Os magistrados do Ministério Público, através de reunião de meia centena de delegados sindicais, reagiram ontem, 14-2-2009, em Tomar, com a coragem funcional que o País deles espera, a esta fase de deriva autoritária que o Estado de Direito - o tal que, recorde-se, já antes de alcançar o poder não merecia qualquer respeito... - e o povo precisam.
Abordemos o assunto. Primeiro a notícia, depois uma pequena história do Estado e um comentário de relação dos factos.
A notícia vem no Diário IOL de 14-2-2009 e publico-a aqui integralmente para que valorizar e não se perder no éter:
Abordemos o assunto. Primeiro a notícia, depois uma pequena história do Estado e um comentário de relação dos factos.
A notícia vem no Diário IOL de 14-2-2009 e publico-a aqui integralmente para que valorizar e não se perder no éter:
"«Pressões» na Justiça só com «meios» das secretas
Sindicato dos Magistrados do Ministério Público fala de «intimidações» a magistrados com «processos ou investigações delicados
14-02-2009 - 22:01h
Redacção/CLC
Os delegados do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) consideram que «as pressões e intimidações» sobre os magistrados titulares de «processos ou investigações delicados» envolvem «poderosos meios de contra-informação só disponíveis, por norma, aos serviços de «inteligence», escreve a Lusa.
Reunidos este sábado em Tomar para analisar a questão do estatuto do Ministério Público mas também as repercussões para a instituição dos mais recentes casos mediáticos, os delegados sindicais do SMMP aprovaram uma moção em que manifestam apoio aos magistrados titulares desses processos e exigem que sejam colocados à sua disposição «todos os meios necessários ao prosseguimento, sem constrangimentos, das investigações em curso, que se exigem sérias e exaustivas».
«Nos últimos tempos, mais uma vez o Ministério Público e os seus magistrados têm sido alvo das habituais e recorrentes campanhas que acontecem sempre que estão em causa processos ou investigações delicados em função das matérias ou dos visados», afirma a moção.
«Distrair as atenções do essencial»
«As pressões e intimidações que têm recaído sobre os magistrados titulares desses inquéritos, com o intuito de os atemorizar e diminuir na sua acção e capacidade de determinação na condução das investigações, e bem assim de condicionar os que com a Justiça querem colaborar, têm várias origens e envolvem poderosos meios de contra-informação só disponíveis, por norma, aos serviços de «inteligence», acrescenta.
Para os delegados sindicais do SMMP, «intimidar, desacreditar e ao mesmo tempo distrair as atenções do essencial e desviá-las para o acessório é uma velha estratégia, a que as desenvolvidas e elaboradas técnicas de comunicação e contra-informação, tão em voga entre nós, dão suporte e expressão».
No seu entender, a «insinuação das famigeradas relações com a comunicação social», para «desacreditar quem investiga», esquece que «a investigação criminal está neste momento, entre nós, infelizmente, limitada, condicionada, muitas vezes paralisada, sem meios humanos e materiais, com condicionamentos legais e operacionais de toda a ordem, que o SMMP tem vindo a denunciar publicamente há muito tempo».
«As fugas vêm muitas vezes donde menos se espera»
Por isso, acrescenta a moção, «é a investigação jornalística, porventura com meios financeiros mais poderosos, agindo com «timings» próprios, diversos dos da justiça, e desenvolvendo o papel fundamental que lhe cabe em qualquer democracia, que vai à frente».
Os delegados sindicais do SMMP afirmam ainda que «as fugas vêm muitas vezes donde menos se espera, donde não seria suposto, lançadas pelos visados, numa tentativa de controle e minimização dos danos próprios, por um lado, de desacreditação da investigação e da justiça, por outro, e, finalmente, de tentativa de desviar a atenção do essencial para o acessório».
«Entretanto, investigar o que verdadeiramente interessa e responsabilizar quem tiver que ser responsabilizado, dá lugar à tentativa de publicamente fazer querer [crer] que o que importa é a investigação da própria investigação e de quem com ela colabora, num jogo de desconfianças prejudicial à Democracia, à Justiça e ao Estado de Direito».
«Que outros o façam, percebe-se. Que no seio do Ministério Público haja quem colabore, ainda que por inércia, já não é admissível», acrescentam.
A moção exige que os apoios a disponibilizar aos magistrados titulares desses inquéritos incluam o recurso, «sem quaisquer reservas, aos mecanismos de cooperação judiciária internacional considerados necessários pelos investigadores, devendo exigir-se ao Governo a disponibilização dos meios ou autorizações necessárias e que as circunstâncias imponham».
