Política e Filosofia Política são hoje a mesma coisa...
  3. Vem à entrevista, e à função de comentador residente na RTP num programa específico, mas afirma: «não tenho nenhum plano  para regressar á vida política ativa» (frase preparada que repete) - nem ser candidato a Presidente nem a primeiro-ministro, dizendo que é uma porta que fechou. Afirma que «quer contribuir para o enriquecimento da nossa vida pública no sentido da diversidade» (sic).
  4. Explica que quer contrariar a «narrativa» (chavão que repete inúmeras vezes) de que o seu pedido de ajuda externa à União Europeia e ao FMI para Portugal foi o resultado da sua governação ruinosa, mas sim a consequência inevitável do chumbo do PEC IV no Parlamento. E acrescenta que «foi a crise que levou à dívida e ao défice» e, daí a bocado, diz:  «não reconheço que tive uma política despesista». Note-se, todavia, para lá dos números do défice, da dívida, da falta iminente de liquidez para pagamento de salários, subsídios e pensões, do crescimento exponencial da taxa de juro das obrigações do Estado português, ao contrário, que a apresentação do PEC para votação no Parlamento foi um artifício para justificar uma demissão apressada que evitasse ter de governar sob a tutela austera da troika e suportar o peso do descontentamento popular.
  5. Apesar de auxiliado pelo seu partenaire deste circo mediático, Paulo Ferreira, a quem pedia para verificar os números, Sócrates enredou-se nos números da dívida pública, do défice orçamental e das parcerias público-privadas.
  6. Denunciou a preparação com o «front loading» do atual governo, na austeridade «à bruta», na expetativa da «curva em V» e insistiu num chavão memorizado de que o Governo deve «parar de escavar» a austeridade, «parar com esta loucura». Está um ainda mais refinado do que já era: atente-se no registo compungido da vitimização, logo ser substituído pela insídia rasca de chamar «bois» aos homens do Correio da Manhã...
  7. Fala na gravidade da eventual declaração de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional do Orçamento de Estado para 2013, sugerindo implicitamente a necessidade de queda rápida do Governo.
  8. Mas o prato principal do repasto convivial, ameno, amigável, familiar, da entrevista, na qual se comportou como se ainda fosse primeiro-ministro em função - numa radicalização do discurso contra «a direita» (ele o íntimo do grande capital...), foi o ataque ao Presidente da República e ao Correio da Manhã.
  9. Acusou o Presidente da República de conspiração relativamente ao caso que chamei de «Operação Encomenda», no DN, de 18-9-2009 (um assunto que tratarei à parte), de deslealdade,  de oposição ao seu Governo, nomeadamente no discurso da posse, e de que o Presidente «foi a mão escondida atrás dos arbustos» (sic) nos ataques contra o seu Governo, em contraste com a sua atitude perante este Governo em que se diz que «não faz nada». Também à parte tratarei dos motivos deste ataque.
  10. Atacou violentamente o Correio da Manhã  - «é preciso chamar os bois pelos nomes» (sic) - por «algumas campanhas que me fizeram», nomeadamente de que «tinha vida de luxo» em Paris, aparentamente sem meios para tal. Não tinha vida de luxo na bela casa naquele quartier, naqueles restaurantes, nos fatos do Bijan  norte-americano (tendo de se contentar em Lisboa, alegadamente, como nota o José, com a modesta Rosa e Teixeira)?... Todavia, justificou que tinha feito um empréstimo para um ano sabático em Paris, à Caixa Geral de Depósitos, e de que nunca teve contas a prazo, nem ações, nem offshores (falta demonstrar o inverso). Sócrates queixou-se ainda de «certa impunidade como o mundo da justiça trata essas campanhas» em que não defende o bom nome dos cidadãos, naquilo que constitui uma pressão inadmissível sobre o tribunal que aprecia nesta altura, precisamente, uma queixa de Sócrates contra aquele jornal por causa da dita campanha... Sócrates recrimina Nuno Morais Sarmento por ter dito, em 25-3-2013, que Sócrates era um homem sem «vergonha», mas ataca «os bois» como antes, em 21-4-2009 o «telejornal travestido» de Manuela Moura Guedes. E defende o seu partenaire Paulo Ferreira no caso do seu amigo Dias Loureiro.

No final cita a inscrição pendente sobre a porta do Inferno, na A Divina Comédia, de Dante - «lasciate...» -, uma narrativa onde na primeira frase o protagonista confessa que «la diritta via era smarrita»...

Este é o meu relato incompleto da entrevista. Para não rasgar mais o lençol neste poste, trato em separado dos motivos e dos efeitos desta entrevista.


Limitação de responsabilidade (disclaimer): José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa e demais entidades referidas nas notícias dos média, que comento, não são suspeitas ou arguidas de cometimento de qualquer ilegalidade ou ilegalidade nos casos referidos.

2 comentários:

  1. O regressado de Paris parece-me algo como um coito interrompido....

    Carlos Sousa

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  2. Alguém leu os comentários de queixas contra os entrevistadores na página da RTP no Facebook? Do nunca visto, muitos mais e mais fortes do que os anteriores contra o programa.

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