A direcção do sindicato foi mandatada pelos cerca de 50 delegados sindicais hoje presentes em Tomar para solicitar junto do Presidente da República a «intervenção considerada necessária e ajustada à salvaguarda plena do verdadeiro Estado de Direito»." [grosso meu]
No auge da crise da Universidade Moderna, a Visão divulgou em 11-3-1999 (conforme lembrava o José ainda na grande Loja do Queijo Limiano, em 1-5-2007) um Relatório do SIS que o próprio ministro da Administração Interna, dr. Jorge Coelho, que tutelava os serviços e, segundo a revista, o tinha encomendado, desmentiu. Embora, no Parlamento, tenha atirado até com a acusação de contrabando de armas e carne branca que se passaria na Universidade Moderna, à bancada do seu primo dr. Paulo Portas e do PSD do dr. Santana Lopes, que também colaborou no famigerado centro de sondagens da Moderna. O relatório desmentido pelo ministro, de quem se suspeitava tê-lo na gaveta motivou uma inolvidável crónica do dr. Vasco Graça Moura (se houver alguém que forneça o link, agradeço...) sobre um relatório-que-não-existe não poder estar em gaveta nenhuma. Aborrecido, com o destempero e falta de sentido de Estado dos políticos o general Chito Rodrigues, que tinha dirigido durante vários anos os serviços secretos militares mas já estava na reserva, veio a público responsabilizar o Governo pelo assunto. Dizia o general que era preferível que o relatório publicado na Visão tivesse sido mesmo elaborado no SIS, como se dizia, pois, pela sua tecnicidade e forma, se tivesse sido feito fora dos serviços (e os militares não se metiam na política partidária) era sinal de que em Portugal estava a operar livremente gente muito perigosa... O patrão das secretas no Governo, o dr. Jorge Coelho, lá teve de ceder e foi admitido que o relatório era mesmo do SIS. Em Portugal não era possível suceder o mesmo que nos EUA, onde o fornecimento da identidade da funcionária da CIA Valerie Plame ao Washington Post, em 2003, só não custou o mandato ao vice-presidente Dick Cheney porque não se conseguiu provar ter sido ele a soltar essa informação para a imprensa. Por aqui, a desvergonha comum dos dirigentes do Estado é expor até os autores das informações, com tradição (!) de filtrar nomes de operacionais (!) para consumo partidário ou jogo de poder, desde o caso Veiga Simão ao mesmo SIED em 14-2-2009...
Portanto, é preferível que seja mesmo o SIS - ou os GOE (que dizem funcionar como a secreta da PSP) - a vigiar, escutar e intimidar ostensivamente os magistrados e jornalistas. Porque se trata de intimidação: aquela manobra de no domingo 25-1-2009, segundo conta a revista Sábado de 6-2-2009, quando o juiz de instrução do Freeport estava no fim de semana na sua terra, em Mação, dois indivíduos irem propositadamente fazer perguntas sobre ele, num carro com matrícula falsa é mesmo para o ameaçar do perigo em que está a incorrer quando autoriza as contestadas buscas e certas diligências. Só faz lembrar a impunidade de polícias políticas de regimes ditatoriais. Não adianta nada, pelo que se vê, que o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República (CFSIRP) ouça o director dos serviços ou até verifique as ordem de serviço, porque estes trabalhinhos particulares não ficam escritos, nem correm pelas hierarquias formais - se bem que quem os realiza acabe mais cedo, ou mais tarde, descalço pelo poder que lhes encomendou o serviço, e com a garantia de nome e foto nos jornais, como o ex-assessor governamental, funcionário dos serviços, no caso do relatório sobre a Moderna.
Há alguém com bom senso que acredite serem serviços secretos estrangeiros que andam a escutar, vigiar e intimidar, os magistrados do Freeport e BPN/Siresp?!...
Aceitou-se no Parlamento em 11-2-2009 a indignação do primeiro-ministro à pergunta do líder parlamentar da oposição sobre a vigilância dos magistrados e o SIS, em vez de se insistir na responsabilidade dele no controlo dos serviços de informações e na actividade de células de informações em Portugal. Não basta a palavra de José Sócrates para crermos que a vigilância e intimidação de que os magistrados do processo Freeport se queixam é uma fantasia, para mais quando são referidas evidências detalhadas de intromissão nas comunicações e intimidação. Por que não foram ainda investigados internamente esses casos no SIS, como deveriam ter sido em função das denúncias públicas de roda livre dos serviços de informação, em vez de se responder com insultos aos magistrados?...
Já disse, e insisto, resta o Presidente da República para chamar a atenção sobre o regular funcionamento das instituições democráticas - que só pode ser recuperado pelo próximo governo. A intervenção do Presidente já não pode incidir apenas sobre o procurador-geral da República - agora objecto de severa crítica pública dos delegados sindicais do Ministério Público -, ou sobre a desvio da função de investigar de procuradores para uma espécie de porta-vozes de defesa do primeiro-ministro, mas também sobre os serviços de informação. Não é admissível o envolvimento do SIS em actividades de estrita investigação criminal - nomeadamente, dos "casos de fraude e criminalidade económica no BPN e BPP" (CM de 10-2-2009) ou da violação de segredo de justiça no caso Freeport (CM de 7-2-2009), muito menos as alegadas escutas, vigilância e intimidação de juízes dos processos Freeport e BPN/Siresp, tal como não é saudável a ofensa aos magistrados vítimas de pressão.
Actualizações: este post foi emendado às 8:10 de 17-1-2009 e 17:21 de 20-2-2009.
Limitação de responsabilidade (disclaimer): As entidades mencionadas nas referências e notícias dos media, que comento, sobre o caso Freeport não são, que se saiba, suspeitas ou arguidas do cometimento de qualquer ilegalidade ou irregularidade, devendo guardar-se o direito de presunção de inocência de todos os referidos.
Portanto, é preferível que seja mesmo o SIS - ou os GOE (que dizem funcionar como a secreta da PSP) - a vigiar, escutar e intimidar ostensivamente os magistrados e jornalistas. Porque se trata de intimidação: aquela manobra de no domingo 25-1-2009, segundo conta a revista Sábado de 6-2-2009, quando o juiz de instrução do Freeport estava no fim de semana na sua terra, em Mação, dois indivíduos irem propositadamente fazer perguntas sobre ele, num carro com matrícula falsa é mesmo para o ameaçar do perigo em que está a incorrer quando autoriza as contestadas buscas e certas diligências. Só faz lembrar a impunidade de polícias políticas de regimes ditatoriais. Não adianta nada, pelo que se vê, que o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República (CFSIRP) ouça o director dos serviços ou até verifique as ordem de serviço, porque estes trabalhinhos particulares não ficam escritos, nem correm pelas hierarquias formais - se bem que quem os realiza acabe mais cedo, ou mais tarde, descalço pelo poder que lhes encomendou o serviço, e com a garantia de nome e foto nos jornais, como o ex-assessor governamental, funcionário dos serviços, no caso do relatório sobre a Moderna.
Há alguém com bom senso que acredite serem serviços secretos estrangeiros que andam a escutar, vigiar e intimidar, os magistrados do Freeport e BPN/Siresp?!...
Aceitou-se no Parlamento em 11-2-2009 a indignação do primeiro-ministro à pergunta do líder parlamentar da oposição sobre a vigilância dos magistrados e o SIS, em vez de se insistir na responsabilidade dele no controlo dos serviços de informações e na actividade de células de informações em Portugal. Não basta a palavra de José Sócrates para crermos que a vigilância e intimidação de que os magistrados do processo Freeport se queixam é uma fantasia, para mais quando são referidas evidências detalhadas de intromissão nas comunicações e intimidação. Por que não foram ainda investigados internamente esses casos no SIS, como deveriam ter sido em função das denúncias públicas de roda livre dos serviços de informação, em vez de se responder com insultos aos magistrados?...
Já disse, e insisto, resta o Presidente da República para chamar a atenção sobre o regular funcionamento das instituições democráticas - que só pode ser recuperado pelo próximo governo. A intervenção do Presidente já não pode incidir apenas sobre o procurador-geral da República - agora objecto de severa crítica pública dos delegados sindicais do Ministério Público -, ou sobre a desvio da função de investigar de procuradores para uma espécie de porta-vozes de defesa do primeiro-ministro, mas também sobre os serviços de informação. Não é admissível o envolvimento do SIS em actividades de estrita investigação criminal - nomeadamente, dos "casos de fraude e criminalidade económica no BPN e BPP" (CM de 10-2-2009) ou da violação de segredo de justiça no caso Freeport (CM de 7-2-2009), muito menos as alegadas escutas, vigilância e intimidação de juízes dos processos Freeport e BPN/Siresp, tal como não é saudável a ofensa aos magistrados vítimas de pressão.
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